A travesti Verônica Bolina disse, em depoimento a promotores do Grupo Especial de Controle Externo da Atividade Policial (GECEP), do Ministério Público, na tarde desta sexta-feira (17), que aceitou gravar áudios negando ter sido vítima de tortura e agressões de policiais no 2º Distrito Policial, no Centro de São Paulo, em troca de redução de pena.
A proposta e as gravações teriam sido feitas por Heloisa Alves, coordenadora de Políticas para a Diversidade Sexual do Estado de São Paulo, órgão vinculado à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do governo estadual.
Procurada pelo G1, a assessoria de imprensa da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania disse que Heloísa não quer comentar o caso.
As gravações foram feitas na delegacia, durante visita da coordenadora. Em um dos áudios, Verônica afirma: “Eles reagiram dentro de suas leis” e era direito deles agirem “para contê-la”.
Durante a semana, em redes sociais e grupos de WhatsApp também circulou áudio no qual Heloísa Alves afirma que divulgava as gravações para ajudar a esclarecer dúvidas.
Investigação
Na quinta-feira (16), o Grupo de Atuação Especial de Controle Externo da Atividade Policial (GECEP), do Ministério Público (MP), instaurou procedimento de investigação para apurar denúncias de tortura e maus-tratos contra a travesti Verônica Bolina, após pedido da Defensoria Pública.
Verônica foi detida na sexta-feira (10) por suspeita de tentar matar uma vizinha idosa. Depois, no domingo (12), arrancou a dentadas a orelha de um carcereiro dentro de um distrito policial. A Defensoria Pública alega que ela foi agredida e torturada no 2º Distrito Policial.
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirma que os policiais do 2º DP negaram qualquer agresssão a travesti, e que ela apanhou de presos ao se masturbar na frente deles. Em seguida, um carcereiro foi tentar ajudá-la, mas foi mordido por ela, que lhe arrancou parte da orelha, segundo a polícia.
A mãe de Verônica contestou tal versão. Em entrevista ao G1, a funcionária pública Marli Ferreira Alves declarou que Verônica lhe disse que foram policiais que bateram nela.
“Não teve aquela história de preso bater [em Verônica] e [a travesti] se masturbou na cadeia. Não teve essa história”, disse Marli, 48 anos, nesta sexta-feira (17). “Estão colocando palavras na boca [de Verônica]. Não houve isso”, afirmou.
Marli contou que conversou com Verônica na quarta-feira (15), ainda na carceragem do 2º Distrito Policial, no Bom Retiro. “Não teve preso que bateu nela. Não teve nada disso. Pensa bem: ela está com a cabeça do jeito que ela está. Você acha que ela ia se masturbar na prisão?”, questiona a mãe da travesti.
De acordo com Marli, Verônica relatou que policiais militares e civis a agrediram durante a confusão ocorrida na cadeia e no hospital para onde foi levada ferida.
Fotos
Fotos que mostram a travesti algemada, desfigurada, com os seios à mostra circularam em redes sociais de policiais. “Graças a Deus que vazou tudo isso [fotos de Verônica] na internet. Porque se não tivesse vazado, talvez ela estaria morta agora”, disse Marli. “O que tentaram fazer de mal para ela veio para o bem. Porque se não tivesse divulgado aquelas fotos, talvez a gente não estaria sabendo o que tinha acontecido com ela”.
Apesar disso, a funcionária pública contou que Verônica lhe disse que se sentiu humilhada por causa das fotos que vazaram na web e foram tiradas por alguém que acompanhou sua prisão. “Muita humilhação. Muito humilhada. Não só ela, como todas as travestis, as pessoas em comum. A vergonha de ter passado por aquilo. Foi muito humilhada”, disse Marli.
“Ela [Verônica] também errou, mas ela também não deveria ter sofrido o que ela sofreu”, afirmou Marli. “Ela não tem rosto agora, infelizmente. Ela vai se recuperar porque ela falou que vai sair dali e vai ser a Verônica de novo”.
Marli contou ainda que Verônica é uma pessoa calma e que trabalha como cabeleireira para ajudar a sustentar a famíla, que mora em Mococa. “Minha filha é doce, educada, vaidosa e muito guerreira”, disse. “Me orgulho dela porque ela nunca deu trabalho para mim”.
G1