A pesquisa nacional Impactos da Covid-19 na Economia Criativa, feita pelo Observatório da Economia Criativa da Bahia (OBEC-BA), em parceria com o think tank (laboratório de ideias) cRio ESPM, revela que embora 50,2% das organizações tiveram que demitir em função da pandemia e 65,8% fizeram reduções em contratos, 45,1% dos profissionais e 42% das empresas conseguiram desenvolver novos projetos durante o período de isolamento social. Parcela de 12% dos indivíduos e 18% das organizações consultados buscaram novas formas de geração de receita, entre elas a antecipação de venda de ingressos, campanhas de doação ou de financiamento coletivo. Os resultados da pesquisa foram divulgados hoje (25).
O estudo via a analisar os efeitos da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus nas áreas culturais e gerar dados que auxiliem na elaboração de ações para a retomada do setor no período pós-pandemia. A pesquisa foi feita entre 27 de março e 23 de julho passado, com um total de 2.608 entrevistados, sendo 969 organizações e 1.639 pessoas físicas de todas as áreas relacionadas à arte, cultura e economia criativa.
Tecnologias
A pesquisa verificou que a demanda por capacitação digital vem crescendo entre os profissionais do setor e é apontada como solução para a retomada dos negócios: 55% indicaram a necessidade de adotar estratégias digitais de relacionamento com o público, venda de produtos e prestação de serviços e acesso a serviços e equipamentos para o trabalho remoto. A pesquisadora do cRio ESPM, Luciana Guilherme, confirmou à Agência Brasil que essa tendência está muito forte, “porque as pessoas tiveram que se adaptar para atuar no ambiente digital”. A maioria, porém, não domina todas as tecnologias. “Somente o básico, o uso de rede social, a forma como se comunica, que é mais cotidiana. Mas você usar isso como processo de monetização de um trabalho é mais complexo”. Essa demanda apareceu muito na pesquisa. Segundo Luciana, em alguns casos, a internet tem sido o único meio desses profissionais e empresas obterem renda.
A pesquisa mostra que a maior parte dos profissionais que trabalham com economia criativa recebe até três salários mínimos por mês; 31,5% trabalham mais de 45 horas semanais. Cerca de 71,2% dos indivíduos e 77,8% das organizações têm reservas financeiras para garantir um período máximo de três meses de subsistência, partindo de suas atividades profissionais. “Porque eram atividades essencialmente presenciais, e as previsões que a gente tem acompanhado é que esse retorno seria mais para o ano que vem. Temos percebido isso no mundo todo”, afirmou Luciana. Ela destacou que nesse ambiente de incerteza, a necessidade de compreender as tecnologias e como usá-las é urgente, especialmente para os profissionais e artistas independentes e autônomos.
Auxílio emergencial
Entre as sugestões feitas pelas organizações para retomar as atividades, estão a desoneração tributária, o perdão de dívidas e o apoio para o pagamento de funcionários. Já o auxílio emergencial, criado pela Lei Aldir Blanc, é priorizado pelos profissionais consultados para enfrentar a pandemia. A Lei nº 14.017, de 29 de junho de 2020, conhecida como Lei Aldir Blanc, nasceu com o objetivo de promover ações para garantir renda emergencial aos trabalhadores da cultura e a manutenção dos espaços culturais durante o período de pandemia. “É uma demanda urgente, urgentíssima”, disse Luciana Guilherme. Ela observou, por outro lado, que o auxílio está projetado para três meses e vai funcionar como um “paliativo” se as atividades seguirem fechadas por mais tempo.
Coordenador do Fórum Estadual de Cultura de Mato Grosso do Sul, Anderson Lima afirmou que o movimento “está na luta pela implementação da Lei Aldir Blanc e tentando fazer de tudo para que ela chegue de maneira mais democrática e consiga atender a todo mundo que está precisando desse auxílio”. Isso se explica porque muitos técnicos vinculados à cultura não foram contemplados com essa verba emergencial. Lima nabifestou preocupação por 2020 ser um ano eleitoral e esse dinheiro acabar destinado a municípios que nunca investiram na cultura. Comitês estão sendo criados em todo o país para evitar que o dinheiro do auxílio emergencial seja usado para fins eleitorais.
Para a pesquisadora do Obec-BA, Beth Ponte, a reduzida familiaridade com os mecanismos de financiamento realça a necessidade de procedimentos mais simples e acessíveis de acesso à Lei Aldir Blanc, para que os recursos cheguem ao setor cultural de forma rápida e ampla. Beth acentuou que o setor criativo “foi duramente afetado em sua forma de subsistir e de existir, pois a coletividade, a presença e o convívio são centrais para a criação e a distribuição de grande parte dos produtos culturais”.
Indefinições
A indefinição em relação ao lançamento de uma vacina contra a covid-19 e ao retorno das atividades culturais e artísticas presenciais torna mais pessimistas as expectativas do setor: 51% dos entrevistados disseram não prever quantos trabalhos serão cancelados no segundo semestre deste ano; 65% não têm condições de fazer essa estimativa para o próximo ano; 88,7 % dos indivíduos e 86,8% das organizações acreditam que as atividades ficarão restritas até o fim de 2020 ou além desse prazo. A pesquisadora do cRio da ESPM avaliou que a população também precisa ter maior disciplina e conscientização a respeito da pandemia, para ajudar a curva da doença baixar. “Isso vai adiando, esticando a onda”.
A sondagem revela também que 62% das organizações e 75% dos indivíduos disseram nunca ter se beneficiado de incentivo fiscal em qualquer dos níveis governamentais, embora os apoios municipais e estaduais sejam mais solicitados e acessados que os da esfera federal. Sobre o impacto pela suspensão das atividades, 83,7% das organizações e pessoas físicas entrevistados relataram ter sido muito afetados e indicaram dificuldade de captação de recursos em entidades privadas e públicas; 72% das organizações do setor audiovisual e 87,5% do teatro acessam com mais frequência apoios diretos; 57,1% das organizações do setor do teatro informaram ter projetos financiados por incentivo fiscal, seguidos pelo setor musical,com 43,4%, e as organizações de dança, com 12,8%.
Outras sugestões
Outras sugestões formuladas pelos consultados incluem a criação de editais simplificados e emergenciais, oferta de linhas de crédito, liberação de recursos de fundos culturais e setoriais, suspensão de contas de custeio, pagamento de editais atrasados, bolsas e prêmios, compra ou contratação antecipada de bens, produtos e serviços culturais.
Participaram também da realização da pesquisa o Instituto Federal do Rio de Janeiro, a Universidade Federal Rural do estado e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O Observatório da Economia Criativa da Bahia (OBEC-BA) é um grupo de pesquisa interinstitucional que reúne docentes e discentes da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), da Universidade Federal da Bahia (UFBA), da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), além de pesquisadores independentes e de outras instituições públicas.
Fonte: Agência Brasil
Créditos: Polêmica Paraíba