Esqueça as grandes manchas, os animais cobertos de óleo e os voluntários lotando as praias para limpeza. O petróleo continua atingindo o litoral nordestino, mas em menor quantidade, consistência mais sólida e em áreas pontuais.
Mas segue preocupando os estudiosos que avaliam a fauna marinha: passados três meses, a persistência do vazamento indica um problema crônico, sobretudo em trechos dos litorais de Alagoas, Bahia e Sergipe, onde ainda há material chegando às praias.
“Os municípios atingidos têm apresentado uma maior reincidência de resíduos oleosos, com a limpeza sendo concluída ao final de cada dia”, diz o Grupo de Acompanhamento e Avaliação, formado por Marinha, ANP (Agência Nacional de Petróleo) e Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
O óleo que chega agora tem características — e efeitos ambientais — diferentes. Além de surgir em pedaços menores, ele também se apresenta mais rígido. Alguns pedaços se parecem a pedras pretas de piche. Ainda há fragmentos minúsculos, similar a grãos de areia, de remoção mais complexa.
Com todas as hipóteses levantadas refutadas, as autoridades brasileiras não têm ninguém hoje suspeito de ter causado o derramamento no mar.
Efeitos do óleo
- 152 animais, a maioria deles, tartarugas marinhas, morreram em consequência do vazamento, segundo o Ibama
- 966 localidades de 129 municípios foram afetados nos nove estados do Nordeste e no Espírito Santo e Rio de Janeiro
Fragmentos menores geram alerta
A chegada do óleo fragmentado está preocupando ambientalistas.
“Quanto menor o pedaço, menor a probabilidade de achar. Isso traz maior probabilidade de animais ingerirem, e é mais difícil de ser diagnosticado”, afirma o biólogo e presidente do Instituto Biota de Conservação, Bruno Stefanis. A entidade comandada por ele atua desde o início do desastre ambiental no tratamento a animais atinfidos pelo óleo em Alagoas.
Segundo Mônica Costa, doutora em Ciência Ambientais do Departamento de Oceanografia UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), a chegada do óleo em pequenos fragmentos muda os padrões de exposição da fauna.
“Da primeira vez foi um monte de óleo de uma vez só, uma exposição aguda. Agora é um pouco de óleo continuamente, uma exposição crônica”, diz.
Para ela, os danos maiores desse novo padrão só devem ser percebidos em longo prazo.
“Geralmente exposição aguda é mais severa, rápida e leva à morte. Mas ela cessa. A exposição crônica é mais prolongada, geralmente leva a danos que não matam logo, mas podem interferir na sua vida e na da sua prole”, explica.
AL e SE confirmam; BA refuta
Procurados pelo UOL, os órgãos ambientais dos governos de Alagoas e Sergipe confirmaram que estão enfrentando problemas com a contaminação em pequenos fragmentos. Entretanto, o governo da Bahia negou que exista mais óleo chegando ao litoral do estado, tanto que, nesta quinta-feira (19), o Comando Unificado encerrou sua atuação naquela região.
“Mas essa não é a realidade que se observa no sul e extremo sul”, afirma o professor Miguel Accioly, da UFBA (Universidade Federal da Bahia), que vem atuando na linha de frente no combate aos impactos do óleo no estado.
“Tem mais de uma dúzia de contenções instaladas na praia de Cumuruxatiba, que tem retido material e impedindo de contaminar os mangues. Os grupos de voluntários continuam trabalhando”, afirma, citando que no litoral norte chegam “restos de praias remobilizados.”
“Mas no sul parece material chegando do mar pela primeira vez”, completa.
Em Alagoas, o coordenador do Programa Estadual de Gerenciamento Costeiro do IMA (Instituto do Meio Ambiente), Ricardo César Oliveira, disse à reportagem que o órgão ainda atua para retirar pequenos fragmentos que surgem nos litorais sul e norte.
“Estamos com equipes da Marinha, Exército, Ibama, ICMBio [Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade], IMA e municípios monitorando e realizando limpezas diárias. Até agora, o estado recolheu por conta própria 2,2 mil toneladas do resíduo”, afirma.
Em Sergipe, o presidente da Adema (Administração Estadual do Meio Ambiente), Gilvan Dias, também confirmou o material chegando em pequenos fragmentos ao litoral.
“Isso ocorre, na maioria das vezes, pelo óleo que ficou impregnado nas pedras de um molhe que foi construído no bairro da Coroa do Meio, em Aracaju; e, com a mudança das marés, ele se desprende e segue para a área das praias. Sem contar que, de vez em quando, também aparecem pequenas quantidades de óleo, provavelmente vindo de substâncias presas em corais, além de chegar de outras localidades”, diz.
Petróleo ainda no oceano
Segundo o pesquisador chefe da força-tarefa montada pela Ufal (Universidade Federal de Alagoas) para investigar o óleo e seus impactos, Emerson Soares, ainda existe petróleo no oceano.
“Com as intempéries, ondas, ventos e movimentos dos oceanos, pequenas amostras chegam ao litoral”, explica. “Por outro lado, devido ao tempo de exposição ao mar e a propriedades químicas, eles vão ficando com consistência mais rígida, favorecendo a formação de fragmentos”.
Nesta quinta-feira (19), o pesquisador conferiu in loco a situação de algumas praias do litoral sul de Alagoas. Ele encontrou fragmentos no litoral dos municípios de Piaçabuçu e Barra de São Miguel.
“Uma vez em que estão no ambiente, com as caraterísticas dos oceanos e das praias —que é de alta movimentação hidrodinâmica e com a exposição ao sol—, eles se incorporam ao sedimento das praias, água e aos próprios organismos. E eles não são facilmente eliminados”, afirma.
Segundo as primeiras análises da força-tarefa, as amostras do material recolhido de praias do Nordeste mostraram que ele é altamente tóxico.
“Ele possui benzeno, tolueno e naftaleno; e metais pesados como mercúrio, arsênio e chumbo. Estes materiais em conjunto causam danos ao ambiente e aos organismos, pois tem efeitos acumulador”, afirma.
“Lembro que também existe óleo enterrado na areia das praias e que ainda não foi retirado.”, complementa.
Fonte: Uol
Créditos: Uol