estudo

Usar ar condicionado torna o planeta mais quente

Segundo estimativas, sistema de refrigeração poderá elevar temperaturas em cerca de 1 grau Celsius em algumas cidades

Mais do que grilos e vaga-lumes, mais do que beisebol e churrascos ao ar livre, não há o que indique melhor a chegada do verão nos Estados Unidos do que o zumbido familiar do ar condicionado.

Entretanto, cresce a preocupação de que outros países adotem a opção dos americanos pela refrigeração do ar, com o gasto adicional da eletricidade usada em suas redes elétricas já sobrecarregada, aumentando assim as emissões dos gases do efeito estufa.

Segundo as previsões da International Energy Agency, o número de aparelhos condicionadores de ar deverá subir de 1,6 bilhões de unidades, hoje, para 5,6 bilhões, até meados do século. Se não forem tomadas medidas para conter este aumento, até 2050, os aparelhos gastarão a mesma quantidade de eletricidade que a China já utiliza para todas as suas atividades.

As emissões dos gases do efeito estufa produzidas pelas usinas elétricas a carvão e a gás natural para esta finalidade praticamente dobrarão, de 1,25 bilhões de toneladas em 2016, para 2,28 bilhões de toneladas em 2050, afirma o relatório. Tais emissões contribuirão para o aquecimento global, elevando por sua vez ainda mais a demanda de condicionadores de ar.

Atualmente, estes aparelhos se concentram em vários países, principalmente nos EUA e Japão, e cada vez mais na China.

Enquanto 90% das habitações americanas utilizam este sistema, “nos países quentes do globo, na África, América Latina e Oriente Médio, onde vivem cerca de 2,8 bilhões de pessoas, apenas 8% de suas populações têm um aparelho de ar condicionado”, disse Faith Birol, diretora da agência de energia.

À medida que a utilização de aparelhos de refrigeração de ar cresce em todo o planeta, também aumenta o uso de energia.
À medida que a utilização de aparelhos de refrigeração de ar cresce em todo o planeta, também aumenta o uso de energia. Foto: Matuska/Pixabay

E, à medida que as rendas nestes países aumentam, também aumentará o número de aparelhos instalados. A agência prevê que isto se dará principalmente na Índia, China e na Indonésia.

Em parte, isto é devido ao desejo de conforto nos países do mundo que sempre foram quentes. Mas há outros fatores que contribuem para o seu aumento.

Com a elevação do bem-estar das famílias, também aumenta a utilização de refrigeradores e televisores. Estes eletrodomésticos geram calor, tornando as casas mais quentes.

E como os refrigeradores de ar funcionam expelindo o ar quente no exterior, acabam tornando o ambiente externo mais quente. Segundo algumas estimativas, este sistema de refrigeração poderá elevar as temperaturas da noite para o dia em cerca de 1 grau Celsius em algumas cidades, diz o documento.

E há ainda a mudança climática. A Índia está hoje 0,5 grau mais quente, em média, do que há 100 anos. Isto levou ao aumento dos dias em que há necessidade de resfriar o ar.

“Se olharmos para a situação em Chemai ou Munbai, o número destes dias praticamente dobrou, como na cidade mais quente dos EUA, Miami”, afirmou Lucas Davis, diretor do Instituto de Energia da Escola de Administração de Empresas da Universidade da Califórnia, em Berkeley. “Ali, está incrivelmente mais quente – nos Estados Unidos não há nada que se compare em termos de calor a estas cidades da Índia”.

E quando fica mais quente, deixar de utilizar o ar condicionado pode causar a morte. A onda de calor que assolou Chicago em 1995, matou mais de 700 pessoas, enquanto a onda que se abateu sobre a Europa, em 2003, e a que afetou a Rússia, em 2010, mataram dezenas de milhares de cidadãos. Os pesquisadores concluíram que a mudança climática fez com que a onda de calor europeia se tornasse mais letal, e também na Rússia.

A introdução do sistema de refrigeração do ar nas residências nos Estados Unidos reduziu o número de mortes precoces nos dias quentes em cerca de 75% desde 1960, mostrou outro estudo. É por isso que o dr. Davis e o dr. Birol afirmam que a solução não está em convencer os países a deixarem de lado o aparelho condicionador de ar, mas em aumentar a sua eficiência. Isto poderia reduzir pela metade a demanda adicional de energia para esta finalidade nos próximos anos.

Muitos destes aparelhos à venda na Índia hoje gastam o dobro da eletricidade para fornecer a mesma proporção de refrigeração se comparados a unidades mais eficientes, disse o dr. Davis.

Na outra extremidade do espectro, os refrigeradores de ar vendidos no Japão e na União Europeia são 25% mais eficientes do que os vendidos nos EUA e na China.

Os governos deveriam estabelecer padrões de eficiência para estes aparelhos e proporcionar incentivos para fabricantes e consumidores, segundo o dr. Birol. Alguns países já começaram a aprovar  normas de eficiência para a energia. E em razão de um acordo conhecido como a emenda Kigali ao Protocolo de Montreal, outros países tentam excluir gradativamente sistemas de refrigeração dos aparelhos de condicionamento do ar que criam também potentes gases do efeito estufa.

O relatório prevê também a contribuição das energias renováveis – principalmente a energia solar.

Independentemente da solução, o condicionamento do ar constituirá uma questão da maior importância, afirmou o dr. Birol.

“Os condicionadores de ar vêm em segundo lugar em toda a indústria”, afirmou. “Vinte e um por cento do total do crescimento mundial da eletricidade decorre da necessidade de atender ao crescimento da demanda de eletricidade no setor de condicionadores de ar”.

Fonte: The New York Times
Créditos: Kendra Pierre-Louis