Não é novidade a relação de interesses entre a Imprensa e o Poder. Jornais, Revistas, TVs e portais sobrevivem, em parte, graças a verbas publicitárias oriundas dos governos municipais, estaduais e federais. A “dobradinha”, Poder e Mídia, têm levado a críticas e suspeitas quanto a lisura das linhas editorias adotadas pelos órgãos de Imprensa, que muitas vezes têm posturas, no mínimo, menos críticas a seus benfeitores. Na outra ponta, a Imprensa é acusada de bombardear governos, ou personalidades públicas, com denúncias e manchetes negativas, numa dinâmica que lembra a extorsão praticada por gangsteres que cobram dinheiro de lojistas para evitar a depredação ou o roubo, que os próprios bandidos estão dispostos a fazer, caso não recebam o “afago” pedido.
Essa postura pouco ética, é apontado como um dos motivos que tem afastado a audiência da TV e dos jornais impressos, aliado a isso, a crise econômica e a entrada com força de um novo hábito, a busca por entretenimento e informação na internet, tem ameaçado a saúde financeira da Imprensa do país e também das TVs.
Em outros tempos, os jornais e revistas impressos vendiam milhares de exemplares. As Revistas Veja, IstoÉ e Época, os jornais Folha de São Paulo, Jornal do Brasil, O Globo e as TVs abertas – liderada pela Globo, Record, Bandeirantes, Rede TV!, mantinham status de todo-poderosos. A Globo, considerada a Vênus Platinada, era uma espécie de ícone hipnotizante, formador de opinião e de modismos brasileiros. No entanto, a crise econômica e a crise política vêm alterando a relação entre cofres públicos e Imprensa. O que tem piorado a situação, já difícil de alguns veículos. No ramo impresso, muitos títulos estão abandonando a versão em papel para se dedicar apenas à publicação online. Mas em tempos de informação farta vinda de blogs e redes sociais, mesmo para manter um jornal online, arrecadar renda a partir de assinaturas e publicidade está difícil.
Não é novidade que praticamente todo o brasileiro tem uma televisão dentro de casa. O IBGE divulgou pesquisa neste ano onde aponta que 97,2% dos domicílios do Brasil tem um aparelho de TV. Outro dado, agora da Pesquisa Brasileira de Mídia 2015, divulgada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, informa que 73% assistem televisão todos os dias da semana. A princípio, a TV aberta, com aproximadamente 20 canais, e de acesso gratuito para todos os brasileiros, é a mais beneficiada com esses números. Apesar disso, ao contrário do que dizem os números frios da pesquisa, segundo pensadores, políticos e cientistas ouvidos pela Revista NORDESTE, essa influência, está mesmo em crise. Uma crise que tem feito vozes políticas, sociológicas e dos movimentos sociais a defenderem uma regulação da mídia por um lado, enquanto noutra frente, a mudança nos hábitos marcado pelo avanço das redes sociais, da TV paga e segmentada e da internet, parece começar a marcar um novo tempo para a televisão.
Em relação a regulação da Mídia, frentes políticas de esquerda têm considerado esse o melhor caminho para ordenar o que tem parecido até então uma terra de ninguém. Para defender a medida, a deputada federal Jandira Feghalli líder do PCdoB na Câmara Federal, por exemplo, diz que existe um massacre midiático na TV aberta do país. Ela afirma que as pautas da TV voltadas para violência e corrupção distanciam a população do que é feito de positivo na política. Filósofos e Sociólogos defendem que a regulação da mídia é necessária para existir maior democracia midiática no Brasil. O deputado pernambucano Mendonça Filho, da direita, diz que a regulação seria um retrocesso à censura.
A internet já chega a 51% da população brasileira, segundo o IBGE, em pesquisa de 2014. Ainda é pouco se comparado a televisão, mas não deixa de ser uma ameaça ao se projetar esses dados para o futuro, já que a população mais jovem prefere gastar tempo na internet do que com a TV ligada.
TV x Internet: Mudança de hábito
Na Pesquisa Brasileira de Mídia 2015, divulgada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República foram apresentados números referentes ao uso de televisão, internet, rádio e jornal. Diferente da pesquisa do IBGE, que aponta o acesso as diferentes mídias no Brasil, a PBM aborda o uso, o que pode diferir bastante. O uso de rádio por exemplo, o IBGE apontou que mais de 90% da população possui o aparelho de rádio, mas na PBM, 44% da população declarou que nunca escuta rádio.
