A estudante de Direito Maria Fernanda Braga Oliveira, de de 21 anos, entrou para a estatística como mais uma vítima de um crime comum em São Paulo: o roubo de celulares. Ela estava indo para seu primeiro dia em um novo emprego quando foi surpreendida na Avenida Bandeirantes, Zona Sul de São Paulo. O vidro de seu carro foi quebrado e o aparelho levado.
Para além das perdas materiais, o criminoso ainda a surpreendeu com outro crime: tentou extorquir sua família, publicou nudes que ela tinha trocado com o namorado em todas as suas redes sociais e ainda fez um empréstimo em um banco digital. O crime aconteceu em novembro do ano passado mas virou assunto recentemente após Maria Fernanda relembrar a história em seu perfil do TikTok – vídeo já passou das 2 milhões de visualizações.
“Vídeos e fotos ainda circulam”
No trabalho, o chefe a orientou a voltar para casa. Do momento do assalto até quando voltou para sua cidade, São Bernardo do Campo, passou cerca de duas horas. Tempo suficiente para um estrago bem maior que a perda do celular e dano ao carro acontecer. “Meu ex estava pálido quando cheguei. Me falou que o ladrão tinha mandado mensagem para ele e para minha mãe pedindo 150 mil reais para não vazar os nudes que encontrou em meu celular”, conta.
Como não foi pago, ele postou vídeos e fotos no Instagram, Facebook e no status do WhatsApp. Além de mandar o conteúdo em mensagem privada para várias pessoas.
Não bastasse, ainda deu tempo do criminoso fazer um empréstimo em seu nome. “Ele pegou 10 mil reais em um banco digital e fez transferências com o valor que estava na conta para nomes que eu não conheço. Procurei no Jusbrasil e vi que os nomes têm diversos processos atrelados a eles”, diz Maria Fernanda.
Por causa do ocorrido, e do pedido de ajuda de amigos e pessoas próximas para ajudar a derrubar as suas redes sociais, onde os conteúdos estavam sendo divulgados, Maria Fernanda também virou foco de ataques em sua universidade. “Esses vídeos e fotos circulam e já foram usados contra mim várias vezes, para me desmoralizar dentro da faculdade”, relata.
Mesmo assim, Maria Fernanda tenta seguir em frente. “Vivo minha vida normalmente e lido com esse assunto da melhor maneira possível sempre que ele volta a acontecer. Humor é meu mecanismo de defesa, mas claro que machuca”, diz a jovem.
Problemas com a polícia
Hoje ex-namorado da Maria Fernanda, o bacharel em direito Vitor Vedoveli, de 26 anos, conta como foi a saga para conseguir atendimento da polícia e o registro de BO – algo que eles não conseguiram realizar até hoje. “Foi muito complicado. Eu entrei em contato com a Delegacia de Crimes Cibernéticos antes mesmo de a Maria Fernanda chegar em casa. Me disseram, por telefone, que não poderiam fazer nada. Que eu deveria procurar a DP mais próxima a casa dela para a realização do BO. No final do dia, fomos à delegacia e lá nos orientaram a registrar o BO no DP mais próximo de onde aconteceu o crime”, conta Vitor. Isso, segundo ele, os deixou de mãos atadas, pois precisavam do BO para dar sequência à resolução de outros problemas.
“A polícia civil, responsável por esse tipo de situação, não prestou apoio. A polícia militar nos jogava de um lado para o outro. Uns dias após o ocorrido, tentamos ir novamente ao departamento de polícia mais próximo a casa dela. O delegado de plantão disse que não era nenhum caso de urgência e que, se quiséssemos esperar, nos atenderia em cerca de cinco ou seis horas. Ficamos sem nenhum apoio das autoridades”, completa Vitor. O BO digital foi indeferido e a pessoa que fazia atendimento na delegacia não sabia dizer o motivo.
“Eu me senti completamente abandonada pelo poder público. Minha mãe, que ficou muito chateada com todo o ocorrido, me falou que eu não era a Carolina Dieckmann e que minha história não era vista como algo importante. Era só mais um número para a polícia”, diz Maria Fernanda.
Procurada pelo Universa, a Secretaria de Segurança do Estado de São Paulo não se manifestou sobre o caso.
Respaldo da Justiça
Segundo a advogada criminalista Amanda Bessoni Boudoux Salgado, não é necessário um BO para que você possa, por exemplo, pedir ressarcimento do gasto do banco, mas ele serve como uma prova de crime e deveria ser emitido em qualquer atendimento policial procurado.
“A situação é complicada, porque normalmente o registro deve ser feito em qualquer delegacia, a não ser que estejamos falando de uma especializada. Não entendo o motivo de não ter sido feito”, diz. A primeira orientação para vítimas de crimes como o que aconteceu com a Maria Fernanda é, justamente, procurar a polícia. “Há também a possibilidade de procurar o Ministério Público e solicitar a abertura de um inquérito policial”, completa.
Maria Fernanda foi vítima de crime de roubo, extorsão, constrangimento mediante a ameaça e divulgação da cena de nudez sem consentimento da vítima. “Teríamos que analisar todos os fatos e provas existentes para explicar os crimes, mas a partir do relato genérico parece que temos esses”, diz Amanda. Apesar de não ser necessário um advogado para ajudar na denúncia de um crime, em um caso traumático como esse, pode trazer tranquilidade para a vítima. “O profissional teria condições de orientá-la e buscar ajuda, pois o advogado já conhece o atendimento e instrumentos para a comunicação de um delito”, completa.
Fonte: UOL
Créditos: UOL