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Ex-marqueteiro de Lula vê cansaço de eleitores com o governo do petista - Por Nonato Guedes

Ex-marqueteiro de Lula vê cansaço de eleitores com o governo do petista - Por Nonato Guedes

João Santana, que já foi marqueteiro do líder Luiz Inácio Lula da Silva e foi condenado na época da operação Lava Jato, avalia que a situação atual do presidente da República é pior do que no período em que estourou o escândalo do mensalão, desgastando, sobretudo, o Partido dos Trabalhadores-PT. João Santana diagnosticou que pode estar havendo “uma fadiga de material” em relação a Lula neste seu terceiro governo por parte de segmentos da opinião pública, refletindo-se na própria desaprovação do governo em índices preocupantes. Santana, que trabalhou para o petista na campanha de 2006 e também trabalhou para Dilma Rousseff em 2014, fez os comentários em declarações a “O Globo” que repercutiram na própria base de apoio ao mandatário, também ela desconfortável com a falta de resultados mais expressivos da gestão e com as críticas contundentes que partem, sobretudo, de opositores do PT e do presidente, mas também encontram eco no entorno governista.
“Algumas pesquisas qualitativas já na campanha de 2022 mostravam um certo cansaço dos próprios eleitores do Lula com ele. Era desconforto com o tom da voz, com a própria postura corporal, o que indica que pode estar havendo uma fadiga de material. Em 2005, a crise (deflagrada pela revelação do esquema do mensalão) foi moral e, naquela época, falávamos muito do efeito teflon no Lula, que nada pegava nele, que era protegido. Pode ser também que isso esteja diminuindo. Naquele ano ele era uma novidade. Tinha ímpeto e, principalmente, tinha uma equipe ao redor”, analisa João Santana. O marqueteiro foi condenado na Operação Lava Jato junto com a mulher Mônica Moura e, posteriormente, beneficiado pela anulação de provas. Ele revela que a situação política de Lula “não é terminal”, mas há diferenças profundas entre o período em que o petista governou no início do século e agora, “o que torna a missão de reverter a crise de popularidade muito mais difícil”.
Ele compara: “Hoje temos a polarização caótica e superficial das redes sociais, o crescimento dos evangélicos, a política judicializada, o Centrão como fiel da balança, a conjuntura mundial delicada. Nada disso existia em 2005”. Santana parece endossar a estratégia de Lula para tentar reverter a queda progressiva na sua popularidade. O petista transformou a reforma ministerial pensada para melhorar a governabilidade em um comitê de campanha antecipada para a eleição de 2026 e, com isso, vem desgostando líderes e aliados de outros partidos que teoricamente compõem a base de apoio mas que contam em suas fileiras com ambições indiscutíveis e pretensões confessas de disputa à própria Presidência da República. O entendimento de João Santana é o de que o presidente largou o governo de olho em 2026, numa tática arriscada que pode levar ao seu isolamento político em meio a interesses concorrentes na sua órbita. A persistente inabilidade política do governo, apesar de mudanças de impacto feitas ultimamente, piora a situação de estabilidade do governo e a posição pessoal do mandatário na condução das decisões oficiais.
Para o marqueteiro, Lula deve promover uma guinada mais à esquerda do que ao centro, “tanto para vencer no ano que vem quanto para resgatar a biografia do Lula”. Na entrevista, ele mesmo indaga: “O que é o Brasil de hoje? De um lado, uma esquerda moderada clientelista, de outro uma direita selvagem e antidemocrática. O equilíbrio não é a busca por um centro amorfo. Se for por aí, Lula não tem condições de vencer em 2026. Isso não é papo de esquerda defasada, não. Em alguns momentos é, sim, necessário partir para alguns enfrentamentos. E já está ficando tarde para fazê-los”, pontua João Santana. A avaliação sobre alcance negativo do governo continua se espalhando, principalmente, na classe política. Uma pesquisa do Ranking dos Políticos que veio à tona esta semana mencionou que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva é considerado ruim/péssimo por 49,1% dos deputados federais. Já o trabalho do presidente é considerado ótimo/bom por 28,2% dos congressistas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, e regular por 23% dos entrevistados.
O que preocupa mais fortemente o próprio governo é a sucessão de erros de comunicação na relação entre Lula e o Planalto e os segmentos da sociedade, agravados por falas do presidente Lula que são tidas como desconexas ou até mesmo infelizes quando tenta recorrer a metáforas para explicar o terceiro mandato do ponto de vista de eficácia ou da entrega de resultados. A mudança introduzida na Comunicação, com a convocação do marqueteiro Sidônio Palmeira, não produziu grandes “milagres” como era esperado pelo núcleo duro do presidente da República – e além do acúmulo de queixas na base de apoio no Parlamento há sinais de movimentação dos supostos aliados do mandatário para dificultar a vida do governo, numa espécie de “conspiração branca” que nem mesmo a articulação política, agora confiada à ministra Gleisi Hoffmann, tende a resolver. O governo Lula parece irremediavelmente perdido, enredado nas suas próprias contradições e na ausência de propostas inovadoras para um país exigente e uma sociedade cada vez mais influente e participativa. Até prova em contrário, continua valendo a máxima de que o governo opera de forma analógica diante de uma realidade digital, que exige soluções urgentes e comprovadamente eficazes. É o dilema que está posto na mesa.