Ossos humanos foram encontrados nesta quarta-feira (04/09) em uma das casas do ex-ditador paraguaio Alfredo Stroessner (1912-2006), que governou o país de maneira autoritária entre 1954 e 1989.
O achado foi feito por manifestantes que ocuparam uma das residências de Stroessner em Ciudad del Este, que fica na fronteira com o Brasil. O caso foi revelado pelo jornal ABC Color.
Os restos mortais foram encontrados no que parece ser o banheiro do local, no espaço em que possivelmente havia uma banheira. A residência fica em um prédio localizado no terreno conhecido na cidade como “A Casa do Terror”, por conta das torturas que aconteceram no local contra opositores do regime.
Cerca de 300 famílias ocuparam, no dia 24 de agosto, o prédio onde ficava o apartamento do ex-ditador. De acordo com o ABC Color, dois dias depois, um dos netos de Stroessner se identificou como o atual responsável pelo imóvel.
Familiares de vítimas do período ditatorial foram ao local para verificar os restos mortais, e a Comissão de Direitos Humanos, assim como o Ministério Público do país, também devem participar das atividades de reconhecimento das ossadas.
A Equipe Nacional para Investigação, Busca e Identificação de Pessoas Detidas e Desaparecidas entre 1954 e 1989 (Enabi) foi chamada pelo procurador regional Alcides Giménez Zorrilla para averiguar as ossadas. “Aparentemente, são restos humanos antigos, portanto vale uma investigação por parte de pessoas especializadas na matéria”, disse Zorrila ao ABC.
Stroessner: violento, pedófilo e elogiado por Bolsonaro
Em fevereiro, o general Stroessner foi publicamente elogiado pelo presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que chamou o paraguaio de “estadista”. “[Um] homem de visão e estadista, que sabia perfeitamente que seu país, Paraguai, só poderia prosseguir, progredir, se tivesse energia (…) Então aqui, a minha homenagem ao general Alfredo Stroessner”, disse.
O paraguaio deu um golpe de Estado em 1954 e foi “eleito” em um pleito indireto, sem participação da oposição. Ao assumir o poder, Stroessner suprimiu garantias constitucionais e começou um período de dura repressão.
O regime, marcadamente anticomunista e pró-EUA, fez com que o Paraguai se tornasse um terreno fértil para a corrupção. Ao todo, governou por oito mandatos, em processos marcados por fraude. Em 1967, Stroessner fez uma Constituição que permitia apenas uma reeleição para presidente. Em 1977, ela foi modificada para permitir sua reeleição indefinidamente.
Filho de um imigrante alemão, o ditador também foi conivente com refugiados nazistas. Eduard Roschmann, conhecido como o açougueiro de Riga, responsável pela morte de 30 mil judeus na Letônia, e Josef Mengele, médico nazista, receberam acolhida e cidadania do general.
Stroessner era um pedófilo convicto. Durante a ditadura, ordenou a criação de uma espécie de “harém de meninas”, em que crianças de dez a 15 anos eram estupradas repetidamente por ele e por seus ministros, e exigia dos assessores que estes o “fornecessem” meninas virgens. Em quase 40 anos, o ditador teria estuprado mais de 1.600 crianças.
Ao todo, estima-se que entre 3.000 e 4.000 pessoas tenham sido assassinadas em seu governo por conta da perseguição política, marcada pelo emprego da tortura, sequestro e assassinatos políticos. O número de presos por motivos de perseguição política passa de 150 mil. De acordo com um relatório de 2008 da Comissão de Verdade e Justiça paraguaia, foram 18.772 torturados e 3.470 exilados. Além disso, segundo a Coordenadoria de Direitos Humanos do Paraguai (Codehupy), 236 crianças e adolescentes foram presos, 17 nasceram na prisão e houve 459 desaparecidos.
Em 1992, foram descobertos os Arquivos do Terror, uma série de documentos e memorandos internos que mostram como Stroessner colaborou com as ditaduras do continente e participou da Operação Condor, um acordo militar articulado pelos EUA e levado adiante por Brasil, Chile, Equador, Bolívia e Uruguai, que visava perseguir opositores às ditaduras.
Fonte: Opera Mundi
Créditos: Opera Mundi