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'Liberdade garantida para aborto': por que França se tornou 1º país a colocar direito de interromper gravidez na Constituição

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Legenda da foto,
Manifestante segura cartazes que dizem ‘Meu corpo, meu útero, minha escolha’ e ‘Nunca mais’ durante protesto silencioso em apoio à revisão constitucional

A França se tornou o primeiro país do mundo a incluir o direito da mulher ao aborto na Constituição. A decisão ocorreu na segunda (4/3) durante uma sessão especial no Palácio de Versalhes, convocada pelo presidente Emmanuel Macron, com os parlamentares das Câmaras alta e baixa.
A aprovação alcançou a necessária maioria de pelo menos três quintos dos votos e a Constituição do país de 1958 será revista para consagrar o direito da mulher ao aborto.
“A lei determina as condições de que a mulher tenha a liberdade garantida de recorrer ao aborto” e será inscrita no artigo 34 da Constituição francesa.

Esta é a 25ª alteração ao documento fundador da Quinta República e a primeira desde 2008.

As pesquisas mostram que cerca de 85% dos franceses são favoráveis à emenda constitucional. A resistência da direita no Parlamento não se concretizou.

Efeito da decisão Roe contra Wade

O aborto é legal na França desde 1975, mas o presidente Macron comprometeu-se a consagrá-lo na Constituição após a Suprema Corte dos Estados Unidos ter revertido a decisão Roe contra Wade, em 2022.
Com isso, a Suprema Corte, na prática, anulou o direito ao aborto nos EUA, permitindo que Estados americanos, de maneira individual, o proibissem ou restringissem — e levou ativistas a pressionarem a França a tornar-se o primeiro país a proteger claramente o direito em sua legislação fundamental.

“Esse direito (ao aborto) caiu nos Estados Unidos. E por isso nada nos autoriza a pensar que a França estava isenta desse risco”, disse Laura Slimani, do grupo de direitos humanos Fondation des Femmes (Fundação das Mulheres, em tradução livre).
“Sabemos que será uma grande celebração”, disse Anne-Cécile Mailfert, ativista do mesmo grupo, durante uma coletiva de imprensa antes da votação.
“No momento da votação, a Torre Eiffel deverá piscar e enviará uma mensagem importante também ao mundo.”

História da lei do aborto na França

Na França, o direito ao aborto está consagrado na lei — e não, como aconteceu nos Estados Unidos, numa única decisão do Judiciário — desde 1975.
Desde então, a lei na França foi atualizada nove vezes — e, em todas elas, com o objetivo de ampliar o acesso.
O Conselho Constitucional da França — o órgão que decide sobre a constitucionalidade das leis — nunca levantou qualquer questão.
Dessa maneira, segundo muitos juristas, o aborto já é um direito constitucional.

Em 1971, à medida que a campanha para legalizar o aborto na França ganhava força, uma petição foi assinada por 343 mulheres em todo o país.
No documento, conhecido como o “Manifesto das 343”, essas mulheres admitiram ter interrompido ilegalmente uma gravidez numa altura em que cerca de 700 a 800 mil mulheres faziam abortos todos os anos.
“O comportamento da Suprema Corte dos EUA fez um favor às mulheres de todo o mundo porque nos acordou”, disse Claudine Monteil, chefe da associação Femmes Monde (Mulheres no Mundo), à AFP. Ela foi a mais jovem signatária do manifesto.

Leis de aborto no mundo

Os defensores da reforma francesa dizem que é necessário prevenir-se contra uma nova onda de mudança social “reacionária” na Europa, que poderá levar ao poder aqueles que querem restringir o direito ao aborto.
Eles apontam para países como Malta, Hungria e Polônia, onde já existem limites ou são objeto de muito debate.
“Nos direitos das mulheres, os símbolos são importantes”, disse a advogada feminista Rachel-Flore Pardo sobre a mudança constitucional.
“Esperar até que o aborto esteja realmente sob ameaça seria esperar tempo demais.”
Leah Hoctor, do Centro para os Direitos Reprodutivos, disse que a França poderia oferecer “a primeira disposição constitucional ampla e explícita desse tipo, não apenas na Europa, mas também a nível mundial”.
Hoje, o aborto é permitido por lei no Brasil, em casos de gravidez decorrente de estupro, risco à vida da gestante ou anencefalia do feto. Nessas situações, o procedimento deve ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
O Chile incluiu o direito ao aborto eletivo num projeto de nova Constituição em 2022, mas os eleitores rejeitaram o texto num referendo.
Alguns países mencionam o direito. A Constituição de Cuba garante os “direitos reprodutivos e sexuais” das mulheres.
Vários Estados dos Bálcãs herdaram versões da Constituição da antiga Iugoslávia de 1974, que afirma ser um direito humano “decidir sobre o nascimento dos filhos”.
Outros Estados mencionam explicitamente o aborto na sua Constituição, mas apenas o permitem em circunstâncias específicas.

 

 

Fonte: BBC
Créditos: Polêmica Paraíba