Opinião Estadão
“Não aprenderam nada nem esqueceram nada.” A frase atribuída a Talleyrand a propósito do retorno da dinastia Bourbon 25 anos após ser defenestrada pela Revolução Francesa se aplica bem às candidaturas que despontam à esquerda para as eleições de 2022. Só precisaria ser complementada: eles não se desculparam por nada.
O Plano de Reconstrução e Transformação do PT é na verdade um plano de reconstrução da Nova Matriz Econômica, a insanidade que deformou a arquitetura macroeconômica do País precipitando-o na pior recessão de sua história.
A maior conquista econômica da Nova República, o controle da hiperinflação com o Plano Real, foi cimentada pelo chamado tripé macroeconômico: meta para a inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal. Ele possibilitou o superávit primário nas contas públicas e a redução dos juros, viabilizando o aumento do poder aquisitivo das famílias, o crescimento econômico, a geração de empregos, a modernização do parque industrial e a expansão de programas sociais. Como disse o então ministro da Fazenda, Pedro Malan, “a estabilidade monetária é fator condicionante; a prosperidade é fator condicionado”.
O desmonte dessa estrutura começou no segundo mandato de Lula e foi consumado por sua criatura, Dilma Rousseff. A pretexto de auxiliar a economia, em especial a indústria, a enfrentar os efeitos da crise financeira de 2008, o governo petista implementou a intervenção conhecida como Nova Matriz Econômica, empregando bancos públicos para conter juros e ampliar créditos; a Petrobras para reduzir os preços dos combustíveis; a capitalização do BNDES para distribuir investimentos; e a desvalorização cambial para estimular a indústria. A normatização de desonerações e gastos indiscriminados arrebentou o equilíbrio fiscal. O risco país e os juros cresceram e o consumo e o investimento encolheram. Resultado: recessão.
Agora, o PT propõe a mesma receita: crescimento via gastos públicos. Mas se furta a explicar de onde virá o dinheiro.
Sem dúvida, recursos públicos podem servir de estímulo à economia. A pandemia explicitou a importância do Estado para amortizar choques e promover políticas anticíclicas. O problema não é o gasto em si, mas o gasto sem controle e sem critério. Na maré alta do ciclo das commodities, o PT nada fez para disciplinar a expansão dos gastos obrigatórios – ao contrário. Na maré baixa, consumiu a capacidade de investimento do País e arruinou sua saúde fiscal.
O teto de gastos de 2016 foi criado para estancar a hemorragia e obrigar o Estado a racionalizar seus recursos. Ecoando o PT em um debate com o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, Ciro Gomes disse que “não é admissível que a forma de conseguir equilíbrio fiscal seja proibir o país de crescer”. Ao contrário, a função do teto é conferir resiliência às contas públicas e abrir margem a investimentos em áreas aptas a gerar crescimento, igualdade e oportunidades, como educação, saúde, infraestrutura e proteção social.
Só o funcionalismo e a Previdência consomem 80% dos gastos. Nos demais países de renda média essa fatia é de 60%. A reforma da Previdência avançou nessa direção, mas foi insuficiente. Uma reforma administrativa que elimine privilégios, limite o crescimento insustentável da folha de pagamento e aumente a produtividade da máquina pública é vital. Além disso, é preciso eliminar subsídios que beneficiam quem menos precisa. Fraga estima que essas medidas gerariam gradualmente uma economia de 10 pontos do PIB. Com esses recursos seria possível estabilizar as contas públicas e ampliar investimentos.
O atual governo caminha na contramão desse programa. A reforma administrativa foi subvertida em uma contrarreforma, os subsídios seguem intocados e o teto está sendo depredado. Sob toda cacofonia ideológica, aqui os opostos – o lulopetismo e o bolsonarismo – convergem.
Os brasileiros jamais esquecerão a crise em que foram lançados pelo populismo fiscal de seus governantes. Espera-se que tenham aprendido com ela. O teste se dará nas urnas.
Fonte: Estadão
Créditos: Estadão