A pobre da Dorinha

Por Rubens Nóbrega

– Oi, meu filho, você tá me ouvindo?
– Estou sim, mãe. Tudo em ordem por aí?
– Tá não, meu filho. Você lembra de Dorinha?
– Dorinha?… Dorinha?…
– Dorinha, meu filho, aquela moça que passava roupa aqui em casa e engomava tua farda do Colégio da Prata. Lembra não?
– Ah, sim. Dorinha, claro… Claro que lembro, mãe. Foi que houve com ela?
– Ah, meu filho, nem te conto… Tu sabes que teu pai botou ela de merendeira na creche pertinho aqui de casa. Faz pra mais de 20 anos isso. Pois não é que agora botaram a pobre pra fora do emprego.
– Não diga, mãe, não diga. E quando foi isso?
– Hoje, meu filho, hoje mesmo. Quando ela chegou de manhã, pra trabalhar, a diretora avisou que ela não precisava vir mais, que veio uma ordem lá de cima pra mandar embora todo mundo que não fosse do lado deles…
– Ô povo ruim, mãe. Pense!
– Pois é, meu filho. E agora a pobre da Dorinha veio até aqui em casa e tá ali chorando, coitada, sem saber o que fazer da vida. Nessa idade, nem força mais pra engomar ela tem. Dá uma pena… Daí por que eu estou te telefonando que é pra ver se você faz alguma coisa por ela, meu filho.
– Mas a senhora sabe dizer por que botaram ela pra fora, mãe?
– Sei direito não, meu filho, mas parece que é porque saiu uma pesquisa aí e o negócio não está nada bom pro homem. E, segundo me contou Dorinha, teu nome aparece em primeiro, bem acima dele. Deve ter sido isso, imagino.
– Quer dizer que foi por causa da pesquisa, foi? Ô povo ruim…
– Pois é, meu filho, pois é. E aí, meu anjo, dá pra tu falar com ele lá, que é pra dar um jeito no caso de Dorinha? A bichinha, meu filho, dá uma dó. E a gente sabe que ela tem culpa de nada, meu filho. Só sendo! Fazer isso com a pobre…
– É complicado, mãe, muito complicado. Mas vou ver. Vou ver e depois dou notícia.
***
Encerrada a ligação, o Senador chama o assessor.
– A gente tem que contratar e divulgar uma pesquisa urgente. Veja aí qual instituto está disponível. Mas tem uma coisa: pede ao pessoal pra dar uma encorpada nos índices do homem. Não deixa ele ficar muito distante de mim não, visse?
– Oxe, Senador! Tô entendendo não…
– Ah, rapaz, se você tivesse ouvido o que ouvi agora há pouco, entenderia rapidinho. Mas, por enquanto, se conforme em saber o seguinte: se sair mais uma pesquisa derrubando o cara, ele vai passar o rodo e botar todo o meu pessoal na rua. E aí, meu jovem, até o fim desse governo nunca mais vou ter sossego na vida.
Ameaças aos procuradores
Outros secretários do governador Ricardo Coutinho, além de Waldson de Souza, da Saúde, deverão ser levados à Justiça e processados por improbidade administrativa pelos 40 procuradores de carreira do Estado. Em nome do Estado. Deverão ser processados porque não submetem contratos e licitações de suas secretarias ao exame e parecer da Procuradoria Geral do Estado, preferindo entregar esse trabalho, essa responsabilidade, a assessores jurídicos comissionados.
O procedimento do atual governo configuraria afronta à Lei das Licitações, agravada por desrespeito explícito às prerrogativas dos procuradores, que são responsáveis pelo controle da legalidade dos atos administrativos dos gestores estaduais. Antes de judicializarem essa questão, contudo, os procuradores, individual, coletivamente ou através de sua associação representativa, a Aspas, tentaram nos últimos dois anos convencer o governo a fazer o que têm como certo.
Mas o governo, pelo visto, não deu a menor. Por sua postura, ao governo é atribuída a culpa pelo conflito que levou a categoria dos procuradores a realizar a primeira paralisação de atividades em toda a história da Paraíba. Por sua indiferença diante das orientações e advertências dos procuradores, também deve ser debitada na conta do governo essa inédita ação por improbidade contra um Secretário de Estado e outras do mesmo gênero que deverão ser ajuizadas em breve.
Salário é dos mais baixos
O contensioso na PGE é alimentado ainda pelas precárias condições de trabalho dos procuradores, complementadas pela remuneração pouca, classificada entre as piores do país. Pra vocês terem uma ideia, eles sequer têm um lugar de trabalho pra chamar de seu, já que o órgão foi despejado do interditado prédio – rachado e extremamente deteriorado – do finado Paraiban, na avenida Epitácio Pessoa, a maior da Capital.
Mas, como na Paraíba de agora nada é tão ruim que não possa piorar, em vez de atender ou pelo menos negociar com esses qualificados e preparados servidores públicos, o governo partiu para ameaças e retaliações. Digo isso porque após o anúncio público da ação contra o secretário Waldson, o Doutor Gilberto Carneiro, procurador geral do Estado, foi também a público dizer que acionaria a Corregedoria do órgão contra os seus subordinados, submetendo-os a inquéritos administrativos.
Como se fosse pouco, o Geral deixou bem claro – com sutileza paquidérmica – que os procuradores em estágio probatório podem não ser efetivados (e demitidos) caso continuem solidários com os colegas mais antigos, estáveis na função.