é o melhor que a gente faz

A COPA E O POVO BRASILEIRO: "é quando o Brasil se une, é o mais próximo do que nos aproxima" - Por Flávio Lúcio

Essa história de pátria de chuteiras é criação de intelectual. Aliás, de intelectual conservador, Nelson Rodrigues. Nenhum movimento conservador no Brasil jamais se apoiou no futebol.

A COPA E O POVO BRASILEIRO

Vou começar contando aqui um episódio sobre Copa do Mundo que me marcou profundamente e foi definitivo para mim em sua pedagogia quando o assunto é Copa. Foi durante a Copa de 1990. Governo Collor. Eu era diretor da UNE. Àquela época (apenas cinco anos depois do fim da ditadura e seis meses após a primeira eleição presidencial em que Collor venceu Lula depois de uma campanha memorável), ainda persistia a ideia de que as Copas serviam a direita porque “anestesiavam” o povo – ainda se pensava com os olhos voltados para 1970.

Pois bem. Muita gente (eu inclusive) torceu contra o Brasil naquela Copa. Durante os jogos eu me sentia como um ET em meio à paixão desmedida que só o brasileiro tem por futebol e sua seleção. No jogo em que o Brasil perdeu para a Argentina e foi desclassificado no finalzinho do jogo com um gol de Caniggia, eu fui capaz de comemorar diante da estupefação geral de familiares e amigos, que me olhavam com expressão de incredulidade e amargura. Ninguém disse nada. Apenas o selêcio da imensa tristeza, como se o Brasil inteiro tivesse pedido a voz.

Ali eu compreendi o quanto a minha atitude era idiota. Eu revelava ao mesmo tempo minha incapacidade de entender meu povo ao subestimar sua capacidade de entender as coisas do mundo. E um elitismo cultural que me aproximava muito do desprezo da nossa elite pelas manifestações espontâneas do povo brasileiro.

Essa história de pátria de chuteiras é criação de intelectual. Aliás, de intelectual conservador, Nelson Rodrigues. Nenhum movimento conservador no Brasil jamais se apoiou no futebol. Nem as manifestações pelo impeachment (aquela gente que foi às ruas deve ter lembrado, quando procurou no guarda-roupa, que a única veste em verde-amarelo que dispunha era a camisa da CBF). A maior parte dos que foram às ruas nunca se sentiu brasileiro e despreza o Brasil e seu povo.

Ali, eram poucos os que iam aos estádios de futebol, e continua assim (é essa a razão para o fracasso das Arenas estatais padrão-FIFA). Vejam o que está acontecendo com o Flamengo. Afastou os seus torcedores pobres do Maracanã achando que os substituiria pela classe média, que pagaria por ingressos mais caros, e hoje procura meios de trazer de volta a “favela” para o Maracanã para tentar reviver os dias de paixão onde a torcida levava o time no colo.

Aqueles que vestiram camisas da CBF são, isso sim, PATOS DA FIESP, gente que, quando assiste futebol, assiste em casa, em bares, para não se “misturar”. O povão gosta de futebol e vai aos estádios no Brasil. É sua diversão.

Mas, prestemos atenção: para o brasileiro Copa não é apenas entretenimento, é mais que isso. Copa é quando o Brasil se une, é o mais próximo do que nos aproxima de um sentimento de pertencimento, de identidade, de povo, não para esquecer seus problemas, porque a maioria continua a trabalhar e a lutar pela sobrevivência, a lembrar cotidianamente de sua condição. Mas para partilhar, para se sentir brasileiro.

Na Copa seguinte, a de 1994, o Brasil foi campeão. Sabe a influência disso na eleição de FHC? ZERO. Da mesma maneira, oito anos depois, quando o Brasil foi novamente campeão em 2002. Apesar dos esforços de FHC de capitalizar eleitoralmente aquela vitória, nada foi capaz de impedir a vitória de Lula.

Vamos torcer que é o melhor que a gente faz.

Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Flávio Lúcio