Brasileiro radicado há 20 anos nos Estados Unidos, o biólogo Paulo Verardi, de 48 anos, professor da Universidade de Connecticut, mantém sempre um olho nas pesquisas que desenvolve e outro no que acontece no Brasil. Daí que não lhe passou despercebido o surto de zika que começava a ganhar corpo no País no ano passado, ao mesmo tempo em que ele e sua equipe criavam uma plataforma para o desenvolvimento de vacinas.
Num primeiro momento, ele diz que, “como todo o resto do mundo”, não se preocupou muito, já que a infecção parecia ter sintomas leves. Mas, quando a suspeita de relação com a microcefalia começou a ser levantada, ainda em outubro, Verardi quase imediatamente se lançou numa busca para o desenvolvimento de uma vacina.
Nas últimas semanas, sua história começou a pipocar em reportagens na imprensa americana, que o retratam como talvez o primeiro cientista a entrar nessa corrida. E como um toque de burocracia pode ter atrapalhado o desenvolvimento da tão esperada vacina.
A vantagem de Verardi se deu numa plataforma que ele desenvolveu – e está em processo de patenteamento e publicação -, que permite produzir candidatos à vacina rapidamente, em coisa de uma semana, a partir do sequenciamento do genoma do vírus. A plataforma tinha ficado pronta justo no começo de outubro e ele aproveitou a chance para testá-la com o zika.
Com base no genoma do vírus que circulou na Polinésia Francesa em 2014, ele desenvolveu cinco candidatos à vacina e tem investigado quais podem apresentar as melhores respostas imunes à infecção, mas, na hora de checar, in vitro, quais delas podem ser capazes de gerar anticorpos que neutralizem o vírus, esbarrou num detalhe: ele não tinha o vírus. Sem isso, não tem vacina.
Procura. Verardi contou ao Estado que está desde novembro tentando conseguir amostras do zika. Pediu primeiro ao Brasil, sem sucesso. A legislação brasileira que define o acesso aos recursos genéticos exige aprovação do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, o que leva tempo. Também tentou com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, que recebeu material brasileiro, mas soube que não haveria distribuição.
Tentou, por fim, com outros laboratórios mundiais que manipulam vírus para fins de pesquisa, mas eles não tinham o zika disponível – a produção dos vírus isolados é demorada. “Naquela época, acho que ninguém ainda estava se importando muito com o zika”, afirma. “Quando o mundo acordou para o fato de que haveria demanda pelo vírus, viu-se que ninguém estava preparado.”
Logo outros laboratórios mundiais e institutos brasileiros de pesquisa entraram na corrida. A Organização Mundial da Saúde calcula que pelo menos 15 vacinas estão em processo de desenvolvimento no mundo. “Pela rapidez com que começamos, se eu tivesse o vírus em dezembro, já teria feito testes in vitro e em animais e saberia se esses candidatos funcionam. Talvez pudesse ter uma vacina em testes pré-clínicos”, lamenta.
Ele conseguiu da Europa uma amostra do vírus, mas não é do que está circulando no Brasil. “Quando vi o problema, chamei meus estudantes e disse: ‘vamos começar hoje, antes que se deem conta’. Tinha uma vantagem que meio que se evaporou, mas tudo bem. Acho que todo mundo que trabalha com vacina tem de tentar. Mesmo se eu não conseguir aqui, a gente vai aprendendo o que funciona e o que não funciona. É um processo.”
Fonte: Estadão