Secretários ‘marajás’

Rubens Nóbrega

Recebi semana passada denúncia segunda a qual pelo menos quatro secretários do governador Ricardo Coutinho e um do prefeito Luciano Cartaxo, de João Pessoa, estariam acumulando salários que somados ultrapassam o teto da remuneração no serviço público.

Segundo a Constituição (Art. 37, inciso XI), no serviço público federal ninguém pode ganhar mais do que ministro do Supremo Tribunal Federal (STF); no estadual, ninguém pode ganhar mais do que o governador e, no municipal, ninguém pode ganhar mais do que o prefeito. Na Paraíba, contudo, tem secretário de Estado ganhando mais do que governador e secretário de Prefeitura ganhando mais do que prefeito. Se isso estivesse acontecendo lá pelo final dos anos 80, tais servidores ganhariam nas manchetes e nas melhores colunas de viés collorido o epíteto de ‘marajás’.

Devo esclarecer, antes de prosseguir, que não vou dar nome aos bois. Esse é um ponto da Lei de Acesso à Informação do qual discordo. Considero temerário expor publicamente pessoas de ganhos avultados, mesmo públicos. Não consigo fazê-lo, sabendo que vivemos sob índices de violência que nos aproximam de uma guerra civil. O máximo que posso dizer – ou dar pistas – é que no plano estadual, além dos secretários, temos um dirigente de concorrida autarquia emplacando todo mês bem mais que os R$ 23 mil percebidos pelo governador Ricardo Coutinho a título de subsídio.

Entre os supersecretários, quer dizer, entre os supersalários do primeiro escalão, um deles ganha, com segurança, R$ 44.185,62. Outro fora do controle do teto recebe R$ 37.984,00 mensais. E um terceiro planeja continuar ganhando R$ 25.630,04 por mês. Já o supersecretário municipal de Luciano Cartaxo, prefeito que deve estar orçado em R$ 19 mil por mês, faz uma receita mensal de R$ 30.753,56.

O que diz a Constituição
Para que não haja dúvidas de que os secretários denunciados furam mesmo o teto salarial do serviço público, reproduzo agora o texto do inciso XI do art. 37 da Constituição da República, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003:

XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;

Um secretário confirmou
Encaminhei a denúncia a um dos secretários de Estado e ele respondeu confirmando que os dados em poder do colunista correspondem ao que ele ganha mensalmente. Trata-se, em resumo, de acumulação de vencimentos. Ele recebe pelo exercício da função que ocupa no governo e também pelo cargo público efetivo ao qual ascendeu, em Poder distinto do Executivo, mediante aprovação em concurso público de provas e títulos. Em sua defesa, expõe entendimentos divergentes que afastam a ilicitude de tal acumulação. Trarei amanhã as explicações do secretário, mas sem expor a sua identidade.

 

O meu respeito por Júlio
Se ele estivesse por aqui, fisicamente, seguramente teria participado do lançamento do meu livro ‘Histórias da Gente’, ontem à noite no auditório da OAB-PB, no Centro da Capital. Havia respeito mútuo em nossa relação, apesar das divergências de ordem ligeiramente política.
Razão do ‘ligeiramente’: ao contrário do que meus textos e posições sugerem vez em quando, não sou militante do partido do qual ele era expoente. Mas sempre admirei e respeitei o PT, sobretudo o velho PT de guerra, do qual Júlio Rafael por vezes dissentia para defender ou apoiar alianças com forças que passam longe do ideário petista. Mas o fazia, quero acreditar, julgando ser aquilo o melhor para o seu partido.
Nas conversas que tivemos sobre rumos e caminhos do PT na Paraíba, todavia, a inteligência ou mesmo a fina ironia de Júlio Rafael jamais permitiu que a franqueza e a força das opiniões discrepantes, quando expostas, dessem lugar a ressentimentos ou distanciamentos que vetassem o retorno ao tema quando pintasse a chance do próximo diálogo. Que sempre pintava e era quase sempre enriquecedor ou, no mínimo, instigante. Justamente porque tinha ele como principal interlocutor.