Assinantes em plataformas 18+

"IA DO JOB": brasileiros lucram com IA criando mulheres virtuais para conteúdo adulto

Site que permite adicionar um comando e criar uma IA do job — Foto: Reprodução
Site que permite adicionar um comando e criar uma IA do job — Foto: Reprodução

Imagina ganhar dinheiro na internet com uma “pessoa” que não existe? Essa é a onda das “IAs do job” ou “garotas do job”, que são mulheres virtuais criadas por inteligência artificial (IA) para produzir conteúdo adulto.

Com sites de edição específicos para isso, as pessoas por trás criam modelos nuas, simulam cenas de sexo e vendem esse conteúdo para assinantes em plataformas 18+, como OnlyFans, Privacy, Fanvue, LinkPriv e Uncove.

Uma das pessoas por trás dessas criações é Elaine Pasdiora, de 35 anos, que vive em Porto Velho (RO). Ela contou que já faturou mais de R$ 20 mil entre janeiro e março de 2025 com as “garotas do job” — boa parte desse dinheiro veio da venda de cursos que ensinam a criar a mulher virtual.

O tema ganhou força no TikTok nos últimos meses. Elaine revelou que o negócio deu tão certo que decidiu começar a dar aulas sobre o tema.

Um de seus grupos com interessados no assunto no WhatsApp, ao qual o g1 teve acesso, tem mais de 900 membros. “Entrei por interesse em aprender como usar a IA para isso [‘IA do job’] e, eventualmente, ganhar dinheiro”, disse uma das integrantes.

➡️ Por que “IA do job” ou “garota do job”? A palavra inglesa “job”, que na significa “trabalho”, tem sido usada por jovens, especialmente nas redes sociais, como gíria para se referir a garota de programa ou prostituição.

Na internet, é possível encontrar vários conteúdos no YouTube, no TikTok e no Reddit que ensinam a criar a sua “IA do job” e faturar em sites especializados.

O g1 também encontrou vários cursos pagos para quem deseja investir nesse tipo de negócio, mas muitos alertam para possíveis golpes e frustrações (entenda ao final da reportagem).

“Mesmo eu falando que o resultado financeiro não vem rápido, muita gente vem com a expectativa de que vai ganhar muito dinheiro e não é assim”, disse Elaine Pasdiora.

‘IA do job’ reforça estereótipos de ‘corpos perfeitos’

A maioria das criações segue o mesmo estilo: mulheres brancas, com corpos considerados dentro de um padrão de beleza, reforçando estereótipos.

“Quase não há mulheres negras ou não brancas, predominando um padrão europeu e, em menor número, perfis fetichizados de mulheres morenas, de cabelo liso e bronzeadas”, diz a advogada criminalista Giovana Gabriela Silva, que tem acompanhado essa tendência nas redes sociais.

Por experiência própria e com base nos relatos em grupos de mensagens de criadores de “IA do job”, Elisabete Alves, de 40 anos, que também tem sua garota virtual, revela o perfil do público que consome esse tipo de conteúdo:

  • homens com mais de 40 anos;
  • estrangeiros (a maioria reside em países como Índia, Paquistão e EUA);
  • pessoas com dificuldade em se relacionar.

Para Cleber Zanchettin, especialista em IA e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), esse tipo de negócio demorou a chegar ao Brasil, tendo ganhado força nos EUA e na Europa no início de 2024.

Zanchettin explica que a indústria da IA para conteúdo adulto é um segmento gigantesco e tende a crescer nos próximos anos. “As próprias empresas do setor pornográfico estão investindo no treinamento de modelos para criar pornografia personalizada e interativa”, afirma.

“A IA para criação de imagens e vídeos tem evoluído rapidamente. O que era tosco há um ano já não é mais agora”, completa Diogo Cortiz, professor da PUC-SP e especialista em inteligência artificial.

Em novembro de 2024, a revista americana Wired denunciou um caso grave: centenas de influenciadores gerados por IA foram criados a partir de vídeos reais de criadores de conteúdo 18+ e foram publicados para venda no Patreon, rival do OnlyFans.

Nos seus termos de uso, o OnlyFans, a Privacy e a Fanvue dizem permitir conteúdos gerados por inteligência artificial, mas os usuários devem deixar claro que os conteúdos ali presentes são feitos com a tecnologia.

g1 também entrou em contato com a LinkPriv e com a Uncove, mas não obteve retorno.

Elaine e Elisabete denunciaram que algumas pessoas ensinam a burlar os sistemas de verificação do OnlyFans para publicar conteúdo 18+ gerado por IA.

Ao g1, a plataforma afirmou que “todo o conteúdo publicado deve pertencer a um criador de conteúdo do OnlyFans com mais de 18 anos verificado”, mas não comentou sobre a prática de fraude.

Beatriz Miuky, que produz conteúdo 18+ real há cinco anos, disse ao g1 que plataformas como OnlyFans e Privacy exigem o envio de uma foto do rosto e do documento antes da inscrição para publicação de conteúdo.

Recentemente, ela contou que interagiu, sem perceber, com um perfil no OnlyFans de uma mulher 100% virtual criada por IA.

“Eu comecei a ver essas ‘IAs do job’ primeiro no Instagram, em novembro ou dezembro de 2024. É impressionante como algumas têm um engajamento alto, chegando a 100 mil likes em um único post. Cheguei a ver alguns perfis no OnlyFans, mas não muitos”, disse Beatriz.

G1