A vendedora M.S, 21, conta que foi entregue pela mãe à avó materna aos três dias de nascida. E afirma que foi abusada pelo marido dela aos 9 anos de idade. Aos 10, novo pesadelo: ela acusa o tio, irmão de sua mãe, de abuso também. Mas ninguém acreditou e resolveu tentar esquecer a denúncia. Casada desde os 15 e mãe de um casal, a autônoma de 21 anos decidiu reviver o caso e seguir com a acusação contra o tio. Como o marido da avó já é muito idoso, justifica ela, não o denunciou. Ela conta sua trajetória à Universa.
“Fui entregue à minha avó materna aos três dias de vida. Minha mãe explicou, depois de alguns anos, que ela era agredida pelo meu pai, na época envolvido com drogas, e por isso tomou a decisão, para me proteger. Tive pouco contato com eles. Mas minha avó tinha um namorado que vivia me beijando à força e passando a mão em mim. Contei para ela e apanhei. Ela me chamou de mentirosa, disse que ele estava fazendo carinho em mim.
Minha mãe disse que acreditava na minha versão, mas falou que eu não podia levar a sério. Eu tinha nove anos, e pedi para morar com ela.
Um ano após minha mudança para a casa dos meus pais, pedi para um tio, irmão da minha mãe, gravar um DVD de um filme, e ele disse que faria se eu desse algo em troca, mas na hora não entendi. Ele morava conosco. No dia seguinte, enquanto assistia a um desenho, ele passou a mão em mim e falou para não gritar, senão não ajudaria mais minha mãe com as contas da casa.
Mas contei para meus pais. Meu tio negou e acreditaram nele. Minha avó paterna me levou à delegacia e o exame de corpo de delito mostrou esperma dele na minha roupa. Mesmo assim, ele me ameaçou caso seguisse com a denúncia. E minha mãe falou que se eu continuasse com as acusações, eu poderia esquecer a família. Escolhi mentir no depoimento à polícia. Falei que eu mexi na roupa dele. Mas me mandaram para acompanhamento na Vara da Infância, com psicólogos.
Aos 14, minha mãe me expulsou de casa. Eu já não prestava mais atenção nos estudos, não fazia nada e ficava me cortando por causa desses traumas. Parei de estudar na 5ª série. Minha tia, irmã dela, me acolheu. Um ano depois, me envolvi com um homem, hoje com 35, com quem minha tia já havia se relacionado. Quando descobriu que estávamos nos conhecendo, juntou minhas coisas e me levou até a porta da casa dele.
Ele me perguntou se realmente eu queria ficar ali. Para mim, aquela seria uma saída. Eu senti que ele poderia me ajudar e decidi morar com ele. Ele foi acusado de pedofilia, mas foi a única pessoa que me estendeu a mão. Quando completei 18 anos, assinamos a união estável. Hoje, temos uma menina de três e um menino de um ano.
Contei para meu marido toda a história com meu tio. Ele me incentivou a procurar um advogado. Também chamei esse tio para conversar através de um aplicativo de mensagem. Ele confessou o que fez, disse que se arrependeu, que hoje está na igreja e tem um filho. Enviei a conversa para o advogado.
Eu me senti mal fazendo isso, de reviver o passado, mas essa era a chave dos meus problemas. Hoje, consigo tocar a minha vida, trabalho com vendas junto ao meu marido. Caso seja preso, não vai apagar o que ele me causou, mas terá menos chances de fazer outras vítimas.
Outro lado
A Universa procurou o tio de M.S, mas ele não atendeu às ligações. Segundo a vendedora, não consta no processo o nome do defensor do tio. O Tribunal de Justiça de Goiás, onde ocorreu o crime, informou que o caso segue em segredo de Justiça e que, por isso, não tem acesso às informações sobre o processo ou o contato da defesa. A Defensoria Pública de Goiás informou apenas que foi enviada uma carta precatória à Comarca de Planaltina (DF), para que colhessem o depoimento de uma testemunha do caso.
M. enviou à redação a cópia da conversa que teve com o tio. Nela, ele admite que todos os homens têm suas fraquezas, que pede perdão a Deus por seus defeitos e que a sobrinha, apesar de ser criança na época, “não era burra e sabia o que queria”.
Fonte: Universa
Créditos: Universa