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Nonato Guedes

Originalmente, o título do artigo escrito por Ethevaldo Siqueira, reproduzido no “Observatório da Imprensa”, é este: “Parem de chorar, velhos jornalistas”. É um recado aos colegas que reagem contra o fim inexorável dos jornais e revistas e, em especial, contra as demissões crescentes. Ethevaldo alerta que tem uma visão bem diferente da maioria dos profissionais de imprensa sobre o que pode ser feito diante desse quadro. Leiamos, então, o que ele argumenta: “Por mais que eu ame o jornalismo impresso e me entristeça em fazer essa previsão, afirmo-lhes com todas as letras: o jornal de papel está morto. O que fazer? A meu ver, dar-lhe um enterro de luxo. E algo muito mais importante, que é saber claramente como será o futuro do novo jornalismo”.

– Não tenho nenhuma bola de cristal, mas acompanho a evolução da imprensa no mundo com bastante interesse e atenção há mais de 45 anos. Lembro-me que nos anos 1960 ficava admirado e feliz com uma estatística mundial que mostrava o Japão, a Suécia e o Reino Unido como os três países com maior índice de circulação de jornais no planeta: com mais de 500 exemplares por 1.000 habitantes. Naquela época, o Brasil não chegava a 55 por 1.000. Mas eu sonhava que, um dia, chegaríamos próximo dos povos que mais leriam jornais. Quebrei a cara – confessa Ethevaldo.

Em 1969, recém-chegado ao “Estadão”, ele teve a oportunidade de visitar pela primeira vez o New York Times, ainda empolgado pelo depoimento de Saul Galvão, saudoso colega seu, que acabava de retornar de um estágio naquele jornal americano, então um dos mais influentes e bem feitos do mundo. Ethevaldo voltou outras vezes ao “Times”, a última delas em 2001, poucos dias após o ataque terrorista contra as torres gêmeas do World Trade Center. “Testemunhei, da forma mais convincente e dramática, a diferença abissal entre a cobertura daquele evento dramático, feita pela televisão, ao vivo, com audiência global de mais de dois bilhões de espectadores, em comparação com a cobertura feita pelo restante da mídia e, em especial, a dos jornais e revistas. Nunca esquecerei, também, minha experiência pessoal naquele 11 de setembro, em que permaneci quase 12 horas seguidas, hipnotizado, diante da tela de minha televisão e de meu computador. Ao final do dia, me convenci, definitivamente, de que o velho jornal de papel, que amamos tanto, começava a agonizar”, observa.

Siqueira lembra que em 2001 a internet ainda não era o fenômeno avassalador de nossos dias e que a comunicação móvel não cobria mais do que 15% da população mundial contra os 90% de hoje. O mundo não dispunha, também, de smartphones, nem de tablets, nem de banda larga. Na sua última visita ao New York Times, lembra ter visto na redação do jornal, afixado num quadro de avisos, um gráfico que mostrava a queda contínua da circulação dos jornais em todo o mundo nos 20 anos anteriores. No alto do gráfico, o título sem rodeios era quase um epitáfio: “O jornal impresso está morrendo”. No dia seguinte, alguém, mais otimista, adicionava ao gráfico outra frase, verdadeira, mas otimista, ainda válida em nossos dias: “O jornalismo, entretanto, está mais vivo do que nunca”.

Durante uma semana, em Nova York, naquele distante 2001, Ethevaldo participou de dois debates sobre a morte do jornal impresso. “De lá para cá, sem me considerar dono da verdade, tenho escrito e refletido muito sobre o fim do jornal impresso. Acho que ele, em pouco mais de cinco anos, estará reduzido a apenas um nicho, na melhor das hipóteses. Terá o mesmo destino das revistas especializadas”, profetiza Siqueira, salientando que as novas gerações, aí incluídos seus filhos e netos, não leem jornal. Ignoram-no como meio de informação. “Porque, entre outras razões, têm outros meios ou veículos que lhes parecem muito mais atraentes”. No epitáfio que faz do jornal impresso, Ethevaldo diz que esse veículo não tem como competir com a velocidade da circulação de notícias nos novos meios eletrônicos nem com o modelo industrial baseado na internet de alta velocidade, nos motores de busca que organizam milhões de gigabytes de dados e informações por segundo e os tornam disponíveis em qualquer dispositivo.

Ethevaldo, nas considerações finais a respeito, vaticina que em cinco ou dez anos teremos uma espécie de jornal mundial online, que poderá chamar-se Wikinews, em mais de 200 idiomas. “Algumas pessoas teimam em achar que as empresas jornalísticas tradicionais atuam de forma perversa ao dispensar a maioria de seus jornalistas. É uma visão infantil do capitalismo e dos passaralhos que se multiplicam. Grandes veículos impressos do passado desapareceram no mundo e no Brasil”. O que ele propõe, então? Que se busque um novo modelo econômico que viabilize o jornalismo multimídia das próximas décadas, sem esquecer a formação dos novos profissionais da comunicação do século 21, sua criatividade, bem como o empreendedorismo desses comunicadores. Aos velhos jornalistas, insiste, cabe parar de chorar.