Mas neste caso vamos nos focar no uso de televisão e internet. Em um aspecto em particular: o uso das duas mídias para jovens e para idosos.
Para a população brasileira, utilizar a internet diariamente é uma realidade para 37%. Na comparação com 2014, esse número era de 26%. Entretanto, ainda há um percentual de 51% que declarou que não utiliza a internet nunca.
O grande diferencial no uso de internet no Brasil é por faixa etária. Para jovens entre 16 e 25 anos, utilizar a internet todos os dias é realidade para 65%. O total de jovens nessa idade que declararam nunca utilizar a internet é de 20%. Os números se invertem progressivamente se for comparar idades mais avançadas. Quando chega na faixa etária dos 65 anos ou mais o percentual de quem usa a internet diariamente fica em apenas 4% e para os que nunca utilizam o numero sobe para 93%. O que é importante ressaltar aqui é que a percentagem dos que assistem televisão é maior para os mais idosos, enquanto que os jovens entre 16 e 25 anos são os que menos aportam em frente a televisão. O percentual de jovens que veem televisão todos os dias é de 68%, bastante próximo dos 65% relacionados ao uso da internet. Já os idosos, assistir televisão diariamente é comum para 78%. A pesquisa aponta uma tendência clara em direção a internet. Outro fator a ser considerado é o tempo de uso em média para cada mídia. Para os jovens de 16 a 25 anos, é normal assistir 4h19 de televisão diariamente entre segunda e sexta-feira. Já o uso de internet diário para essa faixa etária é de 5h51. Os idosos, por sua vezes assistem 5h16 de TV por dia, e, os que usam internet, utilizam durante 2h53 por dia. Vale lembrar que o uso de internet inclui a utilização através de smartphones.
O crescimento do uso da internet frente a um crescente desinteresse pela televisão aponta para uma possível inversão na preferência da população em relação a mídia. Ainda assim é algo que só deve acontecer a longo prazo. Um dos ingredientes que ainda propicia que a televisão se mantenha no topo da preferência no Brasil é a gratuidade da TV aberta. O cidadão não precisa pagar para ter o direito de ver TV em casa, o que já não é o caso da internet. Seja em um microcomputador ou em um aparelho celular, é preciso pagar uma mensalidade, o que não é uma opção viável para grande parte da população.
Luis Antonik, diretor geral da Associação Brasileira de Televisão e Rádio (ABERT), reforça o caráter mais amplo da televisão aberta ao argumentar que existem de fato várias mídias para acessar informação ou entretenimento e que a internet oferece um leque muito interessante. Entretanto, Antonik lembra que a TV está presente em mais de 97% dos lares, conforme apontado pelo IBGE, e que a internet está longe de ter esse alcance. “Não tem perda (de interesse) nenhuma da TV, ainda. E outra coisa, a internet tem um perfil completamente diferente da TV aberta. Por exemplo, o jornalismo que tem na TV aberta, o cotidiano, o policial, o programa ao vivo, até que os outros meios de comunicação cheguem a alcançar isso, vai ser muito difícil”.
O filósofo e professor da Universidade de Campinas, Roberto Romano, concorda com Antonik. Romano acredita que as novas mídias incorporam o que as outras oferecem, mas isso não abole as anteriores. “Da mesmas forma que o radio ainda vai demorar para ser abolido da forma como era praticado no século 20 (uma estação irradiadora, milhões de aparelhos fixos em cada lar), também a TV. Talvez em anos os aparelhos de TV (mesmo os mais sofisticados) sejam peças de museu.”.
O professor de Ciências-Sociais da UFPB, Marcelo Burgos, afirma que o Sistema Midiático como um todo tem um grande poder de influência na sociedade e a televisão, que durante décadas exerceu maior influência, hoje perde um pouco. “Isso acontece principalmente, pelo advento das TICs (Tecnologia de Informação e Comunicação). Mas vale lembrar que a TV continua muito forte como fonte de informação e credibilidade para a população”.
