Um dos áudios que poderá ser ouvido a partir de hoje, na estreia do podcast “UOL Investiga: A vida secreta de Jair”, é um desabafo da cabeleireira Márcia Aguiar, mulher de Fabrício Queiroz, apontado como o operador do esquema ilegal de entrega de salários no antigo gabinete de Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
Na ocasião, Márcia desabafou com uma amiga que não aguentava mais ter Queiroz longe da casa da família no Rio de Janeiro. Em novembro de 2019, o ex-assessor de Flávio era obrigado a ficar na casa do advogado da família Bolsonaro, Frederick Wassef, em Atibaia, no interior de São Paulo.
“Só que eu também não tô aguentando. Tá entendendo? Eu tô muito preocupada com ele. A minha saúde também está abalada, tá entendendo? A gente não pode mais viver sendo marionete do ‘Anjo’. Ah, você tem que ficar aqui, traz a família. Esquece cara, deixa a gente viver a nossa vida! Qual o problema? Vão matar? Ninguém vai matar ninguém, se tivesse que matar já tinha pego um filho meu aqui, você tá entendendo? Então deixa a gente viver a nossa vida aqui com a nossa família”, desabafou Márcia.
A existência do áudio tinha sido revelada pelo jornal O Estado de São Paulo no ano passado, mas agora a coluna disponibiliza a gravação pela primeira vez. Você pode ouvir a partir de 44 minutos e 52 segundos no podcast. Na segunda-feira, a coluna publicou uma série de matérias com áudios de uma ex-cunhada do presidente e que também integram o podcast. As gravações mostram o envolvimento direto do presidente Jair Bolsonaro com o esquema de entrega ilegal de salários dos assessores em seu próprio gabinete na Câmara dos Deputados.
A coluna também revelou na segunda-feira um áudio no qual Márcia Aguiar chamou o presidente Jair Bolsonaro de “01”. Procurada, a defesa de Márcia Aguiar não retornou os contatos.
Julgamento do Coaf
O áudio de Márcia Aguiar é do dia 26 de novembro de 2019. Nessa época, o STF (Supremo Tribunal Federal) estava julgando a legalidade do compartilhamento de dados da Receita Federal e do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) com os órgãos de investigação como os MPs (Ministérios Públicos).
A expectativa de Wassef no julgamento era que o Supremo tornasse ilegal o compartilhamento e, com isso, anulasse o relatório que deu origem à investigação sobre o gabinete de Flávio. O advogado sempre defendeu que ocorreu uma quebra de sigilo bancário sem autorização judicial dos dados de Flávio nos relatórios do Coaf.
No entanto, logo no início do julgamento, os ministros do STF começaram a indicar que a Corte não iria reconhecer a tese da defesa. No dia 27 de novembro de 2019, já tinham votado os ministros Luiz Fux, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber, todos contrários à tese da ilegalidade do compartilhamento. Apenas o ministro Dias Toffoli, relator do caso, tinha votado a favor de impor regras mais restritas, mas não foi apoiado pela maioria. Dias depois, o placar terminou em 10 votos a 1 contra a tese defendida por Wassef.
O desabafo de Márcia Aguiar estava relacionado com o medo da derrota no STF porque, segundo ela descreve nas mensagens, Wassef queria que toda a família de Queiroz mudasse para São Paulo em caso de derrota. Márcia não queria ir e também deixa claro que não aguentava mais ter o marido em São Paulo.
O áudio integra os autos das investigações sobre o gabinete de Flávio Bolsonaro e estava no celular de Márcia, apreendido durante a busca e apreensão autorizada pelo juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, em dezembro de 2019.
Meses depois, com os dados dos celulares e do sigilo bancário de Queiroz e outros assessores, o MP apontou que Queiroz recebeu mais de R$ 2 milhões de ex-assessores de Flávio e pediu a prisão de Queiroz e Márcia. Queiroz foi preso na Operação Anjo, em junho do ano passado, e Márcia ficou 40 dias foragida.
Em julho de 2020, eles obtiveram um habeas corpus que permitiu a prisão domiciliar. Já em março deste ano, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) autorizou que eles respondam ao processo em liberdade. O STJ também anulou a quebra de sigilo bancária dos investigados no caso de Flávio por entender que faltou fundamentação na decisão que autorizou a quebra de sigilo. Com isso, todas as provas obtidas posteriormente podem ser anuladas, inclusive esse áudio de Márcia Aguiar. O MPF e o MP estão recorrendo da decisão.
Fonte: POLÊMICA PARAÍBA
Créditos: UOL