Wanessa Camargo é do tipo que fala demais, tem opinião pra tudo, faz vários questionamentos e vira sua melhor amiga em cerca de meia hora de bate-papo. Com simplicidade e uma simpatia contagiante, não é difícil se encantar por ela. Aos 39 anos, a artista admite que está em um processo de redescoberta e, que, apesar dos 20 anos de carreira, dez álbuns e dois DVDs, pretende ir além.
“Em termos de conquista em estatísticas está tudo certo. Mas é engraçado porque tenho uma sensação de que ainda tenho uma missão dentro do meu trabalho como artista que nem arranhei a superfície ainda. Em termos de arte, do que quero mostrar e falar. Agora, com 39 anos, estou conseguindo trazer à tona um pouco mais de mim, como ser humano. É nesse lugar que me encontro hoje, num processo de vida, de saber quem sou e começar a trazer pra fora, a desabrochar esse botão”, explica.
A cantora, inclusive, define essa Wanessa que está surgindo. “Sou tudo ou nada. Oito ou 80. Existe uma pessoa dentro de mim que agora está tendo coragem de se mostrar. Com as suas ideias, dificuldades, vulnerabilidades, suas forças, que ainda virá à tona no trabalho. Veio em pequenos pedaços, mostrou, se escondeu. Nesse meu exato momento de carreira, o que falta é exatamente isso: trazer uma arte, algo musical que eu olhe e fale: ‘Nossa, eu fiz’. ‘Isso aqui é meu’. Esse lugar ainda falta, mas está chegando perto”, promete.
Enquanto esse trabalho que a completará não acontece, Wanessa e Zezé Di Camargo presentearam o público com um álbum inédito chamado ‘Pai & Filha’, lançado em dezembro. “Poder gravar um projeto todo com ele não é uma honra só da filha, é da cantora. Foi muito gostoso de fazer. Várias coisas nele me emocionaram. Primeiro, ouvir meu pai com a voz que ele está agora, depois que ele teve problemas, me deu uma felicidade muito grande. O processo de escolher as músicas com ele também foi muito divertido”, afirma a artista, que recorda o momento que mostrou a música ‘Isso é o Amor’, em homenagem a Zezé, para ele. “Ele começou a chorar. Fiquei muito emocionada”.
Para a cantora, ver o pai emocionado foi uma surpresa. Segundo ela, Zezé mudou muito desde a morte de seu Francisco, no fim de 2020. “Vejo um outro pai depois que meu avô faleceu. Conheci o Zezé filho, que não conhecia tanto, de ver ele cair quando perdeu o pai. Acolhi meu pai como se eu fosse a mãe dele. Essa troca que a gente tem na fase adulta é muito bonita. Quando você passa de só pedir o colo pra dar colo”.
Série sobre a vida da família Camargo
No final do ano passado, Wanessa participou da série “É o amor!”, da Netflix, em que mostra a vida real das relações da família Camargo. A artista confessa que foi estranho ser filmada por tanto tempo, como se estivesse no ‘Big Brother Brasil’. “Foi estranho no início, depois você esquece. É muito louco câmera mesmo. Primeiro, você está pensando no que você não quer mostrar na câmera, você se policia. No começo lembro que falei: ‘Nossa, estou me sentindo engessada. Não estou sendo eu, estou incomodada’. A gente fez um ajuste para que a câmera não fosse mais vista e isso foi importante pra gente ser sincero. Nunca achei legal fazer uma série e mostrar como a gente é uma família legal. Sempre olhei pra isso como uma forma de trazer pra um lugar comum. Para que você olhasse e se reconhecesse como filha, como mãe, amiga, irmã… A minha intenção sempre foi mostrar que nós todos somos muito parecidos como seres, as famílias são muito parecidas”.
Após conferir o resultado da série, a cantora conta que conseguiu se desprender de algumas questões. “Pra mim, teve alguns momentos difíceis. Desde coisas bobas como: ‘olha como a minha barriguinha ali no vídeo, com uma gordurazinha’. Depois, eu refletia: ‘Ah, Wanessa, para’. Isso foi um desprendimento legal que a série me trouxe, de não estar sempre impecável. Foi também importante a vulnerabilidade, mostrar as dificuldades, os pensamentos e não ter medo do que as pessoas iam achar de mim”.
