O estudo geológico preliminar realizado nas falésias de Pipa, no litoral potiguar, indicou que o trecho que desabou e matou um casal e o filho de 7 meses no último mês de novembro possui áreas consideradas de risco. Dez estabelecimentos no topo das falésias, uma residência, duas escadas de acesso e trechos na faixa de areia – incluindo o local onde ocorreu o acidente – seguem interditados na Praia de Pipa.
Nesta quinta-feira (17), a tragédia que vitimou o casal Hugo Pereira, de 32 anos, e Stela Souza, de 33, o filho deles, Sol de Souza, de 7 meses, e o cachorro da família, completa um mês.
O estudo preliminar contratado pela Prefeitura de Tibau do Sul mapeou cerca de 3 km de extensão nas encostas da praia do Centro e da Baía dos Golfinhos, onde aconteceu o acidente, e encontrou 15 indícios de instabilidade. A área foi identificada como “trecho 1” no documento.
O grau de risco foi definido a partir da identificação das áreas de perigo das falésias (sendo P4 a área mais perigosa) e dos índices de vulnerabilidade (sendo V4 o maior). Esse último considera as edificações instaladas nas falésias.
Entenda
- Áreas de perigo – O perigo foi qualificado com base indícios de instabilidade, divididos entre ausentes, presentes ou marcantes. Os indícios são: trincas no terreno, árvores inclinadas, grau de saturação/surgência, degrau/subsidência e cicatriz de deslizamento.
- Índice de vulnerabilidade – Neste estudo empregam-se quatro classes de vulnerabilidade, as quais são classificadas desde muito alta (V4), que considera edificações precárias, até (V1) que considera as construções que apresentam laudo técnico que assegure a integridade da edificação para determinado tipo de movimento gravitacional de massa.
- Áreas de risco – A qualificação do grau de risco está fundamentada no histórico de ocorrências, identificação dos tipos de movimento gravitacional de massa, delimitação da estimativa do alcance dos eventos, reconhecimento de feições de instabilidade no terreno e a resistência das construções.
Foram analisados para o estudo, rachaduras nas falésias, marcas d’água, densidade e inclinação da vegetação, e “cicatrizes” de deslizamentos anteriores.
Segundo o documento, foram encontrados “indícios de instabilidade marcantes em campo ao longo do trecho 1, como escorregamentos e tombamentos de lascas, a presença de árvores inclinadas e várias cicatrizes de escorregamentos marcantes”.
Por essas características, todas as áreas de borda das falésias foram inseridas no maior grau de perigo.
“Além das bordas de falésia nesse trecho apresentarem altura e inclinação superior a todos os parâmetros considerados, chegando próximo ao vertical, que caracterizam mecanismos favoráveis a deflagração de eventos adversos de tombamento de lasca e escorregamentos de massa e em alguns pontos ambos os mecanismos são identificados atuando em conjunto, que assim caracterizam a área como P4 [o maior da escala]”.
Em resumo, as áreas caracterizadas como de perigo, em comum ocorrência com áreas de vulnerabilidade, resultam em áreas de risco 4, o maior grau.
Segundo o documento, 23 edificações estão nessa área de maior risco. O estudo sugere uma vistoria para a avaliação e laudo técnico da capacidade de resistência delas.
A análise geológica também produziu uma carta de perigo, com uma indicação de uma distância de 100 metros da borda da falésia para as ocupações. “Mantidas as condições médias de chuvas para a região, é alta a possibilidade de destruição das construções em caso de movimento gravitacional de massa”, cita.
O documento aponta ainda que as falésias apresentam perfil de 15 a 20 metros de altura com inclinações entre 80° e 90°. “Os processos erosivos são agressivos sobre a face da falésia. No topo, pela ação natural dos ventos e de águas superficiais e, na base das falésias, pela ação do mar devido o ambiente costeiro dinâmico da região”, diz o documento.
“Os setores qualificados com risco são zonas que requerem atenção quanto a suas estruturas e drenagens”.
A análise geológica é preliminar e diz, no documento, que ainda é necessária a ampliação dos estudos de forma multidisciplinar e com a participação dos órgãos competentes. O objetivo é ter soluções para a redução do risco, “como o controle das águas pluviais sobre as áreas de falésia e o reforço e conservação das estruturas, inspeção das drenagens existentes, a fim de se certificar da inexistência de vazamentos que possam levar a saturação do solo”.
“Assim como a ampliação da malha de drenagem, principalmente no setor qualificado como R4 [risco 4, o maior] e em suas adjacências devido as grandes áreas impermeabilizadas neste local, pois o escoamento superficial desordenado pode levar a processos de erosão e a escavação da encosta”.
O município ainda aguarda o resultado da análise técnica do engenheiros civis, que está prevista para ser finalizada neste mês de dezembro.
Trechos interditados
Dez estabelecimentos no topo das falésias, uma residência, duas escadas de acesso e trechos na faixa de areia – incluindo o local onde ocorreu o acidente – seguem interditados na Praia de Pipa desde o dia da tragédia, após recomendação da Defesa Civil do RN.
Segundo a prefeitura, eles seguirão interditados temporariamente até a conclusão dos estudos técnicos. A análise preliminar geológica já foi entregue. Há, atualmente, um estudo feito por engenheiros civis.
Equipes da prefeitura e da Companhia Independente de Proteção Ambiental (Cipam) fazem a fiscalização na faixa de areia para evitar que banhistas desrespeitem o isolamento do trecho.
Já depois do acidente, partes da falésia de Pipa voltaram a desabar no mesmo trecho. Dessa vez, não houve feridos.
Recentemente, Ministério Público Federal (MPF) – que tem 18 inquéritos sobre a situação das falésias – e o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) montaram um Grupo de Trabalho para analisar possíveis riscos no local. Especialistas de várias áreas e órgãos vão avaliar a situação da estrutura e as ações a serem adotadas.
Emergência
A prefeitura de Tibau do Sul decretou situação de emergência no dia 20 de novembro. O decreto tem validade de 90 dias. De acordo com o documento, a área da praia foi afetada por um desastre natural geológico “por movimento de massa com deslizamento de solo/ou rocha”.
O governo do Rio Grande do Norte criou no dia 19 uma força-tarefa para auxiliar o município de Tibau do Sul na fiscalização das áreas interditadas temporariamente nas falésias de Pipa.
O trecho da falésia foi vistoriado também pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil. Segundo o órgão nacional, a medida atual de interdição é a melhor alternativa a curto prazo.
Família morreu soterrada
O desabamento de uma falésia causou a morte de Hugo Pereira, de 32 anos, Stela Souza, de 33, do filho do casal, Sol Souza Pereira, que tinha 7 meses de vida, e do cachorro da família. Uma das vítimas, Hugo Pereira, de 32 anos, era gerente de recepção no hotel Sunbay. Ele é natural de Jundiaí, no interior de São Paulo, e morava havia alguns anos em Pipa.
Testemunhas relataram que eles estavam sentados próximos à falésia, quando houve o desabamento. Stela ainda chegou a tentar salvar o filho e o abraçou antes da queda.
Fonte: G1
Créditos: G1