O presidente francês, Emmanuel Macron, sugeriu nesta semana elaborar uma nova lei para combater as “fake news” – notícias falsas – durante campanhas eleitorais.
O país, porém, já tem um arcabouço legal para lidar com o fenômeno. A ideia foi recebida com cautela pelos franceses, avessos a ações que possam representar risco à liberdade de expressão.
O artigo 27 da lei sobre a liberdade de imprensa – de 1881 e modificado em 2000 – estipula que a divulgação de informações falsas prejudicando a “paz pública” pode ser punida com uma multa de R$ 175 mil. Esse texto raramente é invocado, no entanto, devido à dificuldade de provar em julgamento que existe um vínculo real entre as notícias e a ordem pública.
Patrick Eveno, professor emérito da Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne, publicou nesta quinta-feira um artigo analisando a proposta de Macron e o arsenal legislativo francês existente.
Eveno, que é também presidente do Observatório da Deontologia da Informação, entidade que congrega jornalistas e sindicatos, propõe que as notícias falsas não sejam combatidas com mais legislação, e sim com um debate dentro da sociedade. A imprensa, em especial, deve “justificar sua existência social” ao vigiar a circulação de informações inverídicas.
Já o jornal francês “Le Monde” foi cauteloso em sua reação. Em um editorial sobre a lei contra as “fausses nouvelles” -o jargão em francês-, o diário disse que a ideia é “elogiável”, mas “corre o risco de se chocar contra uma realidade complexa”.
“Esse tipo de ambição legislativa, dentro de uma área tão complicada e sobre uma coisa tão crucial como a liberdade de imprensa, é por natureza perigoso”, segundo o editorial.
Macron apresentou sua ideia de uma legislação de combate às “fake news” como uma maneira de proteger a democracia. As notícias falsas têm rondado pleitos em todo o mundo, preocupando inclusive no Brasil, neste ano de eleições presidenciais.
“Milhares de contas de propaganda em redes sociais têm espalhado por todo o mundo e em todas as línguas mentiras inventadas para prejudicar políticos, figuras públicas, jornalistas”, disse ele.
A sugestão foi feita durante seu discurso anual a jornalistas no Palácio do Eliseu. A lei, afirmou o presidente, será apresentada em breve. Citando exemplos do que pode ser feito, Macron disse que sites terão de informar suas fontes de financiamento.
Excepcionalmente durante as campanhas eleitorais, as autoridades regulatórias poderão remover conteúdos de maneira mais rápida, explicou ele, tendo o poder de bloquear sites enganosos.
Macron, que derrotou a nacionalista de direita Marine Le Pen em maio, foi alvo de “fake news” durante a campanha. Circularam, por exemplo, notícias de que ele tinha contas fora do país. Ele processou a rival após ela citar essa informação falsa.
Os rumores surgiram horas antes de um debate na TV e foram depois rastreados até um fórum na internet conhecido por congregar simpatizantes da direita americana.
Mesmo sua vida pessoal foi afetada por campanhas de desinformação, com a circulação de boatos – nunca provados – de que ele teria um relacionamento às escondidas com outro homem.
Reagindo à proposta, Le Pen escreveu na quarta no Twitter: “Quem vai decidir se uma notícia é falsa? Juízes? O governo? A França ainda será uma democracia, caso censure seus cidadãos?”
Fonte: Valor Econômico
Créditos: Valor Econômico