Um parecer de técnicos do Ibama publicado nesta segunda-feira (4) é taxativo ao afirmar que imagens de satélite não são capazes de localizar manchas de óleo no oceano. O documento é assinado por dois analistas ambientais e foi divulgado três dias depois de a Polícia Federal (PF) usar a análise feita por uma empresa privada para afirmar que um navio grego é o principal suspeito do desastre que já afetou mais de 300 praias do Nordeste.
“Não há condições técnicas de se identificar manchas de poluição por óleo em águas oceânicas com o uso de imagens óticas, sobretudo quando não se tem o conhecimento prévio da região geográfica da ocorrência do incidente” – nota técnica do Ibama
O documento ao qual o G1 teve acesso tem como objetivo detalhar o porquê de uma mancha vista por pesquisadores da UFRJ e da UFAL não ter relação com o desastre. A base do trabalho dos pesquisadores das duas universidades é semelhante ao da empresa HEX Tecnologias Espaciais, que sustenta o inquérito da Polícia Federal. Todos usam, entre outras imagens, fotografias do satélite Sentinel, de propriedade da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês).
Trecho de nota técnica do Ibama — Foto: Reprodução/Ibama
A Operação Mácula, deflagrada pela PF na sexta-feira (1º), apontou o navio grego Bouboulina como principal suspeito de derramar ou vazar o óleo. A investigação da polícia se baseia principalmente no relatório da empresa HEX: feito em seis dias, o levantamento da empresa analisou 829 imagens de satélites da agência espacial americana (Nasa) e da ESA por meio de uma plataforma de processamento. O resultado anunciado foi a detecção de quatro “feições de óleo” a cerca de 700 quilômetros da costa da Paraíba.
Relatório da empresa Hex Tecnologias Geoespaciais que baseia investigação da Polícia Federal sobre origem de manchas de óleo — Foto: Reprodução
O relatório da HEX não explica por que as manchas vistas pelo satélite são mesmo óleo, e não algas ou partículas de chuva, que são hipóteses consideradas pelos especialistas para refutar os estudos da UFAL e da UFRJ.
Além dos satélites para achar as manchas, a HEX usou uma tecnologia da Airbus para verificar quais navios passaram pela região onde as feições de óleo foram detectadas e chegou ao navio Bouboulina.
O G1 entrou em contato com a Hex Tecnologias Geoespaciais, com o Ibama, o Ministério do Meio Ambiente e a Marinha, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem. No fim de semana, a Marinha informou que o Bouboulina é o principal entre 30 suspeitos e que a investigação continua.
A empresa Delta Tankers, dona do navio apontado como suspeito, diz ter provas de que não derramou óleo, alega que não foi acionada pelo governo brasileiro e que o suposto envolvimento “é prejudicial à reputação e aos negócios ” da companhia.
Marinha diz que navio grego, suspeito do vazamento de óleo, já foi notificado
Investigação conjunta
Na segunda-feira (4), em evento conjunto, representantes do Ministério da Defesa, da Marinha, da Polícia Federal e do Ibama deram entrevista à imprensa. Os porta-vozes falaram principalmente sobre a investigação que chegou ao navio grego Bouboulina.
O presidente do Ibama, Eduardo Bim, não mencionou a nota técnica do instituto que refuta a possibilidade de usar imagens de satélite para encontrar a origem do óleo. Ele também não comentou o trabalho de análise feito pela HEX. O presidente do Ibama falou apenas sobre como está sendo medido o impacto da chegada do óleo nos mariscos e sobre quais são as possíveis sanções para os responsáveis pelo desastre ambiental.
O presidente do Ibama, Eduardo Bim. — Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil/Arquivo
Ao longo da investigação conjunta em busca da origem do óleo, tanto o Ibama quanto a Marinha chegaram a afirmar que não foram encontradas manchas na análise de imagens de satélites. O instituto utiliza satélites da Nasa e da ESA, os mesmos que são usados pela HEX em seu relatório.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, também disse, no passado, que o óleo não pode ser visto por imagens aéreas. “Não há grandes manchas sendo visualizadas nem pelo sistema de satélites, estrangeiros inclusive, e nos voos com avião-radar do Ibama, aviões e helicópteros também da Aeronáutica”, afirmou Salles em entrevista coletiva no dia 14 de outubro.
HEX refuta chance de erro
Na sexta-feira (1) o diretor da HEX Tecnologias Geoespaciais, Leonardo Barros, disse que há “zero por cento” de chance de erro no levantamento feito pela empresa.
Questionado se o governo seria capaz de fazer esse tipo de análise, o executivo respondeu que não poderia afirmar porque não conhece “os esforços deles”. Sobre quanto custaria a operação – que, segundo Barros, foi feita voluntariamente pela HEX –, Barros disse que preferia não comentar.
Trecho de relatório da empresa Hex Tecnologias Geoespaciais — Foto: Reprodução
Inspeção no local
A nota técnica do Ibama ressalta ainda outro ponto. Além da dificuldade de distinguir manchas de óleo de outras manchas escuras nas imagens de satélite, os analistas do órgão federal também destacaram a importância de uma inspeção no local para confirmar a existência do óleo encontrado por satélite.
Devido ao longo tempo que se passou entre a data da imagem –segundo a HEX, as “feições de óleo” aparecem em fotografias do dia 28 de julho – e o resultado das investigações, seria praticamente impossível garantir, conforme este critério, que a mancha escura apontada pelo satélite é mesmo de óleo.
“A confirmação da veracidade da detecção remota dependerá sempre da inspeção do local da ocorrência para observação direta e coleta de amostras ou por barcos ou aeronaves que possuam sensores específicos de identificação para presença de óleo, como laser fluorosensor”, dizem os técnicos do Ibama no parecer.
Fonte: G1
Créditos: G1