Ainda é possível ser lúcido no PT

Gilvan Freire

Depois de ter sido o melhor partido brasileiro, criado por trabalhadores, acadêmicos e intelectuais para sustentar o confronto entre o trabalho e o capital e vigiar as elites em seus conluios com as classes dominantes e o poder público, que sempre colocaram os governos a serviços de seus privilégios, em detrimento da pobreza reinante ao longo dos séculos de dominação, o PT só teve direito a contradições quando saboreou também o poder de mando. É a velha história dos revolucionários da esquerda que, quando derrubam as ditaduras e põem abaixo os regimes de opressão, instalam em seu lugar outro despotismo, não raro das vezes de maior longevidade e agressividade, embora sob o rótulo de ‘democracia popular’.

Não se pode dizer que no Brasil de Lula, o líder trabalhista que o PT educou para implantar no país uma república sindical, no melhor modelo de todas as que já faliram na era pós-moderna, a ditadura de direita tenha sido substituída por uma de esquerda, até porque, quando Lula se elegeu, o Brasil já havia restabelecido o regime democrático, e as melhores políticas públicas contemporâneas de Lula – os programas de renda mínima – já estavam iniciados por outros governos originários da centro-esquerda, como o vendedor do patrimônio da Nação, Fernando Henrique Cardoso, que engordou também em sua gestão o capitalismo selvagem de São Paulo e da aldeia global.

A DITADURA PETISTA, especialmente após o período de Lula, que não aceitou ilhar o país na desastrosa experiência cubana de Fidel Castro, um dos caudilhos mais anacrônicos do planeta que escolheu sozinho um modelo de domínio sobre os pobres de seu país sem elevá-los acima da linha da pobreza, é igualmente grave, sem ser menos atrasada, e tem parentes próximos nesses modelos fugazes, aparecidos nos últimos anos na América Latina, cujo maior expoente e maior desastre é o chavismo na Venezuela (que felizmente está moribundo na republiqueta bolivariana, menos de um mês depois da morte de Chaves, a figura messiânica que desencarna a tempo de salvar a Nação).

O modelo petista de poder, conquanto não resvale para a linha caudilhesca de Chaves ou Fidel e seus pupilos latinos, tem o mesmo sentido dominador: o continuísmo de governo, o culto à personalidade, a partidarização da administração pública, o uso das empresas estatais, a manobra das massas de pobreza e o clientelismo assistencialista de fins eleitorais, em desfavor do crescimento econômico, da melhoria da educação, da saúde e da segurança da população. Com esse formato de governo o PT, assim como Chaves, bota os pés na sepultura.

MAS, O OBJETIVO DESSAS OBSERVAÇÕES É DIZER que, apesar do PT, ainda é possível encontrar alguns petistas lúcidos e um ou outro procurando escapar da infestação mental. O deputado Anísio Maia, entendendo melhor do que seus pares a realidade nordestina de penúria e discriminação, e de abandono por parte do governo petista-chavista de Dilma, a presidenta (com ‘a’ de ausente e apática), tem soltado os cachorros em cima das pirotecnias governamentais que, ou trazem esmolas em forma de bolsa-miséria, ou trazem promessas enganosas para o povo do Nordeste, nesse quadro de seca – só não mais perversa que os políticos omissos.

Já se vem dizendo desde o ano passado que essa seca vai tirar vidas humanas e dizimar as criações, além de criar um quadro diferente de migração e desertificação sem volta. Os políticos não se tocam muito, mas certamente pode sobrar pra eles, os imitadores e aduladores de Dilma. Vamos aguardar.

Por enquanto, ressalvada a caravana da Assembleia, que levantou dados e encaminhou aos governos, só Anísio grita com os pulmões de fora. E os outros petistas ainda acham que o doido é ele. Pode?