Em 8 de janeiro deste ano, o Brasil presenciava a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, na capital federal. Em tentativa de golpe de Estado, bolsonaristas inconformados com o resultado da eleição presidencial marcharam do Quartel-General do Exército do DF até a Esplanada dos Ministérios e destruíram prédios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto.
Desde então (completam-se 100 dias na terça-feira, 18/4), polícias, Justiça, governo federal, Ministério Público, Advocacia-Geral da União (AGU), entre outros agentes, trabalham juntos para dar respostas à sociedade, punir culpados, julgar executores, incitadores e financiadores dos atos.
Até o momento, foi apurado prejuízo material de R$ 20,7 milhões causado pela depredação; mantidos 294 presos – 86 mulheres e 208 homens; e denunciadas 1.390 pessoas, no âmbito dos inquéritos que tratam dos atos antidemocráticos. Na Justiça Federal, a AGU move cinco ações para condenação definitiva de 178 indivíduos, três empresas, uma associação e um sindicato por financiamento ou participação nos atos golpistas. São essas pessoas que vão pagar, solidariamente, os custos dos reparos nos prédios dos Três Poderes.
Presos
Nesses 100 dias, foram concluídas as análises de quem deveria continuar preso e quem poderia responder às ações em liberdade. Logo após a depredação, 2.151 pessoas foram presas em flagrante. Entre elas, 1.406 permaneceram detidas em cadeias do DF. O ministro Alexandre de Moraes concluiu a análise dos pedidos das defesas e decidiu liberar 1.112 presos, todos com tornozeleira eletrônica e uma diversidade de medidas cautelares a serem cumpridas.
Todos os que conseguiram liberdade provisória continuam sendo monitorados e serão julgados por incitação ao crime e associação criminosa. O valor mensal de uma tornozeleira eletrônica é de R$ 211,10 para o Distrito Federal. Por mês essas pessoas custam aos cofres públicos, só no que diz respeito ao monitoramento eletrônico, R$ 234,7 mil. Por ano, o montante chega a R$ 2,8 milhões. A medida cautelar visa garantir que os réus cumpram todas as imposições judiciais enquanto o processo corre na Justiça.
Após 100 dias, ainda são 208 homens presos no Centro de Detenção Provisória II e 86 mulheres detidas na Penitenciária Feminina do DF. Segundo a Casa Civil do Distrito Federal, um preso custa, em média, R$ 2.450 por mês. As despesas envolvem alimentação, segurança, transporte, kits de higiene, colchão, atendimento médico, entre outros.
Medidas cautelares
Todos os denunciados em liberdade provisória precisam cumprir uma série de medidas judiciais. São elas:
- Proibição de ausentar-se da Comarca e recolhimento domiciliar no período noturno e nos finais de semana mediante tornozeleira eletrônica;
- Obrigação de apresentar-se perante o Juízo da Execução da Comarca de origem, no prazo de 24 horas e comparecimento semanal, todas as segundas-feiras;
- Proibição de ausentar-se do país, com obrigação de realizar a entrega de seus passaportes no prazo de 5 dias;
- Cancelamento de todos os passaportes emitidos pela República Federativa do Brasil;
- Suspensão imediata de quaisquer documentos de porte de arma de fogo em nome da investigada, bem como certificados CAC;
- Proibição de utilização de redes sociais;
- Proibição de comunicar-se com os demais envolvidos, por qualquer meio.
Decisões
O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu sete inquéritos para investigar executores materiais, autores intelectuais, financiadores e agentes públicos que possam estar envolvidos – seja por omissão, atuação ou incitação – nos atos de 8 de janeiro.
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é um dos investigados. Ele é suspeito de instigação e autoria intelectual dos atos que resultaram em episódios de vandalismo e violência em Brasília. Nessa sexta-feira (14/4), Moraes determinou que a Polícia Federal tome depoimento do ex-presidente.
Entre as autoridades alvos das ações, também estão o ex-secretário de Segurança Pública do DF Anderson Torres e o ex-comandante da PMDF Fábio Augusto Vieira.
Anderson Torres estava nos Estados Unidos no dia dos ataques. Foi preso por suspeita de omissão e conivência com a tentativa de golpe. A situação de Torres foi agravada depois que a polícia encontrou em sua casa uma “minuta do golpe”. Agora, ele presta esclarecimentos não só ao STF, mas também ao TSE, pois a minuta foi incluída em ação que tramita na Corte Eleitoral contra Jair Bolsonaro. A apuração visa ligar os pontos sobre supostas tentativas de descredenciar a Justiça Eleitoral.
Na última segunda-feira (10/4), a defesa de Torres entrou com pedido de revogação da prisão alegando que “mesmo já tendo iniciado a viagem de férias aos EUA, buscou conter a crise instalada, a qual não imaginava que poderia acontecer”.
