Três especialistas em administração e políticas públicas – André Luís Nogueira da Silva, Elaine Cristina Lício e Vicente Carlos y Plá Trevas assinaram análise no UOL destacando a valiosa contribuição que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ofereceu para reabilitação da democracia brasileira ao instituir, no final de outubro, o Conselho da Federação, “nova institucionalidade que reafirma e aperfeiçoa o pacto federativo formatado na Constituição de 1988”. Lembram que o Conselho é um órgão permanente de negociação e pactuação entre União, Estados e municípios, tendo o potencial de fortalecer as instituições democráticas e institucionalizar a cooperação federativa como norteadora do desenvolvimento da nação. Nogueira, Elaine e Vicente afirmam que os constituintes foram precisos ao destacar, já no primeiro artigo da Constituição, que a República Federativa do Brasil compõe-se da união indissolúvel dos Estados, municípios e do Distrito Federal.
– A autonomia política dos entes federados foi definida no texto constitucional, que também estipulou suas responsabilidades na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, na erradicação da pobreza e da marginalização e na redução das desigualdades sociais e regionais. Um amplo conjunto destas responsabilidades são comuns aos diversos níveis de governo, caso do cuidado com a saúde e assistência social e a garantia do acesso à cultura, à educação e à ciência. Ao propor esse desenho institucional, os constituintes indicavam a cooperação federativa como principal estratégia para efetivação do rol de direitos sociais previstos em seu texto. A criação do Conselho da Federação reafirma o compromisso dos entes com o aperfeiçoamento do pacto constitucional, prerrogativa a ser perseguida pelo chefe de Estado Brasileiro – ressaltam os especialistas, descrevendo que, infelizmente, essa cooperação não foi a lógica imperante nos últimos anos, dado o boicote do governo de Jair Bolsonaro a Estados e municípios desde o primeiro momento em que subiu a rampa do Planalto.
Os analistas acrescentam que não custa lembrar a edição do Decreto 9.759, de abril de 2019, extinguindo dezenas de conselhos e comitês participativos, criados para promover a participação da sociedade e das representações de Estados e municípios nas decisões sobre políticas públicas nos mais diversos setores. “Além de afastar-se do diálogo com a sociedade e com Estados e municípios, o que vimos do governo anterior foi a adoção da lógica do conflito como modus operandi das relações intergovernamentais. Tal dinâmica conflituosa resultou no aprofundamento das desigualdades em nosso país, evidenciada pela desconfiguração das políticas de transferência de renda, pela interrupção do financiamento da Assistência Social, pelo boicote ao Programa Nacional de Imunização, por medidas que reduziram a arrecadação de ICMS, dentre vários e vários programas nacionais que foram interrompidos ou desestruturados (…) Chegamos ao absurdo de o governo federal questionar no Supremo a competência de Estados e municípios em promover ações para combater a pandemia de covid-19. Num momento em que a cooperação federativa era mais urgente, o governo anterior optou por se eximir e deixar a população brasileira à própria sorte.
“Em suma – prosseguem – abandonou sua responsabilidade de cooperação federativa e de coordenação nacional. Não tivéssemos uma República Federativa e a liderança de governadores e prefeitos, talvez os efeitos da pandemia tivessem sido ainda mais catastróficos”. André Luís Nogueira, Elaine Cristina e Vicente Carlos afirmam que o desmonte de políticas nacionais, comprovado por estudos e sentido, desde o início, por Estados e municípios e, principalmente, pela população mais carente, veio acompanhado de um discurso de responsabilização de governadores e prefeitos. Para eles, o Conselho da Federação tem o desafio de pactuar uma agenda de reconstrução e de enfrentar os mais urgentes e estruturais problemas da sociedade brasileira. O primeiro desafio é restabelecer um ambiente de confiança para o diálogo – para tanto, é preciso partir da premissa de que o Estado brasileiro possui centralidade na condução da retomada do crescimento econômico, na promoção do desenvolvimento econômico social e sustentável e na redução de desigualdades sociais e regionais, sendo fundamental pactuar agendas de curto, médio e longo prazos, conjugando esforços factíveis e capazes de traduzir a cooperação federativa em melhorias na vida da população, sobretudo as camadas mais carentes.
Os especialistas finalizam afirmando: “Ter uma visão compartilhada das nossas macrorregiões, conhecer seus problemas e oportunidades, comungar de uma visão e uma agenda de temas prioritários para a Federação, são construções com potencial de transformar a cultura federativa brasileira. O Conselho da Federação é, portanto, uma aposta estratégica. Nesta direção, algumas agendas emergem como estruturais para o aperfeiçoamento dentro do pacto federativo, uma das quais diz respeito à insuficiência na oferta e na qualidade dos serviços públicos, resultante de déficits de capacidades do Estado brasileiro (…) O desenvolvimento econômico sustentável e os efeitos da mudança climática também precisam estar no radar do Conselho da Federação, tendo em vista sua relação direta com a melhoria das condições de vida da população. O Conselho da Federação é um instrumento criado para o estabelecimento de compromissos políticos por parte das lideranças e representantes dos poderes executivos da federação, compromissos que sejam capazes de enfrentar problemas estruturais de nosso país. Sua legitimidade e efetividade dependem da nossa capacidade de diálogo e, principalmente, de nos enxergarmos enquanto nação”.
Fonte: Os guedes
Créditos: Polêmica Paraíba