Seguindo à risca o roteiro inevitável das ditaduras, que não toleram a mínima discordância, o regime chavista comandado com mão de ferro pelo presidente Nicolás Maduro só faz aumentar a repressão aos meios de comunicação que ainda ousam – seu número é cada vez menor – criticar atos do governo. O relatório anual de 2017 do Sindicato Nacional de Trabalhadores da Imprensa (SNTP, na sigla em espanhol) traz números que mostram a rapidez com que está se fechando o cerco à liberdade de imprensa na Venezuela.
O regime age em duas frentes: diretamente sobre os órgãos de comunicação e na intimidação – detenções e agressões – a jornalistas. Só em 2017 foram fechados 69 veículos: 46 emissoras de rádio, 3 de televisão e 20 jornais. No caso das emissoras, a tática é a de não renovar as concessões de funcionamento. A renovação virou privilégio dos órgãos dóceis ao regime. E, para tornar impossível a sobrevivência dos jornais que não se submetem aos seus desejos, o governo usa seu poder de conceder ou não dólares necessários para a importação de papel de imprensa.
Como se isso não bastasse, as sedes de 14 outros veículos de comunicação sofreram ações de intimidação das autoridades, no que deve ser visto como preparação para que em breve sejam também fechados. Na repressão aos jornalistas, o SNTP registrou 498 agressões feitas por policiais e militares – das quais 273 durante a cobertura das manifestações contra o governo, que deixaram um saldo de 125 mortos – e 66 detenções de profissionais. O número de agressões foi 26,5% maior que o do ano passado, o que mostra como vem se acelerando a escalada de violência contra os jornalistas.
Da sanha repressora não escaparam também emissoras de televisão estrangeiras, como as colombianas RCN e Caracol e a rede norte-americana CNN em espanhol, proibidas de atuar na Venezuela.
Para dar aparência de legalidade a seu ataque cerrado e sistemático à liberdade de expressão, o regime fez a Assembleia Nacional Constituinte – “eleita” de propósito para fazer suas vontades – aprovar em novembro lei que pune com pena de 20 anos de prisão e exclusão dos meios de comunicação os jornalistas que ousam dele discordar. Quanto às emissoras consideradas rebeldes – e que escaparem do fechamento puro e simples –, o Estado pode obrigá-las a difundir durante 30 minutos semanais matérias que promovam “a paz, a tolerância e a igualdade”.
Em resumo, é uma armadilha montada para que dela não escape nenhum órgão de comunicação ou jornalista que ouse pensar diferente do chavismo. O objetivo é esconder da população, tanto quanto possível, os erros, mazelas e arbitrariedades do regime. Ou, como diz o relatório do SNTP, “silenciar, a qualquer preço, o descontentamento causado pelas situações econômica e social cada vez mais críticas”.
Notícias ruins, produzidas pelo desastre em que o chavismo mergulhou e continua a mergulhar a Venezuela – com seu rosário de falência dos serviços públicos, hiperinflação, escassez de alimentos e medicamentos –, é o que não falta. Ao mesmo tempo que o relatório do SNTP, foi divulgado levantamento feito pelo Observatório Venezuelano da Violência (OVV), com dados impressionantes que colocam o país como o mais violento da América Latina, depois de El Salvador. Em 2017, foram registrados 26.616 assassinatos na Venezuela, um alto índice de 89 por 100 mil habitantes.
Segundo o OVV, o que explica o aumento da violência é “uma nova forma de criminalidade, inédita no país”, vinculada à crise. Mortes “são provocadas por disputas por alimentos até entre integrantes da mesma família”.Esse é apenas o aspecto mais dramático da crise gerada pelo chavismo, que está semeando a fome e o desespero na Venezuela.
Como não tem como resolver a crise, pois só tem competência para provocá-la, e porque quer se perpetuar no poder a qualquer custo, como toda ditadura, só resta a Maduro e seus asseclas aumentarem cada vez mais a repressão e tentarem silenciar todos os que podem denunciar seus desmandos.
Fonte: Estadão
Créditos: O Estado de São Paulo