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DE JACK NICHOLSON A JOAQUIN PHOENIX: todos os Coringa, do pior ao melhor

Joaquin Phoenix é sério candidato ao Oscar com seu Coringa. E outros que interpretaram o angustiante palhaço

Montagem sobre um fundo do logótipo de Batman com os Joker de carne e osso que assustaram aos espectadores.

Há vários atores que deram voz ao Coringa em videogames e séries de animação (provavelmente Mark Hamill é o mais famoso deles), mas somente poucos se atreveram a entrar na pele desse personagem no cinema e na televisão.

Elencamos do pior ao melhor, segundo nosso critério…

6. Jared Leto, em ‘ Esquadrão Suicida’ (David Ayer, 2016)

O que fez para construir o papel. Basicamente, as grosserias feitas por Jared Leto (Luisiana, Estados Unidos, 1971) durante a filmagem. E não o dizemos por suas discutíveis, ainda que respeitáveis, escolhas estéticas, como exibir dentes prateados, mais tatuagens do que Sérgio Ramos (jogador do Real Madrid) e tingir o cabelo como se acabasse de voltar de uma rave em Ibiza, e sim pelo que fez seus colegas de elenco passarem. O brincalhão Leto enviou ao restante do elenco pacotes que continham ratos vivos, cabeças de porco retiradas de açougues e bolas anais. Um anjinho…

O resultado. Tentando se afastar da enorme sombra de Heath Ledger, Leto construiu um Coringa que era todo virilidade e um assíduo frequentador dos clubes de strip-tease. Como costuma acontecer com os que fazem alarde do excesso de testosterona, acabou derrotado por uma mulher: concretamente, foi Margot Robbie como Haley Quinn, a namorada do Coringa, que atropelou o excessivo Leto (e alegrou o restante do elenco). Normal que várias de suas cenas tenham sido eliminadas da montagem final e seu personagem, reduzido ao mínimo. Uma afronta que nenhum supervilão poderia/deveria aceitar.

Jared Leto, um Coringa com excesso de testosterona.
Jared Leto, um Coringa com excesso de testosterona.

5. Cameron Monaghan, em ‘Gotham’ (série, 2014-2019)

O que fez para construir o papel. Um Coringa que sofre de alopecia e com um rosto desfigurado a meio caminho entre o monstro de Frankenstein e o Nosferatu, consequência do banho de ácido na empresa ACE Chemicals. Trabalhou muito um toque gutural que, pelo visto, incomodava os outros atores durante a filmagem.

O resultado. É preciso admitir que o fato de Cameron Monaghan (Califórnia, 1993) interpretar os irmãos gêmeos (Jerome e Jeremiah Valeska) tem muitos méritos. Especialmente porque os roteiristas da série se divertiram enganando e ludibriando constantemente os telespectadores com sua identidade. Talvez esteja muito inspirado pela visão de Tim Burton do personagem ainda que sua conversão ao Mal (sem spoilers) seja surpreendente.

Cameron Monaghan, a meio caminho entre Frankestein e Nosferatu.
Cameron Monaghan, a meio caminho entre Frankestein e Nosferatu.

4. Cesar Romero, em ‘Batman’ (série de TV e filme, 1966)

O que fez para construir o personagem. Ele chegou primeiro, de modo que os outros precisaram, para o bem e para o mal, imitá-lo. Para Cesar Romero (Nova York, 1907 – Califórnia, 1994) ser o Coringa era um trabalho, e não havia por que deixar a pele nisso. De fato, sequer raspou seu legendário bigode, alegando que, “quando você coloca uma roupa como a do Coringa, já tem o personagem”. Ele colocava a maquiagem branca por cima, para estar preparado para suas noitadas após retirar a maquiagem.

O resultado. É a perfeita encarnação da série dos anos sessenta protagonizada pelo legendário Adam West: colorida, entusiasmada e debochada e o oposto ao Coringa de Joaquin Phoenix: Romero deu ao personagem todo o glamour de sua estirpe (é sempre bom lembrar, seu avô era ninguém menos do que José Martí, líder da independência cubana). Seu Coringa é um garoto travesso que, mais do que ser um perigoso psicopata, tem como passatempo causar contratempos ao Batman, que nunca dão certo por sua proverbial incompetência. Nesse sentido, recria à perfeição o que os leitores da primeira época sentiram, antes do revisionismo dos anos oitenta obscurecer sua biografia.

Cessar Alecrim, o primeiro Coringa.
Cessar Alecrim, o primeiro Coringa.