Ex-comandante da PMDF, Fábio Vieira foi encarcerado pelo mesmo motivo que Torres, mas acabou liberado provisoriamente após relatório do interventor na Segurança do DF, Ricardo Cappelli, apontar que Vieira não teve responsabilidade direta na falha de ações contra os atos.
O governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), chegou a ser afastado do cargo, por suspeita de omissão. No entanto, em 15 de março, Alexandre de Moraes revogou a decisão e, após 65 dias, o emedebista voltou ao GDF.
Os inquéritos abertos pela Corte apuram os crimes de terrorismo, associação criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, ameaça, perseguição e incitação ao crime.
Ainda entre as autoridades, segue preso o coronel Jorge Eduardo Naime, ex-comandante de Operações da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). O oficial foi preso no âmbito do inquérito que investiga a responsabilidade de autoridades sobre a invasão e a depredação das sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro.
Denúncias totais da PGR
Até o momento, a Procuradoria-Geral da República (PGR) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) 1.390 denúncias no âmbito dos inquéritos que tratam dos atos antidemocráticos. Desse total, 239 pessoas são acusadas de serem as executoras do crime, enquanto 1.150 são enquadradas como incitadoras, e uma ocupante de cargo de agente público é investigada por omissão.
Segundo a PGR, eventuais casos ainda pendentes serão avaliados, e as providências cabíveis, inclusive eventuais denúncias, tomadas oportunamente.
“A análise desses casos foi priorizada porque a maior parte das pessoas está ou esteve detida, e existem prazos legais para o oferecimento de denúncia em casos com prisão cautelar. O objetivo foi evitar qualquer conjectura relativa ao excesso de prazo”, disse o subprocurador-geral da República, Carlos Frederico Santos, coordenador do Grupo Estratégico.
Ainda segundo o coordenador, com a conclusão dessa etapa, o grupo poderá concentrar os esforços e avançar nas investigações que buscam identificar os financiadores dos atos ou apuram a omissão de agentes públicos no dia dos ataques.
Por isso, a PGR se manifestou pela liberdade provisória dessas pessoas, com a adoção de medidas cautelares como: proibição de uso de redes sociais e de contato com outros réus; comparecimento periódico em juízo; uso de tornozeleira; entre outras. Esse tem sido o padrão adotado para os crimes leves.
Já nas denúncias contra executores, que respondem por crimes mais graves, como golpe de Estado e tentativa violenta de abolição do Estado Democrático de Direito, com penas que podem chegar a 30 anos de reclusão, a PGR requereu a manutenção das prisões cautelares.
A denúncia é a primeira etapa de uma ação penal pública. Ela é apresentada ao término das investigações. Uma vez aceita pela Justiça, transforma acusados em réus e pode resultar na condenação pelos crimes apontados.
A partir desta terça-feira (11/4) começam as análises das primeiras 100 denúncias dos presos por depredar os prédios. As análises devem ir até a próxima segunda-feira (24/4), em plenário virtual, quando os ministros colocam seus votos no sistema eletrônico do STF.
CPI
Em Brasília, a Câmara Legislativa instaurou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Em seu primeiro mês de oitivas que investigam os atos de 8 de janeiro, foram tomados cinco depoimentos pelos deputados distritais. Ao longo de março, figuras da Segurança Pública detalharam falhas que facilitaram a tentativa de instaurar um golpe militar no país.
A CPI ouviu três pessoas que faziam parte da Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF) e dois policiais militares, entre 2 e 30 de março. Para abril, estão previstos os seguintes depoimentos:
- Adauto Lucio Mesquita, empresário investigado por financiar o acampamento golpista em frente ao Quartel-General do Exército, no dia 13/4.
- Joveci Andrade, empresário, em 20/4.
- Cíntia Queiroz de Castro, coronel da Polícia Militar e subsecretária de Operações Integradas da Secretaria de Segurança Pública do DF, em 27/4.
Para o mês de maio, a CPI vai priorizar depoimentos de militares do Exército:
- Augusto Heleno, general que chefiou o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) de Jair Bolsonaro (PL), no dia 4/5.
- Fábio Augusto, ex-comandante-geral da PM , em 11/5.
- Gustavo Henrique Dutra de Menezes, general que chefiava o Comando Militar do Planalto (CMP) durante os atos antidemocráticos de 8/1, no dia 18/5.
- José Acácio Serere Xavante, conhecido como cacique Tserere, indígena preso no dia 12 de dezembro por atos antidemocráticos, em 25/5.
Já há 24 requerimentos aprovados para convocações e convites a depoentes. Apesar do grande número de pessoas a serem ouvidas, os deputados dizem que é preciso aprofundar as investigações com oitivas detalhadas, o que impossibilitaria dois depoimentos no mesmo dia, como chegou a ser marcado no começo da CPI.
Fonte: Metrópoles
Créditos: Polêmica Paraíba