Estilo inflexível de Dilma complica diálogo

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Nonato Guedes

A revista “Época” informa, em matéria especial sobre os protestos de rua em diferentes capitais e cidades brasileiras, que a personalidade da presidente Dilma Rousseff, tida como ríspida e inflexível no diálogo com interlocutores, tem contribuído para agravar a situação. Em relato sobre um dos encontros políticos promovidos como parte do pacto nacional que ela havia proposto na TV, a revista salienta que são abundantes os episódios de rispidez no trato com políticos, subordinados e lideranças sindicais. Para “Época”, tais episódios revelam uma presidente inflexível, aparentemente incapaz de se curvar ao erro, mesmo quando confrontada com as vozes das ruas. “Revelam uma tecnocrata obstinada, não uma estadista consciente de que, para liderar o país num momento de crise, é preciso genuinamente buscar o diálogo não apenas com a população mas com todas as forças políticas que compõem a democracia brasileira”, acrescenta a revista.

“Não há maquiagem na propaganda oficial que consiga camuflar os problemas no governo, apesar de os gastos com esse quesito estarem em alta no Planalto”, narra a revista, ironizando as despesas com o visual da presidente, que teriam subido 681% desde dezembro de 2012 e somam R$ 3.125 a cada aparição de TV em cadeia nacional, conforme divulgou o jornal “Folha de São Paulo”. Referindo-se a pesquisas de institutos especializados, registrando uma queda expressiva na aprovação do governo da petista, “Época” insinua que os números começam a lançar sementes de dúvidas sobre a reeleição de Dilma e deveriam levar a presidente a mudar o comportamento para recobrar o rumo político. De acordo com a revista, o atabalhoamento político da presidente desde o começo dos protestos demonstra suas dificuldades para compreender a mensagem das ruas. Primeiro, Dilma demorou a falar ao país, quando todos os brasileiros buscavam nela as respostas. Quando Dilma finalmente falou, na noite do dia 21 de junho, expressou-se mais como gestora e menos como presidente. “Não houve nenhum ato de contrição nem reconhecimento de qualquer tipo de responsabilidade do seu governo pelo descontentamento popular”, pontua a matéria.

Um ministro próximo de Dilma confidenciou que no governo houve um susto geral com a magnitude das manifestações e que ninguém tinha uma fórmula para que o Planalto esboçasse reações mais afirmativas. Foi nesse clima que nasceu a ideia de propor um plebiscito para a população decidir se deveria ser convocada uma Assembleia Constituinte exclusiva para tratar da reforma política. Novas reações pipocaram, inclusive da parte de juristas que consideram legítima apenas a Constituinte convocada em momentos de revolução ou mudanças de ordem institucional para elaborar, por completo, uma nova Constituição. Parlamentares entenderam que o Executivo estava querendo atropelar o Congresso em suas funções legislativas e abrir uma brecha que poderia rapidamente se transformar numa voçoroca institucional, por onde, depois, poderia passar todo tipo de golpismo. O vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), que é constitucionalista, foi mantido desinformado da convocação da Constituinte. A alegação é de que a presidente não confia nele nem em ninguém do PMDB. Essa dificuldade em confiar teria sido forjada nos tempos de Dilma como guerrilheira, durante a ditadura militar. O presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN) teria reagido com estupefação ao descobrir a proposta do plebiscito. Mais tarde, o governo recuou e passou a encampar a ideia do plebiscito.

Por causa do estilo de Dilma, ainda de acordo com “Época”, a rotina do atrito tem sido a marca registrada de seu governo, apesar de, no papel, ele ter a maior base de sustentação parlamentar desde a redemocratização. Preocupado, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, defende a reconstrução da base petista entre os movimentos sociais. A tese dele é a de que, se perder os movimentos sociais no Estado, o PT, que já tem dificuldade de se reaproximar da classe média, estará liquidado eleitoralmente. A eleição de 2014, a dados de hoje, ficou embaralhada. Nas últimas semanas, o Instituto Sensus fez pesquisas qualitativas em todo o país para medir o impacto das manifestações e concluiu que a reeleição de Dilma não será fácil como parecia meses atrás. O discurso baseado nas conquistas econômicas e sociais dos últimos anos não é mais tão eficaz. “Não há rejeição ao que foi feito. A avaliação é positiva, mas as pessoas querem alguma coisa diferente”, interpreta Ricardo Guedes, diretor do Sensus. Há sinais até de desgaste dos programas, uma crítica ao que Guedes chama de “bolsa-tudo”. Entre os que ganham mais, a reclamação é de falta de fiscalização nos programas sociais do governo.