“A TV, assim como o mass media (Imprensa) em geral, estão em constante mudança. A TV já não influencia como antes, mas ela própria se modifica e utiliza das TICs, internet por exemplo, como um novo espaço de convergência daquilo que foi produzido pela TV. Essa discussão também foi feita em relação ao rádio e o cinema frente ao aparecimento da TV. E agora, frente à internet. Na verdade, não vejo num futuro próximo o fim da TV mas sim, ela se articulando com as TICs”, pondera o professor.
Monopólio e jogo de interesses
Não é nenhum segredo que Globo, SBT, Record e Band dominam a audiência no Brasil. Para Luis Antonik, isso é natural. Assim como as emissoras tem a liberdade para veicular determinados conteúdos, o espectador tem liberdade para escolher o que quer assistir. “A NBR é um canal institucional que pertence ao Governo Federal e fica mostrando as ações do governo. As pessoas preferem ver o Datena ou as ações do Governo? O Datena me parece mais popular, então as pessoas preferem aquilo”, frisa o diretor da ABERT. Antonik argumenta que isso não pode mudar, porque não se pode controlar a audiência e os conteúdos. “Não queremos voltar a ter controle de mídia”, defende.
O diretor admite que o que é dito na TV, muitas vezes pode ser ofensivo para alguns, o que acaba resultando em processos, mas não culpa o jornalismo. “Claro que acaba machucando pessoas, mas a culpa não é do jornalismo, o jornalismo só está mostrando os fatos. Eu acredito que aqui no Brasil nós temos 100% de liberdade de imprensa”, disse.
Antonik diz ainda que não crê que as emissoras de TV tenham envolvimento com políticos. Segundo ele, um partido político não tem condições de influenciar no que é televisionado em um canal. “No Brasil existem 542 canais de televisão e mais de 14 mil retransmissoras. O próprio PT em São Paulo tem um canal de televisão, ele não usa aquele canal de TV para fazer uma política, ou pelo menos ostensivamente. Eu não acho que isso seja controlado por partidos, não entendo que seja assim”, disse.
O cientista-político e professor da Universidade Federal da Paraíba, José Henrique Artigas, concorda com Antonik no que diz respeito a Liberdade de Imprensa. Em conversa com a Revista NORDESTE, o professor afirmou que “há ampla liberdade de imprensa no Brasil, como nunca houve em nossa história. Não há qualquer cerceamento da palavra a jornalistas”. Por outro lado, Artigas ressalta que existem sim partidos políticos envolvidos com canais de TV e que isso acaba influenciando no que é exibido pelas emissoras. “É verdadeiro que há várias lideranças políticas, assim como familiares destas, que detêm o controle de inúmeros veículos e redes de comunicação, o que inclusive vai contra o que diz o artigo 54 da Constituição. Isso permite uma relação inadequada e por vezes nefasta entre os grupos de comunicação e as lideranças partidárias. Os desvios que temos na relação às vezes incestuosa entre políticos e mídia só poderão ser superados com regulação e democratização, pluralizando as fontes de informação, permitindo que todas as tendências políticas e ideológicas possam se expressar de forma equitativa, retirando assim o perfil partidário que pode advir de um sistema monopolizado ou oligopolizado”.
O filósofo Roberto Romano, aponta outro fator. Para ele, a liberdade de imprensa no Brasil é razoável. Ela existe, mas nem sempre pode ser exercida diante dos interesses dos jornais e das emissoras. “Ai de quem se levanta contra as oligarquias e oligopólios do setor! Não raro, as redações abrigam valorosos profissionais, mas elas mesmas recebem pressão direta de interesses vários que, também não raro, definem a pauta, excluem matérias, colunistas, colaboradores, etc.”
Regulamentação da Mídia: prós e contras
A regulamentação da mídia é defendida principalmente por partidos de esquerda, como o PCdoB, PSOL e PT. Enquanto os partidos alinhados mais à direita, ou centro, como o DEM e o PSDB, têm defendido a manutenção do atual formato. A Revista NORDESTE conversou sobre o assunto com dois líderes na Câmara, um de esquerda, a líder do PCdoB, deputada federal Jandira Feghalli (PCdoB-RJ), e o líder dos Democratas Mendonça Filho (DEM-PE), para ouvir os argumentos de lado a lado.
Mendonça Filho argumentou que não existe necessidade de regulação, porque já existem limites funcionais. “São estabelecidos direitos, deveres e limites que são respeitados pela mídia no Brasil. Qualquer pessoa que se sinta atingida por algum excesso, tem o direito de recorrer na Justiça”.
