
O caso da Praça Vidal de Negreiros, em João Pessoa, atavicamente conhecida como Ponto de Cem Réis, reforça o poder da memória popular sobre a nomenclatura oficial dos espaços urbanos. Mesmo frente a uma decisão legítima de homenagear personagem histórico, e local, relevante – no caso, Vidal de Negreiros, um dos líderes da luta contra a dominação holandesa, no Nordeste –, a designação espontânea da população prevaleceu, porque apresentava vínculo direto com a vivência cotidiana.
O nome Ponto de Cem Réis surgiu de uma situação concreta: o preço da passagem dos bondes que ali paravam, antes do espaço, então, uma espécie de largo da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, virar praça. O batismo popular nasceu, portanto, da experiência urbana, do uso diário, e se manteve pela força da tradição coletiva. Diferente do nome oficial, que exigia esforço intelectual de reconhecimento e aceitação, a designação espontânea era prática, orgânica, e se perpetuou naturalmente.
O Ponto de Cem Réis remete ao cotidiano vivido, às lembranças de um tempo em que João Pessoa era atravessada pelos referidos bondes, e o centro existia de uma forma muito própria, o que perdurou até a década de 1960, mesmo com mudanças não só dos preços das passagens, como da própria moeda, afora a tração, de animais para eletricidade, naquele vetusto e saudoso meio de transporte urbano. Assim, a praça se tornou o “centro do centro histórico”, não apenas geograficamente, mas também como marco de permanência da tradição oral e da identidade da cidade.
Casos como esse mostram, conforme comentamos no caso da Rua da Areia, que a cidade não é feita apenas de ruas e praças nomeadas por decretos, mas também de histórias compartilhadas e significados que resistem ao tempo. A persistência do Ponto de Cem Réis na fala do povo é prova de que não raramente a identidade urbana é construída pela experiência dos que a vivem.

Sergio Mario Botelho de Araujo Paraibano, nascido em João Pessoa em 20 de fevereiro de 1950, residindo em Brasília. Já trabalhou nos jornais O Norte, A União e Correio da Paraíba, rádios CBN-João Pessoa, FM O Norte e Tabajara, e TV Correio da Paraíba. Foi assessor de Comunicação na Câmara dos Deputados e Senado Federal.