PARAHYBA DO NORTE E SUAS HISTÓRIAS. O Caldo de Cana Querubim na vida pessoense - Por Sérgio Botêlho

Aproveito o domingo para iluminar um pequeno, mas muito significativo e histórico empreendimento da cidade de João Pessoa: o Querubim. Servindo caldo de cana ali na descida para o comércio (na avenida Guedes Pereira), na calçada do lado norte, logo depois do destoante edifício Régis, o Querubim está há quase 80 anos. A lanchonete foi criada em 1946, incorporando-se à vida diária e à paisagem local da capital paraibana. Isso não é comum em negócios brasileiros. Em Lisboa encontrei ginjas, cervejarias e chapelarias até dos anos 1700, passadas de uma geração de proprietários à outra, até hoje. Algo muito comum à toda a Europa. Contudo, encontrar um serviço de 1946 ainda funcionando, e no mesmo espaço, no Brasil não é muito comum. O caldo de cana com pastel, com bolinhos, com pão doce, entre outras combinações, sempre fez o sucesso do Querubim, não apenas matando fomes da hora, mas também carências alimentares de um dia inteiro. Para alguns jovens pobres hospedados na Casa do Estudante, ali perto, por exemplo, o caldo de cana com pastel ou com pão doce, principalmente, chegou em não poucas oportunidades a significar café da manhã, almoço e jantar. Dessa forma, o Querubim restou definitivamente aprisionado às memórias do passado de cada um deles. Mesmo que de forma amarga, mas parte inseparável da argamassa com a qual construíram suas vidas. Além dos estudantes, em dias úteis houve tempo nos quais dezenas de pessoas costumavam se acotovelar junto ao balcão do Querubim, ao descerem ou subirem o caminho entre o Ponto de Cem Réis e a cidade baixa da nossa querida João Pessoa. Ao fundo, na parte interna, junto à moenda do indefectível caldo de cana, uma velha escada de ferro, bela e marcante, constituindo uma paisagem bucólica e única, palco de tantas vidas que ali trabalharam ou se deliciaram com os seus lanches. Ao lado de construções históricas centenárias da Parahyba do Norte, o bar Querubim compõe uma memória coletiva pessoense, porventura às vezes esquecido, mas tornando-se bastante uma relembrada para que sua existência e significado aflorem do consciente individual. É uma bênção que o centro de João Pessoa esteja tombado como patrimônio histórico, incluindo o prédio que abriga o Querubim. Isso previne a repetição de episódios lamentáveis em que antigas edificações foram derrubadas para dar lugar a novas, sem qualquer conexão ou respeito à história arquitetônica da cidade.