O deputado pernambucano explicou ainda que a medida seria prejudicial para a liberdade de imprensa brasileira. “Regulação da mídia é um neologismo para controle da mídia. É uma imposição do conceito bolivariano, petista, que quer efetivamente censurar a chamada liberdade de expressão. Isso é inaceitável”, asseverou.
A deputada Jandira expôs outro ponto de vista, garantindo que a proposta de regulamentação não deve ferir a liberdade de expressão. “O mundo inteiro faz regulação econômica e regulação da mídia e nem por isso acabou a liberdade de expressão. Regular não é censurar, regulação econômica é quebra de monopólio”, explica.
Jandira argumenta que a proposta não é acabar com os canais que já existem e dominam a audiência, mas dar vez aos outros. “O que nós queremos não é acabar com a Globo, com a Bandeirantes, SBT ou Record, com ninguém. Eles vão existir. O que nós precisamos é possibilitar que outros existam. Que tenha pluralidade na informação, que tenha debate, que outras opiniões possam falar para a sociedade brasileira e isso aí tem instrumentos técnicos, financeiros e legais para que a gente consiga fazer. Esse é o nosso esforço”.
A deputada ainda comentou que os telejornais atualmente só trabalham, praticamente, com duas pautas: corrupção e violência. “Isso leva a uma absoluta criminalização da política, porque ninguém anuncia, ninguém divulga o que de bom se consegue fazer na política. E tem muita coisa. Só se criminaliza. Isso leva a um distanciamento do povo na política, o que é muito ruim para o futuro da democracia brasileira”. Ela ainda afirma que a exposição constante da violência nos noticiários acabou por influenciar a opinião popular a respeito da redução da maioridade penal. “O massacre midiático tem uma enorme responsabilidade nessa visão da opinião pública. O noticiário leva a defesa da redução da maioridade penal, da pena de morte. Bandeiras (levantadas) diante de um noticiário que torpedeia a cabeça da população brasileira, principalmente da TV aberta”.
O filósofo Roberto Romano compartilha do mesmo ponto de vista da deputada. Segundo ele, a regulamentação da mídia é necessária para impor regras mais efetivas aos operadores. “Do modo como a TV, sobretudo ela, opera no país, os seus donos são verdadeiros soberanos. Para eles a lei é detalhe”. Romano, assim como Jandira, criticou a exposição da violência na TV, afirmando que os programas policiais são fascistas, mas sobretudo criticou as telenovelas. Ele apontou que o hábito de ver novelas antes de dormir surgiu durante o Governo de Getúlio Vargas. “As novelas fornecem um derivativo que dissimula a vida política, econômica e cultural. As tramas unem ângulos melífluos com receitas de violência. Esse enxerto torna o imaginário mais carente de novas perspectivas formais, atola o senso crítico num mar de imagens dejetos, falas idiotizantes, visões de mundo preconceituosas. E, sempre, distrai o espectador da repressão cotidiana, das múltiplas amostras de corrupção, do abatedouro para onde ele é conduzido. É inimaginável algo vindo de Marcel Proust nas novelas brasileiras”.
Luis Antonik, da ABERT se coloca contra a regulamentação. Ele lembra que a lei da mídia, datada de 1962, pode ser antiga, mas é constantemente alterada com novos decretos e portarias que vão dando uma nova cara à lei. Antonik ainda diz que a proposta defendida por alguns partidos é uma tolice da esquerda. “O que acontece é o seguinte, essa mídia que existe no Brasil, o rádio, a televisão, a revista, o jornal, essas empresas de comunicação, na verdade elas são um estorvo tremendo para quem não se comporta do modo correto administrativamente”, apontou.
O diretor da ABERT ainda lembrou que a TV aberta, na maioria das cidades, tem mais de vinte canais e que o espectador tem toda a liberdade de assistir o que quiser. “Mas aí dizem assim: ‘ah! Mas, a EBC tem 0,2% de audiência e a TV Record tem 17%’. Bom, quem faz audiência é o público. A EBC é um canal de alto nível, onde mostra teatro, música clássica, essas coisas assim talvez não tenham uma preferência. O público não tem preferência por uma programação assim tão cultural, tão intelectualizada, então esses canais que tem esse tipo de programação, tem uma audiência mais baixa, os canais que tem uma programação mais popular, tem uma audiência mais alta. Eu sou de um tempo que uma matéria de revista deveria antes passar na mão de um sensor e ele ia cortar o trecho que ele achava que era agressivo ao estado. Nós queremos voltar a ter esse controle da mídia? Não dá. Penso que não”, defende.
