Para garantir a promulgação de um texto consensual ainda em 2023, lideranças estudam o fatiamento da reforma tributária, que volta à Câmara dos Deputados para nova rodada de votações. A proposta de emenda à Constituição (PEC) foi aprovada em dois turnos no plenário do Senado Federal, na quarta-feira (8/11), com 53 votos favoráveis e 24 contrários.
A hipótese foi trazida pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na terça-feira (7/11), durante café com jornalistas. “A Câmara terá de se pronunciar sobre o que o Senado mudou, isso é um fato, ponto, o que não impede que, se 90% do texto for comum, esses 90% sejam promulgados, e a gente fique a decidir se a Câmara aceita esses 10%”, disse Lira.
O mecanismo, porém, não é consenso. O relator da reforma tributária na Casa, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), ressaltou, na quinta-feira (9/11), que, antes de tomar qualquer decisão, precisa receber o texto final e analisá-lo.
“Na construção do texto, pode-se ter uma modificação que estruturalmente comprometa a emenda constitucional. Então, não dá para fazer uma avaliação como essa sem que a gente tenha conhecimento pleno do texto”, pontuou.
O fatiamento, que ocorreu em alguns casos recentes (como em 2021, no caso da PEC dos Precatórios), visa garantir que a parte aprovada pelas duas Casas seja incorporada à Constituição, enquanto os trechos com divergência sigam em discussão.
Porém, o fatiamento não é bem-visto por alguns membros do Senado, após trabalho intenso do relator Eduardo Braga (MDB-AM). O parlamentar efetuou a articulação e o atendimento de diferentes setores da sociedade, como empresários e governadores, além de ter analisado e acatado mais de 300 emendas sugeridas por senadores.
Em coletiva após a aprovação do texto na CCJ, Braga ponderou: “É preciso compreender até onde haverá concordância entre as duas Casas, para saber se o sistema tributário que entraria em vigor com o fatiamento fica de pé”.
Propostas de emenda à Constituição (PEC) ficam “quicando” entre uma Casa e outra, até que ambas cheguem a um consenso. Ribeiro destacou que quer evitar o “pingue-pongue” e dialogar com Lira, com líderes partidários e, também, com o relator do texto no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM).
Após ser aprovada, a matéria é promulgada pelo Congresso em forma de emenda constitucional, sem passar pela apreciação do presidente da República. Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) estimou que a promulgação deve ocorrer até o início de dezembro.
“Temos de trabalhar para que a proposta como um todo seja promulgada, isso é o ideal. É lógico que precisa da construção de entendimentos sobre as exceções e as modificações aprovadas pelo Senado, mas o presidente Pacheco está determinado, assim como presidente Lira e o governo, que nós tenhamos um novo sistema tributário”, ponderou.
O que dizem ministros
Na quarta-feira (8/11), logo após a aprovação da reforma no Senado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi questionado sobre o eventual fatiamento e indicou que essa é uma possibilidade.
“Eu não acredito que vá precisar. Eu acredito que, assim como o Senado se deu ao direito — porque tem autonomia para mudar alguma coisa —, a Câmara vai avaliar o que o Senado fez, e aquilo que for comum às duas Casas pode ser promulgado. E o que não for comum fica para outra oportunidade. Isso aconteceu no passado”, relembrou.
“Mas eu penso que a espinha dorsal está ali, com a concordância de todo mundo. É um detalhe ou outro, que é da vida”. Ele citou como “espinha dorsal” o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, a não cumulatividade, a desoneração de investimentos e exportações, além da cesta básica com isenção.
Em visita à Câmara nessa quinta, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, tampouco descartou a possibilidade de fatiamento da reforma: “Já foi feito em outros momentos. Neste, estávamos focados em concluir a votação no Senado. O relator da reforma na Câmara acompanhou toda a tramitação no Senado e, certamente, vai fazer uma análise mais detalhada daquilo que foi aprovado. Vamos discutir”.
Texto aprovado no Senado
Eduardo Braga acolheu mais de 300 emendas apresentadas por senadores ao texto da tributária. Entre as últimas alterações no texto, está o “cashback” obrigatório na compra do gás de cozinha para famílias de baixa renda. Dessa forma, ao comprar o item, o consumidor recebe de volta parte do valor do tributo pago.
A matéria prevê, ainda, a isenção de impostos sobre produtos da cesta básica. Os alimentos serão definidos em lei complementar a ser votada. O texto também passou a prever:
alíquota zero para medicamentos e dispositivos médicos adquiridos pela administração pública e por entidades de assistência social sem fins lucrativos;
isenção na compra de automóveis por pessoas com deficiência ou no espectro autista, assim como por taxistas;
alimentos especiais e fórmulas nutricionais, destinados a pessoas com erros inatos do metabolismo, no rol de medicamentos com desconto de 60% nas alíquotas do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS); e
redução de alíquota para atividades de reabilitação urbana de zonas históricas, entre outras.
O principal ponto da reforma tributária é a unificação de cinco tributos que incidem sobre produtos (PIS, Cofins e IPIs federais, ICMS estadual e ISS municipal) para um só, chamado IVA dual:
O federal é chamado de Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS); e
O estadual e municipal é chamado de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
No atual sistema tributário, há um efeito cascata na incidência de impostos — ou seja, o contribuinte paga imposto sobre imposto. O IVA, por sua vez, é um tributo que incidirá de forma não cumulativa. Isso significa que será cobrado sobre todas as operações de compra de bens ou serviços, excluindo o que foi pago anteriormente.
Também há um imposto seletivo para produtos potencialmente nocivos à saúde (como cigarro e bebidas) e ao meio ambiente, de forma a desestimular a produção e o consumo desses itens.
Fonte: Metrópoles
Créditos: Polêmica Paraíba