O Banco Central reforçou nesta quarta-feira, 13, as críticas às moedas virtuais, como o bitcoin. Em entrevista coletiva, o presidente da instituição, Ilan Goldfajn, usou os termos “bolha” e “pirâmide” ao se referir ao crescimento vertiginoso destes instrumentos. Para defensores das moedas virtuais, no entanto, elas vieram para ficar.
A forte valorização do bitcoin em 2017 – de mais de 1.500% no Brasil – já havia levado o Banco Central a divulgar, em meados de novembro, um comunicado a respeito dos riscos das moedas virtuais. Na ocasião, o BC disse que elas estão sujeitas a “riscos imponderáveis” e não são supervisionadas.
O alerta não adiantou. Desde o comunicado do BC, o valor do bitcoin dobrou no Brasil e cada vez mais pessoas entram no mercado. O interesse é tão grande que algumas das principais plataformas de negociação no País estão tendo dificuldades para cadastrar novos investidores. Com cada vez mais interessados, o bitcoin segue subindo.
Essa dinâmica faz lembrar a das pirâmides financeiras, em que a entrada de novos investidores é que sustenta a alta de ativos ou o pagamento de retornos astronômicos. Para o presidente do BC, uma das características deste mercado é justamente a compra para revenda por um preço maior adiante. “Ou seja, comprar e passar para frente, o que é uma típica bolha ou pirâmide”, disse Goldfajn. “Não é algo que nós reguladores deveríamos incentivar”, enfatizou.
Nos EUA, surgiram recentemente notícias de que investidores estão hipotecando suas casas para investir em moedas virtuais. Goldfajn foi taxativo: “Não hipoteque sua casa para comprar essas moedas”.
Para o economista-chefe da nova Futura Investimentos, Pedro Paulo Silveira, Goldfajn está correto em suas observações. Para ele, o bitcoin é uma “mania”. “A moeda virtual está cotada a um múltiplo de milhares de dólares. Hoje, vale entre US$ 16 mil e US$ 17 mil”, citou Silveira. “E o dólar, que é a moeda de uma das maiores economias do planeta, de um Estado que tem o maior exército, vale uma fração do bitcoin. Como é possível isso?”
Silveira diz que uma moeda de fato possui algumas características fundamentais, como a aceitação como meio de pagamento nos processos de compra e venda, por todos os agentes. “E o bitcoin não é utilizado como referência de troca, não é utilizado como meio de pagamento para nada”, afirmou. “O que existe hoje é uma crença, uma opinião irrefletida, em que muitos agentes têm em relação a uma coisa. Essa crença faz preço.”
Para quem está no mercado, porém, as moedas virtuais vieram para ficar. Rodrigo Batista, sócio do MercadoBitcoin, uma das maiores plataformas de negociação de moedas virtuais do País, afirma que o Banco Central, em algum momento, terá que rever sua posição. “Ele está indo na contramão do que acontece no mundo. Vemos hoje que o Japão tem uma regulação específica para moedas digitais, criada por órgãos financeiros”, pontuou. “As bolsas americanas estão lançando contratos derivativos vinculados ao bitcoin e empresas como Microsoft e IBM estão investindo em moedas virtuais.”
Batista diz que ignorar as moedas virtuais é como ficar fora de algo que pode ser tão grande quanto a internet. Segundo ele, o valor do bitcoin não deve ser comparado ao de moedas reais, como o dólar ou o real, mas sim ao de empresas de tecnologia. “A Apple vale hoje cerca de US$ 900 bilhões na bolsa. Se você somar todos os bitcoins em circulação no mundo, chegará a algo em torno de US$ 300 bilhões”, citou Batista. “Então, o mercado atribui ao bitcoin o preço de um terço da Apple. Mas pelo potencial da tecnologia do bitcoin (o blockchain), fatalmente ele vai valer mais que a Apple.”
Por meio do blockchain é possível distribuir dados pela rede de várias máquinas conectadas em locais diferentes. Cada máquina tem uma cópia do conteúdo, que é gerenciado de forma compartilhada. Esses dados são armazenados em blocos de informação criptografada, o que torna impossível excluir uma informação depois que ela foi inserida no sistema. Também dificulta o trabalho dos hackers, porque cada mudança precisa ser validada por várias dessas máquinas.
João Canhada, sócio da Foxbit, outra plataforma de negociação de moedas virtuais, afirma que compreende os alertas de Goldfajn, mas diz que o problema não é o bitcoin em si. “O brasileiro não tem educação financeira adequada. E digo isso em relação a ativos em geral”, defende. “O bitcoin é uma tecnologia e tem valor atribuído. As pessoas podem fazer mau uso dela. A nota de real também tem valor atribuído, e as pessoas também usam a nota para fazer pirâmides.”
Para Canhada, o alerta de Goldfajn é razoável porque o mercado ainda não encontrou o preço correto para a moeda virtual. “O problema não é a tecnologia do bitcoin, mas o abuso que as pessoas fazem do bitcoin.”
O professor e coordenador do MBA em Marketing Digital da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Andre Miceli, avalia que as moedas digitais vão encontrar seu caminho, “os governos queiram ou não”.
“O que acontece é que o bitcoin está sendo vítima da própria popularidade. Acho que a moeda vai se ajustar e esse preço diminuir”, afirmou. “O bitcoin pode entrar em colapso, mas outras moedas digitais vão surgir. Não há como lutar contra isso.”
Fonte: Estadão
Créditos: Eduardo Rodrigues e Fabrício de Castro