Lei de Drogas

"A maconha é tida como vilã": diante de debate no STF, profissionais falam sobre a descriminalização da maconha e dividem opiniões - CONFIRA 

Na última terça-feira (08), o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou, mais uma vez, a análise do processo que trata sobre a descriminalização das drogas para consumo próprio. O julgamento do processo teve início em 2015 e esteve paralisado durante os últimos anos, sendo retomado para discussão no dia 02 de agosto deste ano.

Foto: Marcelo Júnior / Polêmica Paraíba

Na última terça-feira (08), o Supremo Tribunal Federal (STF) liberou, mais uma vez, a análise do processo que trata sobre a descriminalização das drogas para consumo próprio. O julgamento do processo teve início em 2015 e esteve paralisado durante os últimos anos, sendo retomado para discussão no dia 02 de agosto deste ano.

A votação, que teve início no dia 02, saiu favorável a descriminalização e recebeu um placar de 4 a 0, onde os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Roberto Barroso votaram a favor da descriminalização da maconha para o consumo próprio. Já o ministro Gilmar Mendes votou para descriminalizar o porte para consumo pessoa de forma ampla, sem especificações.

Durante a votação, os ministros concordaram com a tese de inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, mas divergiram em alguns critérios para diferenciar os usuários de maconha dos traficantes de drogas. Alexandre Moraes sugeriu um limite de 60 gramas de maconha para se caracterizar uso pessoal. Luis Barroso por sua vez aconselhou um teto de 25 gramas e Edson Fachin delegou ao Congresso a criação de um critério. Já o relator Gilmar Mendes foi o único a votar pela descriminalização do uso pessoal de quaisquer drogas.

O artigo 28 da Lei 11.343 / 2006 diz que apesar de não ser punível com prisão, é crime adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Ainda não existem critérios para que um usuário recreativo, após ser abordado pela polícia, não seja autuado e levado para delegacia para prestar depoimentos, ser advertido ou até mesmo têm que pagar multa para que possam ser liberados.

O Polêmica Paraíba conversou com a professora da rede pública de ensino, e usuária recreativa da maconha, Fabrícia Oliveira, para saber seu posicionamento diante do debate que está sendo tratado no STF e que em breve estará sendo analisado no Senado Federal.

Fabrícia Oliveira, de 42 anos, relatou, em entrevista ao Polêmica Paraíba, os desafios que já enfrentou em quase 20 anos fazendo o consumo da droga, que apesar de, inicialmente, ter sido um grande impacto para a família, hoje todos lidam melhor com a ideia.

“Quando eu fui descoberta pela minha família, isso em 2004, minha mãe chorou como se tivesse recebido uma sentença de morte. E eu achei aquilo bem ridículo da cena dela chorando desesperadamente, dizendo que iria investir dinheiro para eu me tratar em uma clínica. Hoje em dia, após 19 anos, a visão da minha família é completamente diferente. Minha irmã mais velha, por exemplo, está com problemas de ansiedade, e já falou em procurar tratamento com o uso da cannabis medicinal. Então, eu acredito que os pensamentos das famílias evoluíram bastante. E desde que minha mãe descobriu, há quase vinte anos, ela percebeu que nada mudou na minha vida”, disse Fabrícia.

Fabrícia relatou ainda, que apesar de algumas famílias terem sim evoluído com os pensamentos e aceitação, muitas outras são extremamente influenciadas pela igreja e tratam do assunto com bastante preconceito e sem argumentação nenhuma.

“Por mais que tenham famílias que já evoluíram com esse pensamento, têm muitas que querem e estão retrocedendo anos luz, em uma discussão que não cabe mais. Infelizmente, as igrejas evangélicas também influenciam muito o pensamento dessas famílias. Meus alunos, que são religiosos, eles dizem que o Brasil vai virar um cabaré, que todo mundo vai sair matando todo mundo, que as mulheres vão sair por aí abortando porque são maconheiras. Distorcendo completamente a realidade”, acrescentou a professora de ensino médio da rede pública.

A usuária recreativa defende a descriminalização e leva a discussão sobre tema para a sala de aula, mas, reconhece que a população em geral associa o usuário a outros crimes, como roubo e até morte. Sem falar que acham que toda família será destruída quando um adolescente for descoberto fumando maconha.

