Depois da polêmica frase “meninos vestem azul, meninas vestem rosa” proferida pela ministra Damares Alves, tudo o que poderia ser dito sobre o assunto parece já ter sido publicado na internet na última semana. Antes de seguir o baile, porém, acho importante a gente aproveitar o gancho para se ater um pouquinho a outra frase dita por Damares em dezembro: “vamos tratar meninas como princesas e meninos como príncipes”.
Como não temos realeza governando o Brasil há mais de um século, a verdade é que não manjamos muito do assunto. Se todo mundo for honesto consigo mesmo, chegaremos à conclusão de que tudo o que sabemos sobre príncipes e princesas vem dos contos de fada e, particularmente, dos filmes da Disney.
Não sei quanto as mulheres da minha geração pensaram sobre esses enredos depois de adultas, mas fiz uma breve reflexão sobre meus filmes favoritos da infância outro dia e fiquei horrorizada.
Damares, por favor, vamos evitar de tratar nossas meninas como trataram essas princesas aqui?
Ariel – “A Pequena Sereia”
Aos 16 anos de idade, a sereia Ariel, filha do rei Tritão, teve seu primeiro crush. Ela avistou um cara chamado Eric num barco (isso era tudo o que ela sabia sobre ele) e achou boa ideia trocar sua voz de cantora por um par de pernas para flertar em terra firme. Quem propôs esse mau negócio foi a bruxa Úrsula, uma mulher mais velha e bem mais corpulenta que Ariel.
Olhando direitinho, é meio chato quando a gente perde nossa voz em nome do amor e quando retratam uma mulher mais velha e gorda como bruxa inimiga, mas fiquem a vontade para tirar suas próprias conclusões assistindo a esta cena.
Jasmine – “Aladdin”
Aqui temos uma princesa de 15 anos que só tomava esculacho do pai porque não aceitava se casar com nenhum de seus pretendentes. A ideia era que Jasmine escolhesse um príncipe, mas ela se apaixonou pelo Aladdin, que era pobre. Vítima de um feitiço e cansado de tentar arranjar a boda da filha, o sultão decidiu que Jasmine se casaria com Jafar, ministro e conselheiro dele — com idade para ser pai ou avô de Jasmine, diga-se de passagem. Se era para isso parecer errado, talvez a cena tenha ficado sexy demais ao retratar uma garota de 15 anos se oferecendo para um senhor de 60+.
Bela – “A Bela e a Fera”
A adolescência realmente não é moleza para nenhuma princesa da Disney. Aos 17 anos, Bela sofria assédio constante de um cara bem grosseiro chamado Gastón, mas o pior em relação aos homens ainda estava por vir. Para salvar o pai, que tinha sido preso pela Fera — tão ou mais estúpido que Gastón — Bela se oferece como refém vitalícia no palácio. Mais tarde, para impedir que a Fera fosse lichada por Gastón e seus amigos da aldeia, Bela quebra o feitiço que transformou o dono do palácio em Fera usando apenas a força de seu amor.
Aqui, fico especialmente chateada porque Bela era tão inteligente e comunicativa que poderia ter tido sucesso em qualquer empreitada na vida, mas passou o filme inteiro resolvendo os problemas mentais de um monte de homens insuportáveis. Peço perdão pela qualidade do vídeo, mas veja se tem condições uma cena dessa:
Cinderela – “Cinderela”
Desde a morte do pai, Cinderela vivia como escrava da madrasta e de duas irmãs — que maltratavam a garota por inveja de sua beleza, entre outras perversidades. Aos 19 anos, nada mais natural do que a vontade que Cinderela sentiu de ir a um baile. Acontece que ela foi agredida pelas irmãs na hora de sair de casa e acabou sendo ajudada por uma fada a descolar um look para ir nessa baladinha top. À meia-noite, Cinderela já estava dançando com o príncipe, prenunciando uma pegação quase garantida, mas a magia das roupas se desfez e ela precisou sair correndo, deixando o sapatinho de cristal para trás. O resto, a gente já sabe, mas me pergunto como é que ficaria essa história se o sapatinho tivesse servido no pé de outra moça antes dela e por que a gente precisou assistir uma coisa assim de cruel:
Branca de Neve – “Branca de Neve”
Aqui, temos mais um caso de madrasta psicopata com ciúmes da beleza da enteada. Primeiro, a madrasta encomenda a morte da enteada com um caçador, pedindo o coração dela numa caixa. Bem desnecessário, mas o horror estava só começando. O caçador acha Branca de Neve gata demais e desiste de matá-la, então ela foge para a casa dos sete anões. O que dizer deles? Um monte de marmanjo que não tinha coragem de fazer uma limpeza na casa — bucha que sobrou para essa princesa de 16 anos resolver. Bom, mas a madrasta descobre o paradeiro da enteada e finalmente consegue envenená-la usando um disfarce e uma maçã. Branca de Neve morre, mas os anões, também fascinados com sua beleza, optam por não enterrá-la, mantendo a guria em um caixão de cristal para que pudessem continuar admirando a formosura da garota. Está bom de necrofilia? Não. O príncipe passa pelo local e, com um beijo, ressuscita a donzela.
Se for para levar uma vida miserável como a dessas meninas, eu tô bem tranquila na minha condição de plebéia — e não gostaria de ver uma filha crescer se projetando nessas figuras. Não sei vocês.
Fonte: Luiza Sahd
Créditos: Universa