Era 2014 e os recém-formados cientistas da computação Lucas Mattos e João Brant tinham um objetivo em comum: não arranjar um emprego convencional. A saída foi apostar na criação de games, uma paixão dos dois, para tentar manter o sonho de pé. Parece que deu certo.
4 anos e alguns “freelas” depois (pois dinheiro não cresce em árvore) e “Dandara”, segundo game do estúdio Long Hat, formado pela dupla em Belo Horizonte (MG), foi lançado para PlayStation 4, Xbox One, PCs, Android, iOS e Switch, com direito a ser um dos primeiros títulos mostrados para a plataforma mais recente da Nintendo.
O trabalho atraiu a produção internacional e apareceu em sites gringos de destaque. E a ideia por trás de “Dandara”? Um game de pulos e ação com direito a Tarsila do Amaral, uma personagem tirada do Brasil colonial e uma ideia nova para os jogos da linhagem do clássico “Super Metroid”.
‘Pula, sai do chão’
“Dandara” é um game do gênero “Metroidvania”, em que o progresso pelas diferentes áreas do mapa do jogo depende da descoberta de novas habilidades. Mas há uma grande diferença em relação aos demais colegas de categoria.
Em “Dandara”, você não consegue andar. A movimentação é feita exclusivamente com pulos do chão para o teto e depois para as paredes, num grande zigue-zague que ganha ares psicodélicos com a ocasional mudança de orientação dentro de algumas salas.
Em entrevista ao G1, Mattos e Brant dizem que essa mecânica surgiu a partir da ideia inicial de criar um game para celulares.
“O objetivo inicial era usar o ‘swipe’ [movimento de arrastar] na tela para pular. Era desenvolver para smartphones porque é mais fácil de publicar”, afirma a dupla.
“Queríamos fazer um game em que você atirasse e se movimentasse com certa liberdade. Nunca gostamos daqueles controles que aparecem em cima da tela em alguns jogos”.
Na mesma época, a equipe contatou a “publisher” sueca Raw Fury, que procurava games independentes para produzir e publicar. “Eles jogaram e gostaram e deram a ideia de usar controles. Daí pintou o Switch e foi dando certo. Nosso objetivo era chegar no videogame”, dizem.
Cultura brasileira, mas sem propaganda
A protagonista do game leva o nome de Dandara por conta de Dandara dos Palmares, heroína que lutou ao lado de Zumbi dos Palmares, no Brasil colonial, contra a escravidão dos negros.
Mattos e Brant contam que a ideia da personagem não é estabelecer uma construção ideológica ou crítica com os temas de sua origem, mas que buscar essa inspiração foi importante para ajudar “Dandara” a tentar fugir das mesmas ideias americanas, japonesas e europeias dos outros jogos.
“Como nosso foco é a mecânica do jogo, é muito difícil contar uma história complexa. Ficamos preocupados em não respeitar o assunto escravidão”, eles dizem.
“O nome do projeto se tornou Dandara porque era uma inspiração legal. Começamos a produzir o design da personagem e a partir daí criamos um mundo fantasioso, misterioso. E ela sobreviveu. Numa história de luta pela liberdade, essa é a mensagem dela. Fez sentido e reforçou o significado do game”, afirma a dupla.
Mas Dandara dos Palmares não é a única pitada de cultura brasileira em “Dandara”. A obra “Abaporu”, de Tarsila do Amaral, aparece viva dentro do jogo como a pintora Tarsila, que desbloqueia uma das habilidades de Dandara.
“Nunca tivemos a intenção de fazer propaganda da cultura brasileira. O que fizemos foi procurar inspiração no que a gente vê”, diz a dupla. “Mas acreditamos que fazer algo inspirado em nós mesmos vai criar um diferencial num cenário cheio de mesmices. É uma das formas de você ser criativo sendo influenciado pela própria cultura”.
“Mas é importante pro mercado brasileiro criar um estranhismo ao recriar do zero as nossas ideias e fazer jogos que tenham a nossa cara. Isso aumenta a possibilidade do jogador se identificar e perceber o que outros brasileiros já fizeram”.
Fonte: G1
Créditos: G1