QUANTO MAIS FILHOS, MENOR O SALÁRIO DELAS
O salário das mulheres brasileiras com filhos é, em média, 35% menor que o das que não têm filhos, evidenciando o impacto da maternidade na renda feminina. O levantamento foi feito pelo pesquisador Bruno Ottoni, da empresa de análise IDados e do Instituto Brasileiro de Economia da FGV Rio.
Ottoni comparou
Em cargos de chefia, a discrepância chega a 27%. A distância entre os maiores salários de homens e de mulheres do topo é de 38%.
Há discrepâncias também por setores.
“Áreas como PDI (pesquisa, desenvolvimento e inovação) e engenharia de produção, são muito masculinas. Elas ainda estão menos representadas nessas profissões que são mais valorizadas”, afirmou Sant’Anna.
“Existe o que chamamos de polarização das profissões —mulheres em posições de cuidado, como Recursos Humanos, que estão muito mais sujeitas à automação. Em todas as posições funcionais, os homens ganham mais que as mulheres, à exceção de posições administrativas e financeiras— supervisora de call center, por exemplo. Nossa hipótese é que os homens saíram delas e foram para áreas mais nobres.”
OS BENEFÍCIOS DA IGUALDADE DE GÊNEROS: ATÉ US$ 28 TRI A MAIS NO PIB GLOBAL
Segundo o relatório do Fórum Econômico Mundial, no ritmo atual, o mundo levará mais de 200 anos para alcançar a igualdade salarial entre homens e mulheres, cenário que provoca perdas econômicas para toda a sociedade.
Um levantamento de 2015 do Instituto McKinsey Global calculou que a igualdade de gêneros poderia acrescentar, em um cenário mediano —no qual os países alcancem o ritmo dos países mais igualitários de suas regiões—, até US$ 12 trilhões (R$ 44,5 trilhões) ao PIB mundial em 2025.
Em um cenário ideal de igualdade plena, no qual “mulheres participam na economia de modo idêntico aos homens”, os ganhos poderiam chegar a US$ 28 trilhões (R$ 104 trilhões) no PIB anual global —o equivalente, à época, à soma das duas maiores economias do mundo, a dos EUA e da China. Esse cenário permitiria que a metade feminina da população mundial alcançasse seu potencial mais plenamente, aumentando por exemplo suas horas de trabalho remunerado e seus rendimentos.
“Igualdade de gêneros não é apenas uma questão urgente do ponto de vista social e moral, mas também um desafio econômico”, apontou o relatório.
MAIS PODER FINANCEIRO FEMININO MELHORA AS FAMÍLIAS
Em 2018, o Fundo Monetário Internacional (FMI) analisou pesquisas e dados de mais de uma centena de nações em questões como acesso ao sistema financeiro (como crédito e contas bancárias) e ascensão profissional feminina no setor bancário.
A conclusão foi de que mulheres mais fortes financeiramente demonstraram maior probabilidade de investir no bem-estar familiar e a tomar mais decisões financeiras mais inteligentes, que repercutem na educação e na saúde de sua família.
“Isso se traduz em menos pobreza, mais crescimento econômico e redução da desigualdade”, disse à BBC News Brasil Ratna Sahay, coautora do estudo e vice-diretora do Departamento Monetário e de Mercado de Capitais do FMI.
“Há diferentes exemplos: nas Filipinas, há evidências de que o empoderamento das mulheres aumentava seu controle sobre decisões do orçamento e seu gasto com itens simples, mas que melhoram a qualidade de vida de toda a família, como máquina de lavar roupa e utensílios culinários; no Nepal, descobrimos que lares liderados por mulheres gastavam 20% mais em educação do que os liderados por homens, algo muito importante para as crianças”, explicou Sahay, agregando que, embora seu estudo não mencione nominalmente o Brasil, as conclusões possivelmente se aplicam por aqui.
MAIS PARTICIPAÇÃO FEMININA LEVA A MAIS EFICIÊNCIA E ESTABILIDADE FINANCEIRA
O levantamento do FMI analisou também um outro ângulo: qual o impacto de se, além de usuárias de serviços financeiros, tivermos mais mulheres provendo esses serviços —ou seja, ocupando posições de liderança em bancos centrais e comerciais e em agências regulatórias financeiras?
E, novamente, a conclusão foi de que “a maior representatividade das mulheres (em instituições financeiras) leva a mais estabilidade financeira”— na prática, menor endividamento, decisões corporativas mais cautelosas, mais eficiência e menos chance de crises financeiras.
