“Não vou falar de política”, avisa Elza, diante de perguntas sobre a realidade do país. Faz uma negativa com a cabeça. E se cala. Hoje, Elza prefere concentrar seus protestos nas músicas (como “Maria da Vila Matilde”, em que ameaça denunciar o personagem agressor à Central de Atendimento à Mulher —”Cadê meu celular?/Eu vou ligar pro 180″) e nos shows.
Como na sua recente participação no Rock in Rio, em setembro, quando gritou “machistas não passarão” e “vamos aprender a votar, porque nós não sabemos”. Entoou também nomes de vítimas da violência no Rio, como o da menina Ágatha Félix, 8, morta por estilhaços de uma bala de fuzil no Alemão, na zona norte, e o da vereadora do PSOL Marielle Franco, assassinada em 2018.
Em casa, o tom não é de revolta, mas de lamento. Elza se diz “pasma” com a violência contra a mulher. “É o mal do século. Aliás, é mal da vida toda”, define.
“Não devemos ter ódio. Minha raiva está no bem. A raiva faz com que a gente tenha mais força, mais coragem. É raiva de luta, de busca pelo bem.”
Forçada pelo pai a se casar aos 13 anos, Elza foi estuprada e espancada após a união com Alaordes Soares, dez anos mais velho. O homem ainda tentou atirar duas vezes contra ela quando descobriu que a mulher se tornara cantora. Um dos tiros pegou de raspão no seu braço. Por medo, Elza não denunciou.
Anos depois, sofreu agressões daquele que seria seu grande amor, o jogador de futebol Garrincha (1933-1983), já no fim do casamento de 17 anos. Num desses episódios violentos, Elza teve os dentes quebrados por ele, conforme descreve Ruy Castro na biografia do craque, “Estrela Solitária”. Já no livro de Zeca Camargo, a cantora justifica o comportamento do parceiro: “Não era ele quem fazia aquilo, era a maldita bebida”.
No fim da década de 1970, a cantora quis denunciá-lo, mas desistiu, quando, já na delegacia, soube que Garrincha poderia pegar de dois a quatro anos de prisão, caso fosse condenado por lesões corporais. E foi embora de casa quando percebeu que o alcoolismo do companheiro poderia prejudicar a vida do único filho do casal, Garrinchinha. São lembranças que Elza não gosta de resgatar.