Dois ônibus levaram 104 venezuelanos que moravam em favelas nos arredores de um acampamento do Exército para refugiados no bairro São Vicente, zona Sul de Boa Vista, na manhã deste domingo (9) de volta para o país vizinho. Os dois transportes foram fretados por uma igreja católica da Venezuela, segundo Erick Lazo, integrante da instituição religiosa.
No sábado (8), cerca de 100 imigrantes também retornaram para a Venezuela em dois ônibus em meio a um clima tenso. Na quinta-feira (6), um brasileiro e um venezuelano foram assassinados durante uma confusão próxima ao abrigo do bairro Jardim Floresta, zona Oeste de Boa Vista.
Segundo Erick Lazo, os ônibus têm como destino a cidade de Caracas, capital da Venezuela, entretanto alguns passageiros poderão descer na cidade que escolherem durante o percurso.
“Eles [imigrantes] podem parar onde quiserem na Venezuela no trajeto. Paramos em alguns pontos para eles comerem ou usarem o banheiro. Vai ser um dia de viagem [até Caracas]. Essa ação é paga pela nossa igreja. Outras poderão demorar a ocorrer porque não temos tanto recurso [para repatriação]”, explica.
Ainda de acordo com o representante, todos os imigrantes serão acolhidos pela igreja ao chegarem na Venezuela. “Serão abrigados por nós, terão comida e vamos arrumar emprego”, afirma Lazo, citando que um ônibus comporta 60 passageiros e o outro 40. “ Ninguém irá a pé”.
Homens e mulheres, alguns com filhos, que viviam em barracos improvisados nas ruas de Boa Vista estarão retornando para o país que deixaram devido a escassez de alimento, emprego e medicamento.
“Volto porque não consegui trabalho aqui [em Boa Vista]. Estou morando na rua desde que cheguei ao Brasil há três meses. É muito difícil conseguir algo para comer. Vivo dependo da solidariedade de algumas pessoas para conseguir alimento”, conta Franyely Bucuasa, de 34 anos, que veio sozinha para o estado.
Por outro lado, há imigrantes que preferem permanecer no Brasil a retornar à Venezuela por conta da falta de garantias de que no país vizinho terão assistência adequada, como Raíza Josefina.
“Tenho de fazer uma cirurgia no estômago e sei que no meu país não terei. Vou continuar morando na rua. Já faz quatro meses que estou aqui [Boa Vista] e nada mudou. Mas é melhor aqui do que na Venezuela”, conta Raíza, que veio para o Brasil com o filho adolescente.
Na madrugada de domingo, em meio a uma forte chuva, cerca de 200 imigrantes que viviam em um acampamento improvisado do lado de fora do abrigo do bairro Jardim Floresta foram levados para o Centro de Triagem montado próximo à sede da Polícia Federal em Roraima. A ação faz parte da Operação Acolhida.
No local eles vão ter a documentação atualizada, receberão consultas médicas, kits de higiene pessoal e alimentação. Depois, serão realocados em abrigos da capital para, depois, aderirem ao processo de interiorização do Governo Federal.
Clima de tensão
Na noite de quinta, o brasileiro Manoel Siqueira de Sousa, 35 anos, foi assassinado ao render o venezuelano José Antonio Gonzalez, 19. O imigrante o atacou com um golpe de faca e, em seguida, foi linchado e morto por moradores.
Testemunhas disseram à Polícia Militar que Jose Gonzalez teria furtado um mercado. Três dias após os crimes, ninguém foi preso e a Polícia Civil investiga o caso.
Ataques em Pacaraima
A confusão que resultou nas mortes aconteceu três semanas depois de uma grande manifestação pelas ruas de Pacaraima, cidade de Roraima que faz fronteira com a Venezuela. No município, moradores queimaram barracas e pertences de imigrantes em represália a um assalto praticado por venezuelanos a um comerciante local.
Perseguidos nas ruas do município, cerca de 1,2 mil venezuelanos deixaram o Brasil atravessando a fronteira. Com medo, índios da etnia Warao também voltaram para a Venezuela.
Na ocasião, a secretária-adjunta de Políticas Internacionais de Roraima, Fátima Araújo, disse que o retorno deles ao país natal foi um pedido dos próprios indígenas.
“Alguns índios Warao manifestaram a vontade de voltar para Tucupita. Estão indo embora 25 pessoas, entre adultos e crianças”, disse.
Em razão do conflito em Pacaraima, o processo de interiorização de imigrantes, que consiste em transferí-los de Roraima a outros estados do país, foi intensificado. O presidente Michel Temer assinou um decreto que determina a Garantia da Lei e da Ordem (GLO).
Os principais efeitos da medida, que é válida até 12 de setembro, foram a ampliação do poder de polícia das Forças Armadas em uma faixa de 150 Km nas fronteiras Norte (Venezuela) e Leste (Guiana) e o envio de mais militares para reforçar a fiscalização nessas regiões.
Com isso, os militares poderão atuar em situações de conflito, semelhantes ao ocorrido em Pacaraima, nas cidades que estão dentro da faixa de fronteira: Boa Vista, Bonfim, Uiramutã, Mucajaí e Pacaraima.
Fonte: G1
Créditos: G1