Como viver sem os agrotóxicos? A pergunta, formulada nesta 2ª feira (16.set.2019), em reunião na Câmara dos Deputados, suscitou outra dúvida: será possível produzir alimentos, em larga escala, sem utilizar produtos químicos para combater pragas?
Quando Antoninho Rovaris, dirigente da Contag, logo no início dos trabalhos subiu ao microfone para condenar o uso de agrotóxicos, sabia que os produtores rurais não utilizam pesticidas porque querem, e sim porque precisam deles para defender suas lavouras.
Seu depoimento deu o tom da sessão da Comissão Geral, presidida pelo deputado Luiz Nishimori (PL-PR), relator do PL 6299/02. Ela se instalou exatamente para colher as opiniões de cerca de 30 convidados, entre especialistas, estudiosos e militantes, visando encontrar um caminho nessa polêmica que parece eterna.
Até Bela Gil compareceu. Famosa por machucar a agronomia em sua pregação naturalista, desta vez a culinarista se conteve em seus impropérios, lendo um texto que defendia a “transição” da agricultura química para um modelo biológico. Cumpriu o script.
Professores da ESALQ/USP e da UNESP/Botucatu, além de gestores do Ministério da Agricultura, trouxeram informações técnicas, precisas, comprovando que o Brasil segue padrões internacionais de qualidade no controle fitossanitário. Contrapuseram, com competência, o achismo que domina essa discussão.
Durante quase 4 horas, sentado ali na mesa do plenário da Câmara dos Deputados, acompanhei este debate, uns falando contra outros a favor. Desde 1980 me dedico a essa questão que nós, engenheiros agrônomos, tratamos historicamente como “uso correto de defensivos agrícolas”. Tenho cancha nesse assunto.
Desta vez, senti os críticos aliviarem a contumaz mentirada sobre os malefícios do uso de pesticidas, especialmente sobre a possível relação entre alimentos contaminados e surgimento de câncer em humanos. Jamais se comprovou essa hipótese.
Claramente a condenação dos pesticidas se mistura com a crítica política ao capitalismo contemporâneo. Denomino isso de “esquerdismo verde”, uma ideologia retrógrada que pretende derrubar o atual sistema econômico substituindo-o por um modelo agroecológico e familiar, desvinculado do lucro na produção. Sabe-se lá como funcionaria.
Minha grande decepção no evento foi a palavra da representante do Greenpeace, uma engenheira agrônoma que, ao invés de argumentar tecnicamente, desatou a criticar o “viés autoritário” do governo Bolsonaro. Foi além. Disse que a agricultura moderna é intrinsicamente predatória da natureza. Deveria rasgar seu diploma.
A politização exagerada permite que equívocos terríveis sejam propagados, por simples falta de leitura. Ao atacarem a liberação de novos produtos agrotóxicos, por exemplo, o esquerdismo verde os categoriza como de interesse da “indústria do veneno”. Não prestaram atenção, porém, que, neste ano, entre os 140 produtos autorizados para uso, 14 são agentes biológicos e/ou orgânicos. Também estavam encalhados.
Liberar novos pesticidas sempre será melhor que manter os antigos em uso. Nada retroage no mundo da inovação tecnológica. E achar que a liberação de novas formulações levará ao maior consumo de pesticidas significa ignorância somada com sem-vergonhice.
Embora com altos e baixos, saldo positivo. Esta é minha avaliação sobre a Comissão Geral que se reuniu na Câmara dos Deputados. Volto ao início: será possível, um dia, produzir alimentos, em qualidade e quantidade, sem utilizar pesticidas?
Pode ser que sim. Agora, é ingenuidade supor que essa agenda pertence aos “alternativos”, ou apenas às start ups do agro. Os grandes laboratórios do agronegócio dedicam-se, intensivamente, à pesquisa, utilizando muita engenharia genética, sobre métodos biológicos para controle de pragas.
Ao defenderem uma política que promova a redução do uso de agrotóxicos, os críticos do modelo agrícola atual seguem a receita das próprias multinacionais que tanto detestam. É paradoxal, mas é um fato relevante, que reflete a tendência da pesquisa agronômica.
Saí da reunião da Câmara dos Deputados convencido ser possível unificar as 2 ideias, aparentemente contraditórias: uma que moderniza a legislação sobre pesticidas e outra que propõe uma política de redução de agrotóxicos.
Para quem vive da polêmica, parece tarefa impossível; para quem gosta de construir, considera a melhor solução para o país. O objetivo é um só: o alimento farto e saudável.
Fonte: Poder360
Créditos: Xico Graziano