A deputada Jandira diz que associar a regulamentação da mídia à censura é um equívoco. Ela destaca ainda que os partidos de oposição trabalham juntos com os interesses da mídia. “O que eles querem é fragilizar o projeto que Lula e Dilma representam. Para enfrentar o projeto eles se utilizam de partidos de oposição para essa ação.”
TV no mundo, proibido violência
A crise midiática não é exclusividade do Brasil. A regulação da mídia já foi feita em alguns dos nossos vizinhos, como Venezuela e Argentina. Mas também em grandes países, como a Inglaterra. Nos Estados Unidos não existe uma lei, mas há medidas que regularizam os meios de telecomunicação.
A regulamentação na Venezuela ocorreu após o chamado “golpe midiático” contra o então presidente Hugo Chávez, em 2002. A lei de Responsabilidade Social em Rádio e Televisão entrou em vigor três anos depois com diversas novas regras. Segundo a Lei, o estado decide se renova ou não concessões de freqüência de rádio e TV. O assunto gerou polêmica quando o Governo não renovou a concessão do canal RCTV em 2007, emissora que fazia forte oposição a gestão de Chávez. A lei venezuelana também proíbe a veiculação de eventos ao vivo que possam “incitar a violência e a desordem pública”. Quem decide se um evento apresenta esse tipo de risco é uma comissão do Governo sem participação de representantes da mídia. Em 2010 a lei foi ampliada para também abranger a internet, gerando multas para provedores que não restringem, em determinado tempo, mensagens que incitem o ódio.
Na Argentina foi aprovado em 2009 a Ley de Medios, no primeiro governo da presidente Cristina Kirchner. A lei, polêmica até hoje, definiu regras para TV e Rádio, promovendo a “desconcentração e fomento da concorrência com o fim de baratear, democratizar e universalizar” a comunicação. A presidente argumentou que a comunicação é um direito humano e que é necessário defender o fim dos monopólios e a pluralidade de vozes. A própria Kirchner ergueu cartazes contra o maior grupo de mídia do pais, o Clarín. A oposição e as empresas de mídia criticaram a aplicação da lei afirmando que era um atentado contra o “direito adquirido, a propriedade privada e a liberdade de expressão”. Em 2013 a Suprema Corte de Justiça entendeu que as normas definidas pelo Governo são constitucionais. O Clarín teve que abrir mão de mais da metade de aproximadamente 200 concessões de TV a cabo e de TV aberta em todo o país.
Nos Estados Unidos a regulamentação das telecomunicações é feita pela Federal Communications Commission (FCC), uma agência independente criada em 1934. A federação regula principalmente o mercado com foco nas questões econômicas. O órgão é responsável por outorgar concessões. Não é permitido no país a propriedade cruzada. Uma mesma empresa não pode ser proprietária de um jornal e uma emissora de TV na mesma cidade. Uma mesma empresa também tem um limite de estações que pode controlar. Em relação ao conteúdo fica entendido que este deve ser regulado pelo mercado e pela opinião pública. Mas a Federação age em casos de abuso, quando há o descumprimento de regras, por exemplo, a exibição de cenas consideradas indecentes na televisão.
No Reino Unido as emissoras de rádio e televisão são reguladas por um órgão chamado Ofcom, que também é responsável por telefonia e internet. O Ofcom garante a pluralidade de programação de televisão e rádio, impede a exposição de material ofensivo e garante que as pessoas sejam protegidas de tratamentos injustos nos programas. Também não é permitido a invasão de privacidade. A regulamentação das telecomunicações na Inglaterra é considerada uma das melhores do mundo. Um bom exemplo disso é que a BBC, uma rede pública administrada pelo Governo, é uma das maiores redes de televisão do mundo. A regulação da televisão na Inglaterra virou um exemplo para os demais países europeus. Em um relatório do órgão regulatório em 2008, sobre o papel da mídia pública no pais, destaca-se que o fato do indivíduo assistir um conteúdo que tem benefícios para a sociedade como um todo, resulta um maior engajamento democrático e com um cidadão mais educado. Essa seria a razão principal para a permanência da mídia pública.
