Um edifício político que pede bom tratamento


fotoO Globo

O presidente da Câmara, Henrique Alves, quer encontrar-se com o ministro Gilmar Mendes, do STF, levando pelo braço o presidente do Senado, Renan Calheiros, para afastar os miasmas de uma hipotética crise institucional que, por toda a semana, andou nas páginas dos jornais.

É bom que haja conversa, e sobretudo lucidez, porque nenhum país merece estar ao sabor de crises institucionais.

Nesse terreno, temos mais sorte que alguns vizinhos de continente, embarcados precariamente na Arca de Noé inventada pelo falecido coronel Chávez.

Também nós pagamos, é certo, um preço alto por sermos democracia recente, ou episódica. O regime de 64 durou um tempo enorme, e a saída foi “lenta e gradual”. Se foi “irreversível”, depende de nós.

Construções políticas não caem do céu — sobretudo a joia da coroa que é o sistema democrático. Há que lutar por isso, fechar os ouvidos a tentações autoritárias ou populistas, que nunca dão o que prometem.

A esta altura, já são 28 anos de democracia no Brasil; e os resultados compensam o esforço. Nestes 28 anos, o país conseguiu (a que custo) debelar uma inflação que corroía a economia popular, e passar a uma sucessão de governos eleitos, que, cada um deles, trouxe a sua contribuição para o desenvolvimento econômico e político da sociedade brasileira.

Mas essas construções, como toda casa ampla, precisam sempre de reformas, e de vigilância para que o teto não venha abaixo.

Quase veio, no primeiro governo Lula, com a flor dos pântanos que foi o “mensalão”. Era uma tentativa inédita de cooptar o Congresso através de benesses distribuídas pelo Executivo. As entranhas desse mecanismo foram desvendadas num processo que se estendeu por sete anos, e que chegou ao fim com um julgamento memorável.

O Judiciário brasileiro — sobretudo a sua cúpula — afirmou-se como organismo digno de todo o respeito, e estabeleceu novos padrões na aplicação da Justiça.

Movimentos sísmicos desse tipo não acontecem sem deixar marcas. Se a opinião pública pôde acompanhar, nos menores detalhes, o julgamento, e deu o seu aval ao que então aconteceu, isso não podia deixar de desagradar a um setor do espectro político — todos os que, inicialmente repletos de poder, viram suas carreiras interrompidas pela afirmação plenária da Justiça.

É neste contexto que se podem entender os últimos acontecimentos. Há muita mágoa na atmosfera. Há o desejo de revanche dos que se sentem prejudicados.

Também há excesso de confiança nos setores governistas; e o desgaste que vem de dez anos de exercício do poder.

Faz parte do jogo; mas as instituições precisam ser preservadas.