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Médica paraibana que associou o zika à microcefalia denuncia falta de apoio em pesquisas

Médica paraibana que associou o zika à microcefalia denuncia falta de apoio em pesquisas

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Há exatamente um ano, o Ministério da Saúde declarava emergência sanitária nacional em função da descoberta da relação do vírus zika com os casos de microcefalia que explodiam no Nordeste e já apareciam no restante do país. Por trás dessa pesquisa, que acendeu um alerta mundial, está uma mulher de 46 anos, de 1,61m de altura, nordestina, arretada, mãe de duas filhas e pra lá de persistente.

Com dois doutorados, 19 anos de experiência em medicina fetal e nenhum recurso para pesquisas, Adriana Melo não se conformou em deixar duas pacientes sem respostas para a causa do quadro neurológico incomum que havia constatado nos ultrassons dos bebês que carregavam no ventre. Por dois meses, ela buscou inúmeros contatos até conseguir chegar a pesquisadores da Fiocruz, no Rio, onde, enfim, suas amostras de líquido amniótico foram analisadas.

— Os resultados comprovaram aquilo que eu já tinha certeza. O zika era a causa dos casos de microcefalia. Eu precisava dar uma resposta às mães. E toda vez que pensei em desistir, diante de tantas respostas evasivas, pensava nas minhas filhas — contou Adriana, que veio de Campina Grande, no interior da Paraíba, para o Simpósio Internacional de Zika, organizado pela Fiocruz e que terminou ontem, na Academia Nacional de Medicina, no Centro do Rio.

No auditório por onde passaram, desde segunda-feira, 60 pesquisadores de 13 países apresentando gráficos e esquemas matemáticos das últimas descobertas do zika, Adriana trouxe à tona o lado humano e dramático da epidemia:

— Um ano depois, recebemos zero de recursos. Uma prefeitura no interior da Paraíba tenta nos apoiar. Essas crianças precisam ser atendidas em centros de referência, que concentrem os especialistas de que precisam. Elas não são números. São crianças que convulsionam, que sofrem. A essa altura, já deveríamos ter essa estrutura montada.

A médica, que atua no Instituto de Saúde Elpídio de Almeida, em Campina Grande, conseguiu mobilizar uma rede de empresários, que ajudam com doações. A companhia de energia local abriu espaço nas contas de luz para a população colaborar. Em um terreno doado, ela e sua equipe lançam, na próxima terça-feira, a pedra fundamental do prédio em que a médica sonha montar um centro de assistência e pesquisa.

— Fazemos vaquinha virtual, campanhas, tenho passado o chapéu para garantir o atendimento dessas crianças. Em parceria com os bombeiros, fazemos oficinas para as mães aprenderem como lidar com os engasgos dos bebês, ensinando manobras de primeiros socorros. Precisamos treinar os profisisonais da rede básica e das emergências. Hoje, quando uma de nossas crianças vai para uma emergência, uma pessoa da minha equipe vai até ela para dar um suporte.

Sem serviço de verificação de óbitos na cidade, até necrópsia a equipe de Adriana faz.

— Já fizemos oito. Temos conhecimento, mas nenhum recurso. Tudo que fizemos até aqui foi por meio de ajuda de outros pesquisadores. Minha luta é trazer assitência e pesquisa para o Nordeste.

Mães se unem em redes

O desamparo médico e social que Adriana Lima levou ao conhecimento de pesquisadores na Academia Nacional de Medicina é enfrentado diariamente por um grupo de mães que se reuniu, no último sábado, no salão da Câmara de Vereadores de Duque de Caxias. Elas, que se conheceram por meio de redes sociais, se apoiam nos momentos mais difíceis.

— Eu tive zika no quinto mês de gestação e descobri que meu filho tinha microcefalia quando fiz a ultrassonografia. Dois meses depois, descobriram que o vírus poderia causar o problema. José Henrique está com 9 meses e engasga muito, vomita com facilidade. Até hoje, só fez uma sessão de fonoaudiologia e duas de fisioterapia — contou Lilian Ribeiro Ângelo, de 30 anos, que mora em São João de Meriti, na Baixada.

Apesar de ser atendida no Instituto de Pediatria da UFRJ, na Ilha do Fundão, a criança foi encaminhado para fazer fisioterapia e fonoaudiologia em outras unidades.

— Gastamos o que não temos em passagens.

 

Fonte: EXTRA GLOBO