Imposto
No Reino Unido, todo cidadão que possuir uma televisão e utilizá-la para captar sinal televisivo, deve pagar uma taxa anual de £145,50 (libras). Quem não paga a taxa pode ser processado ou até mesmo preso. Com o dinheiro da taxa, o Governo mantém a rede BBC, uma das maiores redes de mídia do mundo. O canal é completamente livre de propagandas e intervalos comerciais e pode produzir matérias mais longas e com mais substância. Além disso, a BBC, durante as eleições, dá a mesma atenção aos partidos minoritários que dá aos majoritários, diferente do que faz a TV Comercial.
A BBC cumpriu um papel de estimular o jornalismo e a programação de qualidade, o que incentivou os concorrentes a também melhorarem o seu conteúdo, que por sua vez elevou ainda mais a qualidade do conteúdo da BBC.
Outros países, assim como o Reino Unido, cobram uma taxa da população que assiste televisão entre eles Portugal, Alemanha e Japão.
Extra, extra! Jornais a venda
Em tempo de crise, dois grandes jornais do Nordeste estão passando por profundas transformações. Seus antigos donos estão abrindo mão do produto com intuito de fugir da falência. São ícones da história nordestina e brasileira: os jornais A Tarde, na Bahia, e o Diário de Pernambuco.
O Diário de Pernambuco, o mais antigo no país com 189 anos de circulação, teve 78% das suas ações compradas pelos irmãos Alexandre e Maurício Rands, este último já foi deputado e trabalhou no projeto para a presidência do ex-governador Eduardo Campos, falecido em 2014. A dupla comprou a fatia que pertencia ao grupo de planos de saúde Hapvida e aos Diários Associados, sócio de outros jornais do país. O jornal pernambucano passou por um aperto no início do ano quando teve que demitir 130 funcionários. A demissão em massa foi conduzida pela direção do Grupo Opinião de Comunicação, que havia assumido ainda em janeiro, e pertencia ao grupo Hapvida.
Alexandre Rands, empresário que já trabalhava na área de tecnologia, falou dos desafios de assumir o comando do jornal em tempos de crise financeira e midiática. “A crise do segmento é por causa das mudanças tecnológicas e de hábitos da população. Entretanto, a população hoje é bem mais informada do que a anos atrás. O que mudou foi a forma de obter as informações. Em momentos de ebulição tecnológica como esse, sempre há grandes oportunidades associadas à crise. São elas que estamos mirando. Primeiro devemos maximizar o nosso potencial dentro desse mundo declinante. Há muito que pode ser feito nesse contexto. A partir daí encontrar novas formas de geração de receitas que possam ser mais adequadas para os novos tempos”.
O empresário ainda disse que o jornal já recebe verbas de publicidade de governos dentro de padrões estabelecidos. O método é comum para os veículos de comunicação em todo o país, mas Alexandre refuta a dependência de verbas governamentais. “Não acreditamos que veículos de comunicação devam se basear apenas em governo como fonte de receita e não faremos isso. O Governo já representa um percentual pequeno do nosso faturamento e deverá encolher ainda mais no futuro próximo”, contou.
Já o jornal baiano, A Tarde, com 103 anos de circulação, está em fase final de negociações. A folha pertenceu, durante três gerações, à família Simões, mas entrou em decadência quando a filha do fundador, Regina Simões de Mello Leitão, morreu e a direção foi assumida por um executivo profissional. Os herdeiros entraram em desavença, fato que ampliou a crise. Hoje o jornal acumula aproximadamente R$ 200 milhões em dívidas. Esse valor deve ser, a princípio, dividido com os compradores, e transmitido paulatinamente aos novos donos, até que eles assumam totalmente a dívida. E quem faz a compra do A Tarde é um grupo de investimentos liderados pelo atual secretário de Educação de Salvador, Guilherme Bellintani. Vale lembrar que o maior concorrente d’A Tarde, o Correio da Bahia, foi fundado pelo ex-senador ACM e pertence a família do atual prefeito de Salvador, ACM Neto.
Revista Nordeste