A chegada dos ‘enta’
Em dezembro, Wanessa completa 40 anos e dá início a fase dos ‘enta’. Ela confessa que o número assusta um pouco. “É um dilema, eu tenho essa crença como todo mundo, que foi colocada na gente. Mesmo que não me sinta com a idade que tenho, que me olhe no espelho e veja uma idade diferente, o número assusta. Estou chegando nos 40, não cabe isso (risos). Acho que posso fazer tudo o que quiser”, comenta. “Se eu olhar no espelho e achar que está demais a barriguinha de fora, tiro a barriguinha e acabou. Vou fazer o que quero fazer, se eu ficar ridícula, problema de quem me achar ridícula”, opina.
Bodas de cristal
A cantora e Marcus Buaiz estão debutando no amor. Os dois comemoram 15 anos de casados no mês que vem. “Em maio a gente completa 15 anos. A gente vai fazer uma viagem bem legal, em junho, pra ficar com a minha mãe, nos Estados Unidos”, adianta ela, que entrega os segredos para uma relação duradoura. “A gente vai mudando, o ser humano não é o mesmo a vida inteira. Nessas fases, onde as transições acontecem, é muito importante olhar pro lado. É o querer estar junto. Parceria, pra mim, é você respeitar as vontades individuais do outro”.
O casal, inclusive, tem um diálogo muito aberto e não vê problemas em ter momentos a sós. A artista também diz não se importar com o que as pessoas acham do relacionamento deles. “Dane-se o que as pessoas vão pensar. A gente tem que se questionar sobre essas regras de casamento que inventaram. A gente não lê, o que falam sobre a gente. A gente sabe o que tá dentro da gente, o que funciona. Por exemplo, a gente nem sempre dorme no mesmo quarto. A gente tem hábitos diferentes de dormir a noite. Marcos precisa de escuro absoluto, eu de luz. Eu preciso ler um livro antes de dormir, o Marcos não pode ouvir um barulhinho. A gente não dá pra dormir muito junto não, dá briga “, afirma ela, aos risos. “Cada um inventa uma forma pro seu casamento. É respeitando as diferenças que une mais a gente. É muito bacana ver que ele está disposto a desconstruir e eu também”.
Relação com os filhos
Mãe de José Marcus e João Francisco, Wanessa é muito atenta a criação dos filhos e preza pelo diálogo entre eles. “Você não sabe o orgulho que eu tenho José chegar pra mim e falar: ‘mãe, eu fiz isso na escola, aconteceu isso. Vi um vídeo errado, me desculpa’. Eles não buscam mentir com medo da minha reação, me dá uma felicidade imensa. Porque eu sei que se acontecer algo de errado na escola, eles vão me contar. Pra mim, o ser mãe não é estar 24h grudada no filho, porque acabo me sentindo culpada, às vezes, por não estar o tempo inteiro levando na escola, buscando, ou tendo que viajar. Mas sei que sou uma mãe que está ali o tempo inteiro, porque eles me procuram. Eles me buscam nas dificuldades, nas dúvidas. Claro que não é o tempo inteiro, porque aqui não é um quartel”, destaca.
Diferente do que muitos pensam, os filhos da cantora não podem ‘tudo’, apesar de terem condições privilegiadas. Wanessa conta que já negou coisas para os pequenos durante um passeio ao shopping. “As pessoas acham que tenho dinheiro. Tem horas que eu não posso dar. Não posso mesmo, tem que pagar a comida, as despesas. Existe o pai, a mãe, cada um ganha seu dinheiro, e existe o dinheiro da família. Mas tem vários momentos que a gente chega ao shopping e fala: ‘hoje, a gente veio fazer isso aqui. Hoje não dá pra comprar isso, não tem como pagar isso aqui, não tem dinheiro’. Não tem. Isso já aconteceu mesmo. Veio a pandemia aí, eu tô sem fazer show. Não tá essas coisas…”, pontua.
