O presidente Jair Bolsonaro ultrapassou todos os limites ao ameaçar rasgar a Constituição e atingir o ministro Alexandre de Moraes. Quanto mais ele radicaliza, mais o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral reagem. E, quanto mais o STF e o TSE reagem, mais ele radicaliza. Esse círculo vicioso envolve o País em angústia e temores, sem luz no fim do túnel – e das trevas.
As últimas investidas de Bolsonaro são gravíssimas e preocupantes. Ele ameaçou “agir fora das quatro linhas da Constituição”, como se fosse admissível um presidente dizer uma coisa dessas, e atacou Alexandre de Moraes, enigmaticamente: “A hora dele vai chegar”. Moraes é relator dos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos, que já tinham chegado ao Planalto e agora incluem o próprio Bolsonaro.
Ações contra a Constituição são crimes. O que o presidente pretende ao ameaçar, não uma pessoa, um ministro, uma instituição, mas a nação brasileira, com atos anticonstitucionais? E que história é essa de que a hora de Moraes vai chegar? É irresponsabilidade, desespero ou ele realmente acalenta a ideia de um golpe. Não se sabe como, quando e com quem.
Bolsonaro consome as energias dele, do governo e do País a favor das más ideias – de cloroquina e de armas para civis – e contra as boas – urnas eletrônicas, eleições, vacinas, isolamento social e até máscara. Nesta quinta-feira, 5, recebeu o conselheiro de Segurança dos EUA, Jake Sulivan, sem ela. O que ele ganha com isso? Indo contra o mundo inteiro? É ridículo e irritante.
Os manifestos de resistência democrática se multiplicam: de intelectuais, diplomatas, juristas, líderes religiosos e economistas (até o recatado Pedro Malan); de entidades como CNBB, SBPC, OAB e ABI; de parlamentares de vários partidos, incluindo o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL); e do atual, do futuro e dos ex-ministros do TSE.
“A sociedade brasileira é garantidora da Constituição e não aceitará aventuras autoritárias. O Brasil terá eleições, e seus resultados serão respeitados”, gritam os intelectuais.
E o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, sobe o tom, faz cara de bravo e, em nome da “coesão da Corte”, cancela a reunião e o diálogo com Bolsonaro.
As movimentações de bastidores igualmente agitam Brasília, onde o ministro do STF Gilmar Mendes almoçou com o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Baptista Jr., o mais bolsonarista dos três chefes militares. Gilmar defendeu o sistema eleitoral. O brigadeiro descartou qualquer aventura golpista.
Bolsonaro, porém, insiste em botar fogo no circo, e sua atual obsessão é contra a urna eletrônica. Depois daquela live patética com velhas fake news, ele distorce um inquérito da Polícia Federal, sobre uma tentativa de acesso ao sistema do TSE em 2018, como se fosse sobre invasão das urnas. Isso é praticamente impossível. As urnas não são conectadas à internet, são um circuito fechado nele mesmo.
O presidente deveria saber, mas usa fake news para acionar o “gabinete do ódio”, que aciona os robôs da internet, que atiçam os bolsonaristas contra o Supremo, o TSE e seus ministros, a mídia e os jornalistas, o sistema eleitoral e as próprias eleições de 2022. Ou seja, contra a própria democracia.
O Judiciário, tão dividido em outros temas, como na própria Lava Jato, se une num monobloco de resistência democrática.
É incrível que, a esta altura, com essa montanha de erros e provocações, o presidente ainda consiga promover aglomeração no Planalto (aliás, esmagadoramente masculina) para a cerimônia em que Ciro Nogueira e o Centrão devoraram a “alma do governo”. Isso só comprova que Bolsonaro está vivendo numa bolha, enquanto o Brasil se une para defender a democracia. E se defender dele.
Fonte: Estadão
Créditos: Polêmica Paraíba