“Hoje eu tenho coragem de ser defensora em sala de aula para meus alunos adolescentes. Porém, eles ficam me chamando de cracolândia, dizendo que eu defendo que os viciados roubem os pais e as mães para poder comprar drogas. Então assim, o preconceito distorce muito. E naturalizar o uso da maconha especificamente, daria um entendimento melhor para a sociedade”, acrescentou.

Um ponto de vista comum entre pessoas que defendem a descriminalização é a busca por um tratamento mais respeitoso não só da sociedade, mas, também das autoridades policiais. Fabrícia descreveu um episódio em que nas duas vezes que foi flagrada fumando maconha, ela foi desrespeitada e humilhada pelos policiais. “Eu, como usuário sempre tive medo de consumir, pois, dentro de casa, minha mãe não deixava. Então, eu tinha que consumir fora de casa. E aconteceu de duas vezes eu ser flagrada por policiais, e ser constrangida tendo que ouvir humilhações”, disse.

Por fim, Fabrícia Oliveira enfatizou que defende a descriminalização para que os usuários saiam de situações conflituosas e a maconha não deve ser vista sempre como uma vilã e porta de entrada para outros tipos de drogas, que são bem mais pesadas e danosas para quem as consomem, como a cocaína.

“Eu defendo a descriminalização, para que o usuário saia dessa condição que é extremamente conflituosa. Um dos efeitos negativos da cannabis é quando você fica com o sentimento de culpa e as vezes de perseguição. Já aconteceu de eu fumar na UFPB, pegar o carro e dirigir para casa, e achar que uma viatura policial estava vindo atrás de mim na BR, mas, a polícia estava apenas passando. Esse tipo de sentimento ruim que pode gerar nervosismo e pode até causar um acidente. Mas como as mentes são diferentes, tem pessoas que podem de fato desenvolver transtornos psíquicos, outras não. Vai depender do organismo, das vivências. Mas, isso serve para o álcool, uso de celular e vários outros hábitos ou comportamentos. Como é uma droga que age na mente, nada melhor do que naturalizar. Sem falar com a questão histórica que é associada a discriminação racial. e todo mundo que estuda mesmo, entende isso. Colocar a maconha como vilã e porta de entrada para outras drogas, tudo isso é babaquice”, finalizou.

O outro lado

O Polêmica Paraíba também ouviu um advogado especialista em Direito da Família, que é contra a descriminalização ou a legalização da maconha. Para Guilherme James, de 40 anos, o Brasil não está preparado para legalizar a maconha. Pois, para ele, os debates que vêm sendo feitos são com base em premissas que não refletem a realidade, ou ao menos denotam apenas parcela da verdade.

“O que se traz para a população são rasas afirmações, não revelando a complexidade do problema, tampouco avaliam os pontos negativos e o que a descriminalização do porte de maconha vai fazer em relação as demais drogas (precedentes)”, disse o advogado.

Ainda segundo Guilherme James, o uso da maconha traz não apenas problemas sociais, mas, pode acarretar em diversos problemas de saúde, como a esquizofrenia, transtornos psicóticos e depressão.

“Indubitavelmente o uso de maconha, além da dependência química, está relacionado com o desenvolvimento de uma série de transtornos mentais, tais como esquizofrenia, transtornos psicóticos, depressão, ansiedade, comprometimento cognitivo e suicídio”, acrescentou.

Guilherme acredita ser notório que a partir do uso da maconha, outras drogas possam entrar na vida destes usuários, como por exemplo o crack. “A pessoa que está usando crack, chega em determinado momento que não tem discernimento para saber decidir o que é bom e ruim. A pessoa que usa crack pode matar por R$ 10. É nesse sentido que o direito individual do usuário não pode se contrapor a saúde pública e à tutela de toda coletividade”, destacou.

O advogado reforçou ainda, que o relatório mundial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as drogas, afirma categoricamente que a legalização da Cannabis não reduziu o mercado ilegal em diversos países. “Desta forma, sou totalmente contra qualquer tipo de flexibilização neste sentido, até porque, o tráfico no Brasil apresenta índices crescentes e o Estado não se mostra capaz sequer do controle efetivo das chamadas drogas lícitas” finalizou.

*A matéria acima não reflete, necessariamente, a opinião da jornalista ou do portal de notícias, Polêmica Paraíba.

Fonte: Adriany Santos
Créditos: Adriany Santos