Ucrânia x Rússia

Bakhmut: Por que a Ucrânia e a Rússia estão lutando por uma pequena cidade em ruínas? - Por Carlos Germano

Soldados ucranianos após intensos combates perto de Bakhmut – Foto: Reprodução/Reuters/Kai Pfaffenbach

Cerca de 70.000 pessoas viviam em Bakhmut antes da Rússia invadir a Ucrânia no início de 2022. A batalha pelo controle da cidade oriental estourou no final do verão, quando as atenções ainda estavam na batalha de Kherson, no sul da Ucrânia. De lá para cá, o confronto protagonizou algumas das lutas mais ferozes de toda a invasão.

Desde o início, o combate tem se desenrolado com as forças ucranianas tentando conter o avanço dos militares do grupo Wagner, mercenários pró-Rússia, comandados pelo oligarca Yevgeny Prigozhin.

No mês de abril, a batalha completou 9 meses, sem um desfecho final. O exército ucraniano está cercado por três lados e, no momento, ocupa menos de 90% da cidade. As forças do Wagner estão sendo apoiadas pela artilharia do Exército e por paraquedistas russos.

No início deste ano, o Grupo Wagner chegou a anunciar a captura de Soledar, uma pequena cidade perto de Bakhmut. Cerca de duas semanas depois, a Ucrânia confirmou que seu exército havia realmente se retirado da cidade. Essa vitória permitiu que a Rússia direcionasse suas tropas para auxiliar o Wagner nos flancos da batalha.

Em um vídeo publicado no Telegram, Prigozhin afirmou que a bandeira russa havia sido hasteada sobre um prédio municipal de Bakhmut, e que a cidade havia sido finalmente capturada.

Yevgeny Prigozhin postou um vídeo no qual afirma ter levantado uma bandeira russa sobre a prefeitura de Bakhmut – Foto: Reprodução/Telegram

Kiev rejeitou a alegação como desinformação, e a declaração de Prigozhin também não foi confirmada pelo Ministério da Defesa da Rússia. A batalha por Bakhmut, portanto, ainda continua.

De modo geral, é quase impossível verificar de forma independente as alegações feitas pela Rússia e pela Ucrânia. É, no entanto, claro, que a estrutura de Bakhmut foi totalmente destruída nos últimos meses. Dos 70.000 residentes da cidade antes da guerra, acredita-se que apenas 3.000, ou menos que isso, ainda estejam na cidade.

Uma civil evacuada de Bakhmut chorando, enquanto carregava seu chihuahua trêmulo, depois de sair de um veículo blindado do exército ucraniano em Chasiv Yar – Foto: Reprodução/AFP

Mas por que a Ucrânia não desiste de Bakhmut?

Estrategicamente, ela é importante devido à sua localização. Se a Rússia conseguir tomar a cidade, Putin vai direcionar suas tropas para cidades ucranianas mais a oeste, como Slovyansk e Kramatorsk, sendo esta última um importante centro industrial e administrativo. Essa conquista, por sua vez, levaria a Rússia a conquistar toda região de Donetsk.

O assessor de Zelensky, Mykhailo Podolyak, afirmou que a Ucrânia está lutando em Bakhmut porque o confronto está prendendo as melhores unidades da Rússia e enfraquecendo elas para tão aguardada contraofensiva.

No entanto, analistas militares criticaram essa postura, argumentando que seria mais sensato recuar para uma nova linha defensiva. Caso contrário, disse o analista ucraniano Oleg Zhdanov, os reservistas ucranianos necessários para a contraofensiva poderiam ser mortos.

O historiador militar Roman Ponomarenko também vê benefícios na retirada. “Se desistirmos de Bakhmut e retirarmos nossas tropas e equipamentos, nada de ruim acontecerá”, disse ele recentemente à mídia. “Se eles (a Rússia) cercarem totalmente (a cidade), perderemos homens e equipamentos.”

Konrad Muzyka, um analista militar polonês que visitou a área de Bakhmut com colegas em março, disse depois de sua viagem que achava que não fazia mais sentido militar manter a cidade.

“A decisão de defender Bakhmut agora é política, não militar”, disse Muzyka à Reuters, argumentando que a escala e os custos das perdas ucranianas superam os benefícios de manter a cidade do ponto de vista militar.

VÍDEO:

 

E a Rússia? Por que ela insiste tanto em conquistar a cidade?

Bakhmut passaria a servir como um centro regional de transporte para logística das tropas, embora isso dependa de quanto de sua infraestrutura ainda esteja intacta.

E, além disso, seria um trampolim para a Rússia avançar em duas cidades maiores na região de Donetsk: Kramatorsk e Slovyansk, como citado, anteriormente.

Ambas estariam ao alcance da artilharia russa. Moscou precisa controlar as duas cidades para completar o que chama de “libertação” da “República Popular de Donetsk”.

Para CNN, o presidente Zelensky disse temer que as forças russas consigam “uma estrada aberta” para as duas cidades, caso tomem Bakhmut. Aliás, ele também esclareceu que sua ordem de mantê-la era uma decisão tática.

Mapa ilustrativo do conflito – Foto: Reprodução/Institute for the Study of War (ISW)

E se Bakhmut vier a cair

Para a Rússia, Bakhmut seria uma vitória moral no campo de batalha, após uma série de derrotas em 2022. Por sua vez, para a Ucrânia, a perda da cidade pode minar o moral, mesmo que – como dizem seus aliados – não faça muita diferença estratégica.

Tanto o chefe do Pentágono dos EUA, Lloyd Austin, quanto o chefe da aliança da Otan, Jens Stoltenberg, minimizaram a potencial queda de Bakhmut como simbólica.

Mas para demonstrar a importância de Bakhmut para o mundo, Zelensky presenteou o Congresso dos EUA com uma bandeira da batalha assinada pelos defensores da cidade quando ele visitou os Estados Unidos, em dezembro de 2022.

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, segura a bandeira do seu país que tem as assinaturas dos soldados, durante visita a Bakhmut – Foto: Reprodução/EPA/Ukrainian Presidential Press Service

Defender a cidade ajuda a manter o apoio dos países ocidentais, provando que está fazendo a diferença, de acordo com Michael Kofman, especialista em militares russos do think-tank CNA, com sede nos Estados Unidos.

Porém, se a cidade cair, a Ucrânia pode se consolar com o fato de ter segurado as forças russas por todo esse tempo, mostrando que qualquer tentativa russa de tomar mais território será igualmente cara.

Fonte: Carlos Germano
Créditos: Carlos Germano