O dinheiro público, conhecido pela sua capacidade de financiar negócios escusos e comprar pessoas não menos escusas em detrimento de necessidades legitimas, pessoas carentes e negócios decentes, vai cada dia mais abastecendo o mercado da promiscuidade. Não seria nada fácil mas é inteiramente possível a um gestor público escrupuloso, desses que estão ficando escassos na atualidade, dar um destino correto ao Erário e transformar a gestão pública num espelho onde a cara do administrador não seja muito diferente da cara dos pobres à que serve, que, via de regra, têm um padrão de probidade infinitas vezes mais convincentes do que o perfil de seus gerentes políticos.
No deplorável caso do Botafogo, em que os recursos públicos do Estado serviram ao único fim de colocar o governador do Estado dentro da festa alheia, para qual em nada contribuira, revela uma nova faceta dessa farra sodômica com o uso do patrimônio da sociedade, e demonstra que para cada governante desatinado há um seleto grupo de pessoas dispostas a ajudar na obra do sumiço dos recursos públicos ou na sua aplicação em atividades inteiramente alheias aos interesses primordiais da população.
De mais grave, porém, é constatar que do lado da sociedade haja entidades e seus dirigentes engrossando o caldo dessa nova cultura de despudor, todos felizes porque os banquetes serão regados a dinheiro fácil que, se para mais nada servir, já terá servido para desmoralizar a todos, enquanto pipocam nos céus os fogos de artifícios e rufam os tambores diante da vitória de um clube de futebol que gera amor e paixões que podem ser negociados por debaixo dos panos e por detrás de ingênuos e puros torcedores honestos em suas celebrações.
Ninguém pode tirar interpretação sadia deste ato do presidente do Botafogo, que pôs diante dos holofotes festivos da vitória consagradora do domingo quem não esteve participando da trajetória de lutas nervosas e árduas para o clube chegar onde chegou, mais ainda destronando e cuspindo na cara de quem se empenhou para que os louros fossem alcançados. Nesse caso surpreendente de falta de responsabilidade dirigente e de sedição aos encantos do poder, e de ingratidão grosseira a um colaborador apaixonado como Luciano Cartaxo, restou atribuída injustamente aos botafoguenses, por culpa exclusiva do presidente do clube, a pecha da traição mais torpe, fato que não combina com o sentimento de gratidão reinante entre os torcedores em sua festa que virou a noite e rebentou no orgulho do futebol do Estado.
Por causa disso, é melhor distinguir a festa do povo da farra dos dirigentes, na certeza de que é inteiramente possível conviver com a grandeza do time e a fraqueza de seus administradores, que não entendem que o brilho da vitória não pode ser inferior a honra do merecimento e justo orgulho das comemorações.
É de se lastimar que a consagração do Botafogo tenha servido de motivo para atitude de tão desmesurada covardia, a única forma de reduzir a extraordinária celebração da vitória. Mas se foi essa a opção dos dirigentes do clube na afronta a Luciano Cartaxo e no desprezível agrado a Ricardo Coutinho, ficou evidente que só o time saiu ganhador, e seus dirigentes nada ganharam. E se foi uma escolha de Nelson Lira preferir RC a Cartaxo, também ficou evidente que a escolha é o caminho mais seguro para os dois não terem futuro juntos.