3. Joaquin Phoenix, em ‘Coringa’ (Todd Phillips, 2019)

O que fez para construir o personagem. Para encarnar seu Coringa, Joaquin Phoenix (Porto Rico, 1974) perdeu 23 quilos. Treinou o corpo imitando os movimentos de Fred Astaire e Frank Sinatra. Também ensaiou durante quatro meses suas diferentes risadas malévolas. O Oscar só lhe escapa se algum doente mental, desses que não sabem separar realidade e ficção, cometer um ato violento dizendo-se inspirado nele.

O resultado. Joaquin Phoenix compõe um retrato hiperbólico (pobre, sem recursos e com um enorme complexo de Édipo) do grande homem irritado pelo século XXI. Alguns fãs não gostaram muito, consideram que explicar as razões da maldade do Coringa é diminuir o personagem. Ou seja, o ator está acima da história. Pode ser, mas seu trabalho é esplêndido. Sua dança ao som de Rock and Roll Part 2, de Gary Glitter, vale a pena ser vista.

Joaquin Phoenix, o retrato hiperbólico do homem irritado.
Joaquin Phoenix, o retrato hiperbólico do homem irritado.

2. Heath Ledger, em ‘Batman: O Cavaleiro das Trevas’ (Christopher Nolan, 2008)

O que fez para construir o personagem. Ele se trancou no quarto de um hotel durante dias vendo repetidamente Laranja Mecânica, escutando músicas punk de Sid Vicious, lendo as antigas histórias de Batman, e procurando um tom de voz entre irreal e espectral que fosse capaz de assustar na tela. Chegou a fazer uma lista com as coisas que fariam rir um maluco como o Coringa. Atenção a algumas delas: a AIDS e bebês cegos.

O resultado. É difícil avaliar um trabalho indefectivelmente influenciado pelo trágico final de Heath Ledger, morto por overdose aos 28 anos seis meses antes da estreia do filme. A partir daí, centenas de artigos sobre até que ponto entrar no papel acabou por causar-lhe distúrbios psíquicos. Algo improvável já que se comenta que, de fato, Christopher Nolan, o diretor, não estava muito feliz com o fato do Coringa desaparecer da vida de Ledger entre cada filmagem. Ledger deu ao personagem um toque muito mais ambíguo, começando pelas constantes mentiras sobre a origem de sua deformidade, e frisa seu caráter de sádico compulsivo, se transformando no autêntico Rei do Caos. O pobre Ledger, entretanto, quase joga tanto trabalho pela janela, na cena do hospital em que aparece travestido de enfermeira. Ganhou o Oscar e, provavelmente, merecia um filme inteiro.

Heath Ledger, um Coringa condicionado pela trágica morte do ator.
Heath Ledger, um Coringa condicionado pela trágica morte do ator.

E o melhor: 1. Jack Nicholson em ‘Batman’ (Tim Burton, 1989)

O que fez para construir o personagem. Agradou o desenhista e escritor Bob Keane, criador dos quadrinhos de Batman e do Coringa, que o preferia a outros nomes como os de David Bowie, Willem Dafoe e Robin Willians. Kane devia ter muito poder, porque Nicholson recebeu seis milhões de dólares (24 milhões de reais), uma quantidade fabulosa se levarmos em consideração que o filme custou 40 (164 milhões de reais). Longe da interpretação maníaca – que alguém poderia chamar de bobagem – do resto dos colegas de lista, Nicholson fez o impensável: em vez de se transformar no Coringa, fez com que o Coringa se transformasse nele. Dessa forma, seu vilão tem os atributos irônicos e hiperteatralizados de outros personagens imortalizados pelo ator, como o Jack Torrance de O Iluminado e o McMurphy de Um Estranho no Ninho. E, claro, o Jake Gittes de Chinatown, evocando o vestuário, o estilo e os gestos para dar ao personagem o toque de cinema noir procurado por Tim Burton.

O resultado. E Nicholson não fez só isso que acabamos de mencionar. Seu personagem é um supervilão, mas também um enorme prazer. Ver a maneira como se mexe ao som da trilha sonora de Prince enquanto joga sacos de notas pelos ares é coisa de um autêntico ídolo. Tim Burton, entretanto, foi acusado de menosprezar a figura do Batman ao exaltar a do Coringa. E, considerando que enfrentou o melhor Batman de todos, o de Michael Keaton, é claro que isso tem muitos méritos. O diretor se defendeu dizendo que era uma luta de contrários, que os dois eram psicopatas, duas faces da mesma moeda. Pelo hedonismo e por mudar a história do cinema, Jack Nicholson é nosso favorito.

Jack Nicholson, irônico e hiperteatralizado. O melhor.
Jack Nicholson, irônico e hiperteatralizado. O melhor.

Fonte: El País
Créditos: RUBÉN ROMERO SANTOS