“E isso tem grandes implicações, porque muitos países se preocupam com risco sistêmico e estabilidade. Em todos esses aspectos, reduzir a desigualdade de gênero pode ter efeitos macroeconômicos muito positivos”, afirmou Sahay.
Segundo o FMI, menos de 2% das CEOs de instituições financeiras globais são mulheres; elas também são menos de 20% dos membros dos conselhos dessas instituições.
“E isso é um contraste grande com a oferta de mulheres com formação relevante (nessa área)”, diz o texto do Fundo. “As mulheres representam 30% dos formandos em economia e cerca de 50% dos formandos em administração e ciências sociais.”
Segundo o estudo do Fórum Econômico Mundial, a igualdade de gêneros “é boa para os negócios”.
“Pesquisas feitas ao longo de três décadas mostram que (…) empresas com mais mulheres líderes e nos conselhos têm maiores lucros e performance financeira. Também têm menos relatos de fraude, corrupção e erros financeiros. Na Noruega, onde é exigido que as empresas reservem ao menos 40% de seus assentos de conselho a mulheres, as pesquisas mostram que elas têm mais probabilidade de pensar em longo prazo, e incluir cidadãos, em vez de apenas acionistas, em suas deliberações. As mulheres estimulam os conselhos a focar mais na comunidade, no ambiente e nos empregados.”
os rendimentos de mulheres casadas, empregadas e com idades de 25 a 35 anos levantados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, no terceiro trimestre de 2018.
As mulheres desse grupo que não tinham filhos recebiam, em média, R$ 2.182,06 por mês, contra R$ 1.618,47 das mulheres com filhos.
E quanto mais filhos, menor era o rendimento médio delas. Uma mãe de três ou mais crianças ganhava R$ 1.426,53 em média.
Para Anderson de Souza Sant’Anna, professor da Fundação Dom Cabral e coautor de um outro estudo sobre disparidade salarial de gênero, as carreiras das mulheres fazem “uma curva em U”.
“Elas são mais escolarizadas, então são promovidas mais rápido, mas a partir de um certo momento, por volta dos 35, 38 anos, isso se inverte, e os homens as ultrapassam. Como as empresas não têm políticas para maternidade, as mulheres, ao voltarem ao trabalho, não conseguem se reinserir e recuperar a posição. Esse conjunto de fatores, somados, vão causando essas diferenças (salariais)”, disse à BBC News Brasil em outubro.
ELAS GASTAM BEM MAIS TEMPO COM OS AFAZERES DOMÉSTICOS
Em 2016, as mulheres dedicavam, em média, 18 horas semanais a trabalhos domésticos ou a cuidados com pessoas (filhos ou parentes idosos, por exemplo), contra 10,5 horas dos homens, de acordo com o IBGE. Esse é um dos fatores que levam mais mulheres do que homens a buscar empregos de jornada parcial, com remuneração inferior.
“Em função da carga de afazeres domésticos e cuidados, muitas mulheres se sentem compelidas a buscar ocupações que precisam de uma jornada de trabalho mais flexível”, disse em comunicado Barbara Cobo, coordenadora de População e Indicadores Sociais do IBGE.
No entanto, “mesmo com o trabalho em tempo parcial, a mulher ainda trabalha mais”, agrega Cobo. “Combinando-se as horas de trabalhos remunerados com as de cuidados e afazeres, a mulher trabalha, em média, 54,4 horas semanais, contra 51,4 dos homens.”
ELAS SÃO PREJUDICADAS LOGO NA ENTREVISTA DE EMPREGO
Para Souza Sant’Anna, é possível que as entrevistas de emprego ajudem a perpetuar as diferenças salariais.
“Quando uma mulher é contratada, o RH pergunta quanto ela ganhava. Como elas historicamente ganham menos, uma hipótese é que já entram no novo emprego com um salário mais baixo do que um homem. Têm salários de entrada mais baixos. E isso ainda é intensificado por participação maior dos homens nos bônus. No caso de promoção, há uma tendência maior a favor dos homens.”
QUANTO MAIOR O CARGO, MAIOR A DIFERENÇA SALARIAL
As mulheres não apenas ocupam menos posições sêniores (nem 40% dos cargos gerenciais são das mulheres, segundo o IBGE) como também ganham menos em relação aos homens à medida que ascendem profissionalmente.
A pesquisa de Souza Sant’Anna, da Fundação Dom Cabral, analisou os salários de homens e mulheres em 12 grandes empresas dos setores de indústria e serviços, abrangendo 50 mil trabalhadores. Identificou uma diferença salarial média de 16% entre homens e mulheres que exercem o mesmo cargo.