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Lockdown teria evitado explosão de covid no Brasil, mas não é tarde demais

O Brasil chegou ao 34º dia com uma média móvel de óbitos superior a mil mortes por dia nesta semana. Para tentar conter os avanços, estados e municípios têm tomado medidas diversas.

O Brasil chegou ao 34º dia com uma média móvel de óbitos superior a mil mortes por dia nesta semana. Para tentar conter os avanços, estados e municípios têm tomado medidas diversas.

Nesta semana, Araraquara (SP) implementou lockdown, Uberlândia (MG) passou a combinar toque de recolher e Lei Seca, estados do Nordeste voltaram a fechar suas praias, e São Paulo anunciou revisão do seu plano de reabertura hoje.

Todas essas restrições são eficientes no combate à pandemia, mas a situação não estaria assim se ações mais rígidas tivessem sido tomadas antes. Para especialistas ouvidos pelo UOL, ver os números crescerem foi tragédia anunciada: lockdown deveria ter sido feito no passado, agora é correr para sanar danos.

Todos sabíamos que os números voltariam a crescer –e avisamos. Governo federal nunca tomou a frente, assim como estados e municípios, por motivos econômicos e eleitorais, seguraram seus números no ano passado. Agiram como se tudo estivesse bem, mas nunca tivemos pleno controle da pandemia.

Agora, com a circulação de novas variantes, falta de celeridade na vacinação, aglomerações e viagens entre o final de 2020 e começo deste ano, vê-se um aumento de casos e óbitos em todas as regiões.

Para Alves, doutor em dados da saúde, um lockdown entre março e maio teria segurado o impacto da primeira onda, enquanto maiores restrições entre outubro e dezembro abrandariam a segunda. “Mas decidiram flexibilizar tudo, como se não houvesse mais pandemia”, afirma.

A estratégia nunca foi amplamente instituída no Brasil. O governo federal não só se recusou a considerar qualquer medida restritiva, mesmo mais branda, como o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) debochou da alternativa em diversos momentos.

“É muito triste olhar para essa realidade [do Brasil] e ver outros países que conseguiram implementar com eficiência normas de segurança e que estão caminhando para sair da pandemia”, afirmou a microbiologista Natalia Pasternak, em palestra ao UOL.

Israel não é só vacinação, fez um lockdown bem rigoroso e olha como eles estão agora. Até os Estados Unidos estão vendo diminuição [de casos] e a gente aqui vendo a coisa subir.
Natalia Pasternak, microbiologista

Procurado, o Ministério da Saúde afirmou que, “por ser um país continental, o Brasil não deve ter medidas únicas. Essas ações devem ser tomadas de acordo com as necessidades de cada região, levando em conta parâmetros como quantidade de leitos ocupados, quantidade de casos e óbitos, quantidade de profissionais, insumos e EPIs”.

A Pasta citou ainda o que STF (Supremo Tribunal Federal) deu aos estados e municípios “autonomia para tomar as decisões que julgarem melhor para as suas respectivas populações” e que “caberá às autoridades locais decidirem sobre as medidas não farmacológicas a serem adotadas” — embora a decisão não isente o governo federal de assumir uma posição de comando na organização da pandemia, como criticam os especialistas.

É tarde, mas não tarde demais

As tentativas de fechamento adotadas por algumas cidades são vistas pelos especialistas ouvidos como uma tentativa de controlar o incêndio depois que ele assumiu grandes proporções, mas são melhores do que ação nenhuma.

“Nós tivemos diversos momentos de grande impacto da pandemia em que o lockdown seria muito bem-vindo para dar uma organizada. [Ainda] não está tarde, tem variantes chegando, altas taxas de ocupação de UTI [Unidade de Tratamento Intensivo]”, afirma o infectologista Evaldo Stanislau.

O lockdown é mais ou menos como desligar a chave geral. Quando você afasta as pessoas por, pelo menos, duas semanas, que é o período médio de incubação da doença, você tem uma calma na doença. Com isso, consegue se planejar e ganhar um fôlego.
Evaldo Stanislau, infectologista do Hospital das Clínicas, em São Paulo

Em Araraquara, a 280 km de São Paulo, a primeira cidade brasileira a realmente fechar tudo, até supermercado, os especialistas esperam que haja uma resposta positiva ao segurar os números, com a menor circulação de pessoas.

“Do ponto de vista científico, o lockdown funciona, faz com que o vírus circule menos porque ele circula em pessoas, é um passageiro nosso, não está solto na rua. Se a gente consegue restringir isso, restringe o vírus”, explica Pasternak.

Só lockdown não basta

Os pesquisadores lembram, no entanto, que lockdown nunca foi uma medida a ser tomada isoladamente e que, agora, com o cansaço da população, é preciso pensar em ainda mais alternativas.

“Só lockdown, neste momento, teria pouca efetividade. Já houve um cansaço por parte da população, com todas as medidas incompletas [tomadas previamente]. Sem adesão da população, é impossível. Tem de haver medidas mais racionais”, avalia a epidemiologista Ana Brito, da UPE (Universidade de Pernambuco).

Entre essas medidas, estariam aumento da testagem e do mapeamento do vírus, estímulo ao uso de máscaras protetoras e contenção de circulação e aumento da vacinação.

“Distanciamento social e testagem em massa. Acho que, assim, a gente consegue reverter a situação para chegar ao momento de uma situação vacinal ampla”, conclui Stanislau.

 

Fonte: UOL
Créditos: Polêmica Paraíba