
“Graças a Deus tô muito bem de saúde, não sinto nada”, disse dona Josefa, que recebeu Universa em sua pequena casa revestida de azulejos brancos no último dia 20. Lá, Universa teve acesso aos documentos que comprovam a idade dela, e que agra estão à disposição do Guinness Book para um possível reconhecimento.
Dona Josefa não é de muitas palavras, apesar da se mostrar lúcida em praticamente tudo que fala. Para andar, ela precisa da ajuda de uma pessoa ou se apoia na parede.
A aposentada mora com dois dos 22 filhos —apenas 13 deles “se criaram”, com diz. Desses 13 que conseguiram passar dos seis meses, apenas 4 estão vivos hoje. Netos? A própria família perdeu as contas do número.
A memória ainda guarda muitas lembranças, mas falha em alguns momentos. Quando perguntada sobre a idade, ela diz não saber com exatidão. “Uns cento e pouco”, diz. Também não sabe a data de morte do marido, nem a quantidade de exata de filhos.
Mas dona Josefa guarda um hábito incomum para quem chega a uma idade centenária: fumar. “Fumo, e muito”, revela, entre um cigarro e outro. Mas o fumo não é desses industriais “cheio de porcarias”, mas sim de palha. “Não gosto desse cigarro, nunca gostei”, diz ela, enquanto fuma e conversa com a reportagem.
Segredo para viver tanto? Dona Josefa diz que não tem.
Deus que consentiu de eu viver. Eu não fiz nada.
Ela se diz uma mulher feliz. Além da saúde, a maior alegria são os filhos e os amigos. “Não tenho intrigado nenhum, nunca fiz inimizade”, diz. “Não dou conselho a ninguém, porque ninguém me ouve, não.”

O mundo era outro em 1902
Quando dona Josefa nasceu, o mundo era bem diferente. Por exemplo: as mulheres ainda esperariam 32 anos até que o voto feminino fosse colocado na Constituição brasileira.
O país ainda não possuía o Acre (negociado com a Bolívia em 1903), e ainda não tinha enfrentado uma de suas maiores revoltas, a da Vacina, que ocorreria em 1904.
No mundo, o avião 14 Bis ainda não tinha marcado época ao realizar em Paris o primeiro voo do mundo. O planeta também não tinha vivido nenhuma de suas grandes guerras que assolaram especialmente a Europa.
A centenária se lembra de muitos acontecimentos históricos, e conta com sorrisos alguns causos do passado de sua vida em Pindoba, na zona da Mata alagoana. Foi lá que ela nasceu, foi criada, cortou cana e trabalhou por muitos anos na roça. Só depois de aposentada veio morar em Pilar. “Meu exercício era na roça, plantando batata, inhame, macaxeira”, lembra. “Faço nada hoje não, fico só descansando e comendo”, conta.
Os 117 anos chegaram, mas ela continua como se tivesse bem menos, com boa memória de coisas do passado, se alimentando só, caminhando. É algo que impressiona
O que fazer para viver tanto?
Para o geriatra e professor de medicina da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), Hugo Moura Melo, apesar de raro, é possível uma pessoa conseguir chegar a essa idade. Mas é preciso que exista “uma conjunção de fatores e que em algumas pessoas vão pesar mais para um lado do que para outras”.
“A genética tem influência. Há pessoas que expressam oncogenes -que são genes relacionados ao surgimento de alguns tipos de cânceres- ainda na juventude, fato que se relaciona a maior risco de óbito precoce”, diz.
Entretanto, ele diz que os hábitos de vida são até mais importantes que a genética. “Uma alimentação saudável com mais vegetais frescos, alimentos antioxidantes e sem agrotóxicos e menos produtos processados industrialmente; atividade física regular; não fumar; ter um ritmo de vida mais lento e menos estressante” são preponderantes, afirma o geriatra, citando também a saúde mental como exemplo.
“Conexões pessoais mais fortes, com relacionamentos felizes e que envolvem o cuidado do outro, são alguns dos fatores que comprovadamente influenciam na longevidade”, completa.
Sobre o hábito de fumar cigarro de palha, ele afirma que não necessariamente o tabaco afeta todas as pessoas fumantes da mesma forma. “Tem atleta que morre de câncer com vida supersaudável. Tem tabagista que chega aos 100 anos. Nosso organismo tem mecanismos de correção de erros -poderíamos dizer que o câncer é um erro na diferenciação celular- que dependem de vários fatores, intrínsecos e extrínsecos. Alguns conseguem controlar e outros não”, explica.
Fonte: UNIVERSA
Créditos: CARLOS MADEIRO