Para especialistas em inteligência militar, a fotografia pode esconder informações secretas que não aparecem de forma explícita na imagem.
Supostamente registrada por um satélite espião de Washington, a foto mostra, segundo Trump, uma plataforma de lançamento espacial iraniana. Mas seu alto nível de detalhes sugere que a imagem seria, na verdade, um arquivo classificado como “altamente confidencial”, segundo a avaliação de especialistas militares e em proliferação de armas nucleares.
Afinal, qual seria a intenção do presidente dos EUA ao publicar a foto? Trata-se de um erro de estratégia ou é possível interpretá-la como uma mensagem de poder para o resto do mundo?
A origem da polêmica
A imagem polêmica foi publicada em 30 de agosto. Na véspera, a imprensa dos EUA havia divulgado reportagens sobre uma explosão ouvida no Irã durante o lançamento do satélite Nahid 1, após tentativas fracassadas de disparo no início do ano.
Mas antes que o Irã se pronunciasse sobre o caso, o presidente americano se adiantou em confirmar o suposto lançamento, ao mesmo tempo em que descartava sua participação no processo.
“Os EUA não estiveram ligados ao catastrófico acidente durante os preparativos finais para o lançamento do Safir SLV no Centro 1 de lançamentos de Semnán, no Irã”, tuitou Trump.
“Desejo ao Irã boa sorte para descobrir o que aconteceu no Centro 1”, prosseguiu o americano, junto à imagem que supostamente mostra uma explosão em uma plataforma de lançamento espacial iraniana.
Horas depois, no entanto, o Irã negou a informação e mostrou imagens de seu satélite, ainda em terra firme, no seu Centro de Pesquisas Espaciais.
“Eu e Nahid 1 agora mesmo. Bom dia, Donald Trump”, tuitou com ironia o ministro iraniano de Comunicações, Mohamad Yavad Azarí Yahromí, com uma selfie junto ao satélite.
O ministro disse “não ter ideia” da origem das declarações de Trump e assegurou que o Nahid 1 seria colocado em órbita durante o mês de setembro.
Os EUA afirmam que por trás destes lançamentos se esconde um plano de Teerã para desenvolver mísseis balísticos com capacidade de carregar ogivas nucleares. O Irã nega e insiste que seus projetos são civís, não militares.
Alta resolução
Mas o mais novo atrito entre falas de Washington e Teerã não foi a principal notícia neste caso.
O alto grau de detalhe da foto publicada por Trump supreendeu especialistas, que concluem que a origem da imagem não poderia corresponder a um satélite comercial, mas sim a um documento de informação militar classificada.
“É tão nítida e tem resolução tão alta que não creio que possa ter vindo de um satélite”, disse a subdiretora da Rede Nuclear Aberta de Viena, Melissa Hanham, à rádio americana NPR.
Muitos analistas destacam que desconheciam o nível de precisão que o exército dos EUA é capaz de captar desde o espaço, dado que imagens deste tipo que foram desclassificadas por presidentes no passado sempre foram pixeladas para evitar revelar além do necessário.
Mas com seu tuíte, Trump também parecia querer enviar uma mensagem clara ao Irã (e ao mundo) sobre o poder extremo de vigilância que seu país tem sobre os segredos dos demais.
“Está dizendo que estamos vigiando atentamente e que estamos atuando com moderação, mas que se quiséssemos fazer mais, poderíamos”, disse à NPR Rebeccah Heinrich, especialista em segurança do Instituto Hudson da Pensilvania.
Outro especialista com experiência ampla em satélites consultado pela rádio concorda que a foto traga uma advertência velada de Trump.
“Sim, há claramente mais detalhes, mas não muita informação útil além das que estão nas melhores imagens comeciais”, disse a fonte, que preferiu não ser identificada.
Informação para outros países
Um grupo independente de observadores de satélites afirma que conseguiu descobrir quem é o responsável por captar a imagem.
Eles teriam chegado à resposta combinando a inclinação da plataforma de lançamento na imagem tuitada por Trump e analisando a posição das sombras na foto, junto a outros elementos.
Segundo os analistas, trata-se do USA 224, um dos satélites espiões de reconhecimento ótico de alta confidencialidade mais avançados dos EUA, sobre o qual há poucas informações públicas.
“É basicamente um telescópio muito grande, não muito diferente do Hubble. Mas em vez de apontar para estrelas, este mira a superfície da Terra para criar imagens ultradetalhadas”, explicou ao MPR News o astrônomo Marco Langbroek, um dos responsáveis pela pesquisa.
Especialistas concordam que este grupo de observadores não deverá ser o único a usar a foto de Trump para aprender mais sobre o USA 224 e os sistemas de espionagem satelital de Washington.
“Nossos adversários, Rússia, China, Coreia do Norte, Irã, Síria e outros analisarão o mesmo para entender quão boas são as nossas capacidades”, disse à NPR Bruce Klingner, ex-membro da CIA e colaborador da conservadora Fundação Heritage de Washington.
Para o correspondente de Assuntos Diplomáticos da BBC, Jonathan Marcus, “é assombroso que um presidente dos EUA ofereça a todos os inimigos de Washington uma visão tão pública de suas extraordinárias capacidades de captação de informação”.
Fonte: BBC Brasil
Créditos: BBC Brasil