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Entre os corações que tenho tatuado - Por Estevam Dedalus

A morte de Rita Lee é também um pouco a minha morte. Nós morremos, de certa forma, toda vez que as pessoas que amamos e os lugares que construímos vínculos afetivos deixam de existir.

Foto: reprodução / Internet

A morte de Rita Lee é também um pouco a minha morte. Nós morremos, de certa forma, toda vez que as pessoas que amamos e os lugares que construímos vínculos afetivos deixam de existir.

Não tive o prazer de conhecê-la pessoalmente, mas, para mim, é como se ela sempre estivesse aqui comigo. Numa onipresença quase divina. Rita é como os “lugares que me lembram, minha vida”, a casa da minha infância, o mar, uma dessas pessoas que “a gente não se esquece nem se esquecer”.

A sua música faz parte do meu mundo sonoro afetivo, como de outros milhões de brasileiros. Autora incontornável, com uma dicção poética única, que soube transitar por diferentes temáticas e que era capaz de fazer a gente rir, chorar, transgredir, compreender a beleza do amor. Acho incrível quem tem essa capacidade.

Temos muitos gênios na música popular, é verdade. Mas são poucos os compositores que combinam tão bem diferentes recursos expressivos. Rita Lee dominava a arte do deboche, da ironia e da sátira, ao mesmo tempo possuía um romantismo dilacerante como nos versos: “A gente faz amor por telepatia/ No chão, no mar, na Lua, na melodia”.

Nas suas múltiplas faces, era feminista: “Porque nem toda feiticeira é corcunda/ Nem toda brasileira é bunda/ Meu peito não é de silicone/ Sou mais macho que muito homem”.

Uma mulher sexualmente transgressora: “Eu vou sabotar/ Vou casar com ele/ Vou trepar na escada/ Pra pintar seu nome no céu.” Ou quando fala, em Lança Perfume: “Me vira de ponta-cabeça/ Me faz de gato e sapato/ E me deixa de quatro no ato /Me enche de amor, de amor, oh”.

Uma artista que não se importava em ir contra a corrente para ser feliz e que reivindicava a loucura como experiência de liberdade: “Dizem que sou louco por pensar assim/ Se eu sou muito louco por eu ser feliz?/ Mas louco é quem me diz/ E não é feliz, não é feliz”.

Assim, num processo de ruptura com a homogeneidade social, que a imaginação poética proporciona, Rita Lee nos mostrou que é possível pensar que somos Deus e bonitos iguais a Alan Delon; que podemos voar como os pássaros e experimentar a beatitude do céu.

É com os sentimentos de saudade e de tristeza que encerro esse texto, dizendo: “alguns desenhos que a vida vai fazendo, desbotam alguns, uns ficam iguais, mas, entre corações que tenho tatuados, de você me lembro mais, de você, não esqueço jamais.”

Fonte: Estevam Dedalus
Créditos: Polêmica Paraíba