‘Criança tem que ser criança’
João e José vivem em uma geração completamente diferente da que Wanessa viveu. Com isso, ela fica ligada no que os filhos ‘consomem’ de informação, música… “Uma coisa que me preocupa como mãe urgentemente: criança tem que ser criança. Tem música que tem que estar realmente proibida, não dá. Meu filho colocou ‘Baile de Favela’. Estávamos dançando, mas veio uma frase, que não tinha me tocado, com uma informação de perereca, uma coisa assim. Ele tem seis anos, ele não vai saber lidar com essa informação, vai agir de forma errada, não está pronto pra isso. Falei pra ele: ‘sei que essa música é legal, mas tem músicas que são parecidas, tem o ‘Pão de Queijo’ (do Bolofofos)’. Infelizmente, tenho que proibir algumas coisas pra eles e ser a mãe chata e conservadora que nunca quis ser. As crianças não têm capacidade de lidar com uma sexualidade precoce”, opina ela, que desabafa. ” Acho um absurdo, quando estou em um resort, cheio de criança, e começa a tocar uma música dessa. Estou em um buffet infantil e aparece um clipe que tem uma bunda aparecendo. Vi isso acontecer no telão de uma festa de uma criança de 5 anos. O clipe de uma pessoa que adoro, inclusive, mas que meu filho parou e ficou (boquiaberto). Aí começa a criança a querer bater na bunda dos outros, a apertar o peito. Não dá”.
No entanto, ela reforça a importância de conversar sobre todos os temas com os pequenos. “Tem coisas que acho super importantes. Meu filho quando falou pela primeira vez a palavra gay. Chamei ele e explique: ‘Tem homem que namora com homem, mulher que namora com mulher, tem gente que namora homem e mulher. E tá tudo bem’. É aí que vejo: putz, não sou conservadora. Acho que tudo tem sua fase. Como ele falou e trouxe a palavra homossexualidade pra casa, ele precisava entender que estava tudo bem. Porque chega trazendo da rua de forma errada, os achismos, trazendo a palavra gay como xingamento, zoação”.
Valor à simplicidade
Durante o bate-papo com O DIA, Wanessa Camargo relembra um passeio que fez com à família ao Mercadão de São Paulo, em que comeram o famoso sanduíche de mortadela. “Foi tão gostoso. A gente passeou, fez compras lá”. Logo depois, ela refletiu sobre a importância dos pequenos conhecerem o lado simples da vida e dar valor a ele. “Lógico, não vou mentir, meus filhos tem condições privilegiadas, mas venho de uma condição bem diferente.. A gente foi à casa da minha avó esses dias, que não via há dois anos. O sitiozinho da minha avó, é o pedacinho de chão dela, o paraíso. É muito simples, é uma casa que o telhado tem um buraco, entra morcego, o chão é de terra batida. É uma casa toda bonitinha, limpa, mas que é bem diferente das casas de Alphaville (bairro de São Paulo), que eles estão acostumados, que tem mármore”.
“Isso pra mim é muito importante. Mostrar da onde eu vim, da história deles, reconhecer da onde vem. Porque não é toda hora que eles podem ter tudo. Falo isso com muito orgulho, nunca sai da Zona Leste, um bairro de São Paulo, eu nunca pertenci a uma elite. Ao contrário, sempre me senti estranha. Pra mim, é importante que eles entendam que vivem numa bolha, mas que a gente não está confortável nessa bolha. Que a vida pode colocar a gente em lugares diferentes, que a gente tem que ter humildade, gratidão pela condição que a gente tem. A gente tem obrigação, por ter mais, de compartilhar o bem que a gente tem”, completa.
‘Fechei a fábrica’
Apesar de ser uma mãe dedicada, Wanessa conta que, no momento, não tem mais vontade de ter mais filhos. “Quando eu tive um aborto há um ano, isso me deu uma travada. É um lugar que eu ainda não quero mexer. Acho que fechei a fábrica”, avalia a cantora, que não descarta a possibilidade de adotar. “Aí, sim. Isso ainda não está fechado”.
Fonte: O DIA
Créditos: Polêmica Paraíba