— Meu conselho é: sejam corajosos.
Foi com essa frase que Stefany Krebs prendeu minha atenção. Para dizer isso, não usou palavras, mas gestos – e, claro, atitudes. Ela sempre precisou dessa tal coragem. Hoje, usa-a para incentivar as pessoas. Stefany é jogadora de futebol e, desde janeiro de 2020, defende as cores do Palmeiras no time feminino. Ela, entretanto, se diferencia das suas colegas de equipe por uma característica: é surda e muda.
Natural de Erechim, no Rio Grande do Sul, Stefany sempre se destacou pelos gestos. Com a bola nos pés, demonstra a leveza e habilidade que só uma campeã do mundo pode ter. Com as mãos livres, comunica-se com a tranquilidade de quem sabe onde quer chegar. Com o sorriso no rosto, seu cartão de visita, conquista a confiança e o espaço que precisa para mostrar seu bom futebol.
“Tefy”, como gosta de ser chamada, foi diagnosticada com surdez aos dois meses de idade. No caso dela, a adaptação familiar foi mais fácil. Isso porque Stefany tem dois irmãos: Josiane, ouvinte, e o mais velho, Jean, que também é surdo.
Na infância, sempre jogou com ouvintes. Começou no campo, mas preferiu o futsal. O fato de a cidade de 105 mil habitantes não dar tanto apoio ao futebol feminino foi decisivo para a mudança de modalidade.
Em 2015, com 17 anos, Stefany foi eleita a melhor jogadora do Mundial de Futsal de Surdos, que foi disputado na Tailândia. Mas foi no ano seguinte que sua vida começou a tomar novos rumos.
“Fui convocada pela primeira vez à Seleção Brasileira de Futebol Feminino de Surdas e viajava mensalmente para Jundiaí (SP) para treinos no campo. Em 2017 fui morar em Pelotas (RS) para competir pelo Gauchão Feminino e fui campeã”, recorda. Começou, então, a pegar gosto pelo campo.
“Aprendi bastante e jogava como meio-campista e atacante”, destaca Tefy. “Ficamos com o bronze nas Surdolimpíadas na primeira vez que participamos e voltei ao futsal para focar no Mundial de 2019”. Da disputa, voltou não só com o título mas com o status de melhor jogadora jovem da competição.
De volta ao campo
A proposta do Palmeiras veio em seguida.
A adaptação no time paulista contou com a ajuda de um rosto conhecido por ela. Krebs já havia trabalhado com William Bitencourt. Hoje preparador físico do time feminino do Palmeiras, William esteve, por oito anos, ao lado da Seleção de Futsal de Surdos.
“Ele me apoia e ajuda muito com tudo. Sempre está ao meu lado no campo para explicar jogadas, conceitos de treino. Isso me deixa ainda mais segura”, destaca a boleira.
“As atletas têm se adaptado da melhor maneira possível, seja com a língua de sinais ou com ações específicas do futebol”, destaca William. “Tudo tem sido trabalhado para o melhor entendimento geral e tem dado bastante certo”.
E tem a diferença?
Acompanhada de Eder Zanella, professor e intérprete de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), Stefany concede entrevistas e conversa com as colegas de equipe. As demais palmeirenses se arriscam em gestos que não necessariamente são fiéis à língua, mas que são bons o suficiente para garantir uma comunicação efetiva com Krebs.
“As meninas já aprenderam bastante sobre LIBRAS. Moro com algumas delas no apartamento e a rotina permite que elas entendam melhor a língua de sinais a cada dia que passa”, destaca Tefy. Dentro das quatro linhas, a equipe tem combinado sinais para serem feitos durante os treinos e partidas.
“Os ouvintes falam na boca, mas eu, nas mãos, consigo interagir de acordo com o que é pedido. Isso é muito importante”, completa a atleta.
Essa é a primeira vez que uma atleta surda tem a oportunidade de atuar no futebol feminino profissional. “É um desafio, mas, ao mesmo tempo, um grande aprendizado a todos nós. A cada dia que passa, a comunicação está cada vez melhor”, analisa William.
Sem esconder a felicidade, Stefany fala da oportunidade de defender o Verdão como “maior desafio” de sua vida. “É a realização de um sonho estar aqui, tudo tem sido maravilhoso. O time tem meninas excelentes e busco o meu melhor a cada dia, observando-as e também a comissão técnica”, analisa.
Por fim, Krebs torce para que o Palmeiras sirva como exemplo de inclusão. “Torço muito para que não olhem as pessoas pela deficiência delas, mas sim pelo talento e pela habilidade. Nada é impossível”, destaca a atleta. “Acolham bem. É uma experiência que se leva por toda a vida. Não desistam de seus sonhos e lutem por aquilo que traz felicidade a si. Todos somos capazes de tudo”.
Fonte: Yahoo
Créditos: Yahoo