“Amassaram a mina, fizeram um túnel na mina, mais de 30”. Foi assim que a mais nova barbárie que agora choca o país primeiro chegou às redes sociais, por meio do perfil de um usuário do Twitter chamado Michel. A “mina” a que ele se refere, uma garota de 16 anos, havia sido estuprada na última sexta (20), por 30 homens. Naquela mesma noite, a 2.124 km dali, em Bom Jesus (PI), uma adolescente de 17 anos era violentada por cinco homens, sendo quatro menores de idade.
Há exatamente um ano, no dia 27 de maio de 2015, quatro meninas foram vítimas de estupro coletivo em Castelo do Piauí (PI) e atiradas de um penhasco de mais de dez metros. Uma delas morreu logo depois.
Não há coincidências nessas datas. Elas apenas revelam o quanto impera no país a cultura do estupro, o quanto a violência sexual tornou-se algo usual dentro da nossa sociedade.
Por aqui, a cada 11 minutos, uma mulher é estuprada, segundo o último Anuário Brasileiro de Segurança Pública, com dados de 2014. Naquele ano, quase 48 mil pessoas foram vítimas do crime no Brasil.
É bem provável que esses números só representem a ponta do iceberg. Feridas, humilhadas, ameaçadas e amedrontadas, muitas mulheres nem chegam a denunciar seus algozes. Algumas, só o fazem quando engravidam e buscam o aborto legal.
A barbárie no Rio veio à tona quase uma semana depois, ainda assim porque o tal Michel, agora procurado pela polícia, resolveu revelar o feito na internet.
Não é só Michel que merece punição. Quem filma e compartilha esse tipo de crime ou quem acha graça dessa covardia abominável é tão culpado quanto.
Sim, há muitas urgências neste país, mas não dá mais para a sociedade brasileira dar os ombros para essa questão. Essas meninas não foram estupradas porque estavam bêbadas, drogadas, com vestidos curtos, com os seios à mostra ou em lugares errados ou com as pessoas erradas.
Foram estupradas porque são mulheres, porque são vistas como objetos sexuais, como propriedades dos homens, e não como seres dotados de direitos e de vontade própria.
Há uma farta literatura sobre o tema, como a obra norte-americana “Rape Culture” (Cultura do Estupro) e a brasileira “Violência Sexual no Brasil: perspectivas e desafios”. E mais recentemente, a pesquisa do Ipea (2014) não deixou dúvidas sobre isso: 26% dos entrevistados consideram que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”.
O enfrentamento a todo tipo de violência contra a mulher deveria ser uma pauta permanente de toda a sociedade, não apenas, ou prioritariamente, do movimento feminista.
É uma lição que toda mãe, que toda avó, que toda irmã, que toda professora deveria ensinar aos seus meninos desde sempre. A tolerância e “normalização” dessas questões acabam por incentivar e perpetuar esses crimes.
Fonte: Folha
Créditos: Cláudia Collucci